por SHARON HODDE MILLER
Como podemos evangelizar com integridade? Como meu marido e eu lideramos nossa igreja juntos, esta é uma pergunta com a qual lutamos muito. Ou seja, em nosso entusiasmo para ver as pessoas vindo a conhecer Cristo, como resistimos à tentação de um ministério focado em resultados? Como podemos comunicar a urgência do evangelho sem manipular as emoções ou os medos dos outros? Como podemos apresentar o evangelho de uma maneira que esteja convidando sem truncar a mensagem para torná-la mais agradável?
Enquanto processávamos essas perguntas e tentações em relação ao evangelismo, nos encontramos corrigidos e encorajados pela Parábola do Semeador (Mateus 13). Nesta história famosa, Jesus usa uma analogia familiar ao seu público palestino. Segundo o estudioso bíblico William Barclay, os agricultores da época semeavam suas sementes de uma das duas maneiras: ou lançando as sementes manualmente ou amarrando um saco de sementes nas costas de um burro, fazendo um buraco no saco e deixando as sementes caírem enquanto o animal atravessava o campo.
Nos dois cenários, as sementes estariam vulneráveis a variáveis tais como vento ou terreno rochoso, mas por causa dessas duas práticas diferentes, a identidade do “semeador” nesta parábola não está clara. Talvez sejamos o semeador humano, ou talvez sejamos o burro do semeador, mas é “Deus que efetua o crescimento (1 Coríntios 3:7). Deste modo, a parábola é simbólica de três “atores” que estão presentes no compartilhamento do evangelho – você, os ouvintes e Deus – e até que entendamos esses papéis corretamente, o trabalho de evangelismo será muito mais difícil e mais penoso do que Deus intencionou.
O Seu Papel
Em Mateus 13, o semeador saiu a semear (v. 3), e ele semeia em todos os tipos de solo. O que é estranho sobre este semeador, entretanto, é que ele semeia aleatoriamente. Ele semeia em solos ruins e bons. Há uma imprudência no semeador. Ele não faz uma pausa para considerar se a semente pode criar raízes, ele simplesmente dá a todos os solos a oportunidade, e Jesus explica que nossa tarefa é a mesma. Não é nosso papel julgar a qualidade do solo, mas simplesmente lançar a semente.
Por outro lado, a “imprudência” do semeador não seve ser confundida com descuido, falta de consideração ou preguiça. Além de semear, um bom agricultor também cultiva seu solo aliviando-o e fertilizando-o. A Parábola do Semeador não descreve este trabalho, mas toda a Escritura está cheia de instruções para cultivar o solo da nossa cultura. Quando os cristãos são exortados a “ser sábios no procedimento para com os de fora” (Colossenses 4:5), “viver entre os pagãos de maneira exemplar” (1 Pedro 2:12), “erguer a voz e julgar com justiça; defender os direitos dos pobres e dos necessitados” (Provérbios 31:9), ser conhecidos pelo seu amor (João 13:35) e “tornar-se tudo para com todos” (1 Coríntios 9:22), essas ações têm um jeito de aliviar e preparar o solo a nossa volta.
Grande parte do ministério de Jesus foi trabalho de solo. Ele interveio em favor da mulher pega em adultério antes de exortá-la a não pecar mais (João 8). Ele se aproximou da mulher no poço, uma exilada social, antes de enviá-la para evangelizar sua cidade (João 4). E ele dignificou a mulher pecadora, convidando-a a ungir seus pés e libertando-a perdoada (Lucas 7). Ao amar as pessoas, curar as pessoas, ouvir as pessoas e falar de uma maneira que elas pudessem entender, ele preparou o caminho para a semente cair em terra fértil. Para aqueles de nós propensos a culpar o mundo por sua incapacidade de escutar, esta perspectiva é um corretivo útil.
O Papel do Ouvinte
Para os outros de nós, colocamos responsabilidade demais em nós mesmos para mudar corações. Quer façamos por orgulho ou por falta de confiança em Deus, esta parábola é um corretivo para nós também. Em seu comentário sobre Mateus, R. T. Frances escreve, “A descrição dos quatro tipos [de solo] foca, tão certo quanto a parábola pretende, em sua receptividade variável ao que eles ouvem. Todos ouvem a mesma palavra”.
Jesus descreve três tipos de solo onde até mesmo a melhor semente lutará para crescer: à beira do caminho (Mateus 13:4), no terreno pedregoso (v. 5) e entre espinhos (v. 7). O caminho, Barclay explica, seria duro como calçada, abafado pelo tráfego de pedestres e representa aqueles indivíduos de coração duro e de mente fechada que não podem receber a Palavra devido ao seu preconceito, espírito intocável, caráter imoral ou ferida do passado.
