“Meses antes de completar 18 anos, um jovem ganha o seu primeiro carro. O automóvel não tinha uma aparência tão boa, estava sujo, era mais baixo que os outros, mas o garoto ficou feliz. No fundo no fundo, o que ele desejava mesmo era ter uma Hilux, grandona, veloz, mas tudo bem… Pelo menos agora tinha um carro. Mas como ainda não sabia dirigir e nem tinha carteira, decidiu aprender por conta própria estacionar o carro na garagem e acabou se satisfazendo com o “tira e põe”. Com o passar do tempo, passou a observar melhor os carros e certo dia viu um modelo numa loja que lhe chamou bastante atenção, e então resolveu perguntar ao dono: “Moço, posso estacionar o carro? Sou bom nisso!” O cara deixou. Ele fez o trabalho por alguns dias e depois ficou pensando como seria bom poder colocar outros tipos de carros na garagem. Iniciou-se então em sua vida um processo de “tira e põe”. Testou vários modelos e buscou até um emprego de manobrista, mas logo acabou sendo mandando embora, pois recusava-se a manobrar carros que já tinha “experimentado”. Na verdade, ele ficava mesmo era excitadíssimo só de pensar num novo modelo! Com o passar do tempo, acabou batendo o carro de algumas pessoas, arrumou brigas, chegou até a levar um tiro por ter destruído um carro de grande valor… Ficou arrasado! Até que em um momento de sua vida um grande amigo lhe disse: “Ei cara, você precisa aprender a dirigir direito, precisa treinar no seu carro.” Então ele decidiu voltar para casa, olhar direito os documento do seu automóvel e descobriu que o “sujinho baixinho” era na verdade uma Ferrari. Leu mais sobre a marca, a potência, estudou, treinou, mas infelizmente não adiantou muita coisa, pois o tiro que levou afetou completamente o seu desempenho e potencial inicial.”
Esta foi apenas uma historinha inventada para introduzir o tema. As analogias são ótimas, pois despertam o entendimento e ajudam bastante no processo de autoconhecimento. Bem, antes de prosseguir, é necessário esclarecer alguns pontos. Neste artigo não trataremos de ninfomania ou satiríase, que são nomes dados ao desejo sexual hiperativo (DSH) em mulheres e homens, respectivamente.
Uma mulher que é acometida deste mal, por exemplo, é capaz de manter relações sexuais cinco vezes com homens diferentes por dia, mesmo sendo casada. Vive num mundo fora da realidade, mas ciente dos riscos que corre. Na grande maioria das vezes sabe que precisa de tratamento mas não o procura por medo de perder o prazer. Ninfomaníacas chegam ao clímax muitas vezes ao dia e ainda se masturbam para completar. É um vício, uma patologia sérissima. E isso, obviamente, acaba afetando também a questão do caráter, da moralidade e da vida espiritual, pois a pessoa se envolve numa vida surreal, oculta, de mentiras e que foge a realidade. É consumida por um desejo insaciável e igualmente agressivo. Mas não, não é disso que vamos falar hoje.
O sujeito alvo desse artigo não possui necessariamente o vício em sexo, mas sim na caça e na conquista. Seguindo a linha de raciocínio da moral e do caráter, um cristão, por exemplo, obtém a consciência de certo e errado por aquilo que aprende através da Bíblia e relacionamento com Deus, mas mesmo não sendo cristão existe uma ética na sociedade. Até um ateu tem consciência de que numa cultura monogâmica, ‘pegar’ a mulher alheia ou várias simultaneamente foge da ética e atropela os princípios morais. Ou seja, sendo cristão ou não, qualquer pessoa – excluindo os casos de psicose – tem a consciência de que isso é errado, e aqui já passamos para o assunto proposto no título.
O instinto animal, primitivo, existe em qualquer ser humano, é algo intrínseco a sua natureza, e esse fato somado a circunstâncias externas e também a alguns hormônios, pode ocasionar grandes estragos e muito sofrimento. Enfatizaremos nesse artigo o sexo masculino, onde a incidência de instinto de “predador” é mais evidente. Observe, por exemplo, um papo muito comum entre os homens (inclusive entre os comprometidos):
“Você já pegou a fulana?”, “Nossa, ela deve ser quente na cama…”, “Não, cara, aquela ali é difícil…” E então, naquele momento, surge um novo desafio, o desafio da caça e da conquista. O prazer, neste caso, não estaria necessariamente na pessoa em si, mas sim no desafio. É como gente que curte pescar mas não come o peixe. Pesca, tira a foto do peixão, sente o êxtase, mostra para os amigos e em seguida descarta a presa. Prazer no ato, no esporte.
Muitos caras, por exemplo, tem o prazer em tirar a virgindade. Este é o jogo deles. Já outros, em pegar mulheres casadas. Alguns, curtem o ato de instigar e seduzir, sentem prazer em saber que mulheres o desejam e admiram. O tipo de sadismo que vai para o lado mais doentio, encontra o prazer em matar o lar da pessoa, é como se ele se enxergasse um macho alfa competindo pela presa (a esposa) com outro macho alfa (o marido).
