Midian é tudo, menos mid. É top. Pop. Over the top. Quando ri, mostra os dentes como quem vai arrancar um pedaço da tristeza. Quando chora, faz do sertão um mar de lágrimas. É o próprio baioque do Chico.
A música cristã, profundamente marcada pelo uso litúrgico, esvazia o eu-lírico com frequência. Até certo ponto, isso é bom. Canções pensadas para uma comunidade não podem carregar uma voz específica demais. Mas há sempre o risco de celebrarmos “Deus sem nós”, nas palavras de Milton Schwantes.
A carreira da Midian Nascimento toma o outro rumo. Em suas músicas, há a afirmação do artista diante de Deus: sua identidade, suas alegrias, seus conflitos, suas angústias, suas fraquezas, sua raiva e seu arrependimento. E tudo isso começa na estética, na decisão de cantar do seu jeito.
Em “Há de Verso”, esse comportamento reaparece amadurecido e mais convicto.
“Eu canto aquilo que acredito.
Não nego nem tremo
Se o galo cantar”
Os anos que se passaram desde o debut “Barulho” não foram um mar de rosas. O sucesso de Midian e do Coletivo Candiero veio acompanhado de polêmicas e pressões.
O tribunal da internet sentenciou suas diversas condenações. “Celular vira martelo de juiz”. Mas foi um tempo de aprendizado em que, no final, a artista diante de Deus encontra toda a justificação de que precisa. Afinal, “meu pai ungiu essa dança” e “desde sempre ele quis que fosse assim”.
Em todo esse contexto, não há nada mais evangelístico do que afirmar “ser tão teu é bom”. A graça que acolhe quem não encontra “alguém pra falar” dá sentido a quem procura ouvidos para dividir a vida.
“…tudo que aprendi, onde andei
Só vai fazer sentido se aqui
Eu puder dividir com vocês.”
“Há de Verso” aponta um caminho para a autenticidade artística no cenário cristão. Mais que um mercado fonográfico, o cristianismo oferece um significado profundo para a arte. É um convite à sinceridade visceral de quem já se sabe perdoado.