O terreno pedregoso representa uma fé superficial, marcada por ir atrás da última tendência ao invés de cultivar algo que dure. O teólogo Stanley Hauerwas descreve este tipo de cristão como alguém que está “muito pronto a seguir Jesus”, significando que eles “falham em entender que [eles] não entendem que tipo de Messias ele é”. Eles não consideram o custo e, por causa disto, sua fé é facilmente distraída ou destruída.
No caso do terreno espinhoso, o solo é bom, mas “já está ocupado” com o que France chama de “cuidados e prazeres”. Quer seja a tentação da facilidade ou da ocupação pelo excesso de comprometimento, essa semente falha em crescer e prosperar porque é simplesmente suplantada.
Finalmente, Jesus descreve o único solo bom propício ao crescimento duradouro. É o coração e a mente aberta para Deus, pronta a ouvir, ansiosa para entender e disposta a considerar o custo.
Nesta parábola, encontramos quatro tipos diferentes de solo representando mil histórias e circunstâncias diferentes. Em qualquer momento, em qualquer igreja, retiro de mulheres, livraria ou cafeteria, os ouvintes estão vindo com seus diferentes estados de solo. Muitos nem são o que parecem. Alguns serão ainda mais reservados do que prontos a ouvir, enquanto outros parecem curiosos, mas na verdade, não podem ser convencidos.
Estas condições dos solos são muitas para qualquer pessoa prever ou imaginar, e é por isso que Jesus nos dá uma tarefa com um fardo mais leve: simplesmente lançar a semente. Nós não temos que antecipar toda objeção possível. Na verdade, esta parábola promete que algumas das nossas sementes não criarão raízes e é esperado que as lancemos de qualquer maneira. Nós não temos que dobrar, torcer ou executar todo tipo de trabalho interpretativo acrobático para persuadir o não persuadível. Este trabalho é de Deus.
O Papel do Espírito
Grande parte da horticultura está fora do controle humano. Não podemos controlar os elementos. Não podemos controlar o vento, a seca, as inundações ou as pragas. Semear a Palavra de Deus é parecido – há muito que não podemos controlar. Em 1 Coríntios 3:6, o apóstolo Paulo faz uma importante observação sobre o trabalho de semear. Ele afirma o valor do evangelismo e ele lança sementes obstinadamente, mas ele também escreve, “Eu plantei, Apolo regou, mas Deus é quem fez crescer”.
Quando se trata de evangelismo, nosso papel importa – mas nosso papel também é limitado, e esta verdade pode nos aliviar. Sempre que sentirmos a pressão de convencer as pessoas ou nos sentirmos tentados a tornar nosso evangelho “agradável”, é sábio lembrar que a salvação é trabalho do Espírito. O Espírito pode pegar nossas palavras e torná-las exatamente no formato certo para o coração do outro. O Espírito pode traduzir nossa mensagem sobre uma situação em uma infinidade de diferentes cenários da vida.
Se alguém for quebrar o solo duro do coração de uma pessoa, será o Espírito de Deus. Se alguém for desobstruir as pedras e os espinhos, será o Espírito de Deus. Nós podemos lançar a semente, mas é o Espírito que faz todo o trabalho pesado. Nós não devemos mudar a mensagem para o benefício dos ouvintes, ao invés disso, confiamos no Espírito para mudá-los.
O Evangelismo é uma Coisa Certa
O Evangelismo desafia nosso desejo por decisão. Muitas vezes queremos resultados para os quais podemos apontar – e o evangelismo fiel não pode nos prometer isso. A Parábola do Semeador nos encontra nessa ambiguidade, assim como faz o próprio Jesus. Nosso Salvador não só lança a semente das suas palavras, mas ele também lança a semente da sua vida.
Fico impressionada por algumas abordagens do evangelismo negligenciarem a semeadura das palavras, enquanto outras negligenciam a semeadura das nossas vidas, mas, como seguidores de Jesus, somos chamados a segui-lo em ambas. Semeamos falando toda a verdade com ousadia e entregando nossas vidas em amor. Nem um nem outro garante uma resposta nas vidas dos nossos ouvintes, mas garantem uma coisa: concedem ao maior número possível de pessoas um vislumbre do reino vindouro de Deus.
Sharon Hodde Miller é autora de Nice: Why We Love to Be Liked and How God Calls Us to More e de Free of Me (Baker Books). Ela tem doutorado no tópico de mulheres e vocação, e lidera a Igreja Bright City em Durham, Carolina do Norte, com seu marido, Ike.
Traduzido por Cynthia Rosa de Andrade Marques.
Usado com permissão.