O que muitos ignoram e que é importante ressaltar, é que esta é também uma maneira de extravasar alguns traumas reprimidos e dores da alma, por isso, muitos – instintivamente e de forma inconsciente – ocupam a sua mente com algo que lhe traga um prazer constante e ininterrupto, como alguém que se utiliza da bebida para anestesiar suas dores. E então, transformam a sua vida sexual numa grande arena de disputa e conquista. O prazer pelo prazer. Existem homens, por exemplo, que não admitem sair com uma prostituta, pois neste caso a presa não seria fruto de uma caça. O que rola, na verdade, é um sentimento de frustração: “Sou tão ruim que preciso pagar para alguém sair comigo…”. Alguns nem chegam a ter uma ereção diante de uma mulher de programa. Um fato curioso.
A grande questão é que quando uma pessoa dominada por esse vício se casa ou assume um compromisso sério, o instinto de predador não cessa, pode ficar sob controle por algum tempo, mas ainda está lá, adormecido, e uma hora ou outra vem a tona. É aí que iniciam-se os problemas… Muitos possuem um anseio tão grande em “dirigir outras modelos de carro” que acabam passando por cima de vidas, sentimentos, fé, valores, moral e assumindo todo e qualquer tipo de risco.
Uma pessoa que se lançou em um modo de vida como este, moralmente irresponsável para com os outros e para com o seu próprio corpo, transmite uma mensagem clara: estacionou na fase de criança nessa área da vida, que é a fase onde não pensamos em riscos, mas apenas em satisfazer nossas vontades e prazeres. O ego permanece em evidência. E nesta fase, da infantilidade, também não temos noção de que esse tipo de prazer não é o melhor que poderíamos obter. Uma criança chora, faz birra e tenta de tudo para ganhar aquilo que quer, sem pensar nos prejuízos e consequências.
Para o indivíduo egóico, o ato de procurar novas mulheres e novos prazeres vem da ânsia da buscar a melhor transa e performance: “A próxima vai ser melhor, na próxima vou me sair melhor…”. Não existe aqui amor ou doação, na verdade é uma doação mínima comercial, “você me dá o seu prazer para que eu satisfaça o meu”. O indivíduo nunca sente-se saciado, é como uma criança que ganha presentes e brinquedos de seus pais com muita frequência. Ela deseja e sonha com o brinquedo, sente excitação quando chega, brinca intensamente por alguns dias, mas logo a excitação vai embora e o desejo pelo novo surge, torna-se algo patológico, doentio. Constroi-se um ser humano insaciável na área de testar novos brinquedos e seus olhos tornam-se devoradores. Por onde passam listam novas possibilidades.
E então, no decorrer da vida, quando o sujeito dominado pelo instinto predador encontra uma mulher que desperta um sentimento intenso e verdadeiro, terá grande dificuldade em criar vínculos afetivos e profundos, pois passou uma vida inteira treinando o seu cérebro para “o tira e põe” da garagem. O vício está instalado. Não, não estamos falando de uma situação irreversível, mas o trabalho de desconstrução será grande e exigirá muita força de vontade. Neste caso, o autoconhecimento é essencial, uma porta de entrada para o domínio do instinto. Todo bom lutador sabe que uma das grandes estratégias para vencer uma luta é estudar o inimigo, e é exatamente isso que estamos fazendo aqui hoje, estudando o terreno e o inimigo.
Sim, acredito em oração, acredito em milagres, tenho Deus como centro de minha vida e Jesus como referência de ser humano, mas acredito também que a grande maioria das transformações e processos de cura passam necessariamente pela informação, reconhecimento e desejo de mudança. Muitos homens e mulheres de oração estão dominados por seu instinto sexual. Oram, jejuam e traem. Jogam 100% da responsabilidade no diabo e não buscam saber o que acontece em seu corpo e sua mente. Outros tantos líderes pregam a santidade mas quando encontram-se cara a cara com o desejo, perdem o controle e acabam cedendo.
Uma pessoa que sofre de ansiedade, por exemplo, também passa pela experiência de ver o seu corpo fora de controle: palpitações, falta de ar, dor no peito, mãos suadas… Essa pessoa poderia classificar todos esses sintomas como espirituais (ataques malignos, por exemplo) ou tomar ciência de que todo ser humano que sofre de ansiedade apresenta um ou mais sintomas como esses e que um simples exercício de respiração poderia ajuda-lo a tomar as rédeas do seu corpo. Conhecendo de forma mais profunda o “inimigo”, a luta fica mais fácil. Entendo que Deus oferece sabedoria ao homem para descobrir suas próprias fraquezas e, juntamente com a comunhão e uma vida constante de oração, temos então uma arma poderosa!
Se o sujeito está muito feliz e satisfeito com seu instinto garanhão, esse artigo não lhe fará nem cócegas. No mínimo lhe arrancará algumas risadas. Mas para aquele que está interessado em encontrar um nível de maturidade sexual acima do proposto por seu instinto primitivo e abandonar o estilo de vida animalesco que propõe a sociedade, aqui está uma ótima oportunidade. E é nessa caminhada de aprendizado que tomamos ciência da imensa responsabilidade que temos sobre a vida das pessoas que cativamos, e então, passamos a descartar de nossas vidas a possibilidade de brincar com sentimentos e riscos em troca de prazer. É o tal do “amar ao outro como amamos a nós mesmos”. Infelizmente poucos homens chegam a esse nível de maturidade e aos que conseguiram, deixo um conselho, nunca exclua a possibilidade de ver o seu “bicho instinto” querendo dar as caras. Lembre-se: ele está preso, não morto. A decisão de deixar-se (ou não) dominar por ele está em suas mãos.
Dani Marques
Esse artigo foi inspirado em um bate-papo sensacional que tive com Gedson Lidorio – escritor, teólogo e psicanalista.