Deus fica bravo?

Amigos, há um número relativamente grande de pessoas que defende uma tese antiga: Deus é um velhinho de barba branca e comprida, sempre afagando crianças que pega no colo e sempre correndo desesperadamente atrás do homem pecador. Este Deus caricato nunca fica bravo. Nunca se irrita, nunca fala alto e em hipótese nenhuma faria qualquer coisa para desalojar o ser humano do seu trono antropocêntrico. Nem é preciso dizer que um Deus como esse jamais criaria uma coisa tal como um inferno de fogo, onde pecadores impenitentes passariam a eternidade. Um lugar como esses não faz o menor sentido para os que crêem num Deus como esse. Durante toda a minha vida ouvi esse lenga-lenga: Deus sempre arruma um jeitinho para nos livrar das encrencas em que nos metemos.

A questão é que sempre ouvi isso de pessoas que não conheciam a Deus, nem a revelação que Ele faz de si mesmo nas Escrituras. Eram pessoas que não tinham a iluminação do Espírito Santo, mas ainda permaneciam escravizadas às suas crendices religiosas. Elas tinham ouvido falar certas coisas sobre Deus e, uma vez que era exatamente o que lhes interessava, repetiam exaustivamente até que, pelo menos para elas, aquilo se tornasse verdade. A solução para tais pessoas era sempre a mesma: o Evangelho da graça, que aponta para realidades mais amplas sobre Deus e sobre a condição do ser humano afastado dele.

O que espanta hoje em dia é que esta mesma ladainha agora faz parte também do cardápio que é distribuído de cima dos púlpitos dos que se autoproclamam “evangélicos”. Já vi gente que se diz inclusive “conservador” (não sei bem o que isto quer dizer atualmente) dizer que toda tentativa de apresentar um Deus irado contra os pecadores, com prerrogativas de contra eles tomar vingança, punir e botar ordem na casa, é um retrocesso histórico e cultural. É “fruto do puritanismo norteamericano”, dizem. Há “pastores” e “mestres” que não hesitam em mandar brasa: “não acredito num Deus que destrua ou mate; se eu descobrir um Deus como este, não apenas o rejeito como me disponho a lutar contra ele” foi a frase ouvida num seminário evangélico por um grande e confiável amigo meu, proferida da boca de um desses.

Nunca acreditei em apologética no sentido de “defender a verdade”. Digo isso porque penso que Deus não precisa de defesa. Ele nunca se preocupou em arrazoar científica ou filosoficamente com os intelectuais. Simplesmente ele entra em cena e acabou. Para aqueles que crêem, mesmo sem condições de compreender tudo o que lhe diga respeito, dada a limitação natural de ser humano, Deus faz sentido por si só. Agora, gostaria que os defensores do “Deus velhinho de barba branca”, que não têm coragem de chamar a atenção nem a uma mosca, pudessem explicar alguns textos que estão na minha Bíblia e insistem em lá permanecer (apesar de jeitosamente esquecidos na pauta dos pregadores de hoje). Se Deus é só amor, só paixão e compaixão, se ele só quer saber mesmo é de morrer de amor e jamais se ira a ponto de se indignar e tomar atitudes drásticas contra o pecado e os pecadores, como explicar Sodoma e Gomorra? Como explicar o dilúvio? Como explicar a invasão e destruição dos cananeus? Como você encaixa o “Velhinho-de-Barba-Branca” no Salmo 2:5: “Na sua ira lhes há de falar, e no seu furor os confundirá”, a respeito do que Deus vai fazer com os povos que desprezam a Jesus, o Ungido do Senhor?

Ah, pois não. Esse é o Deus do Velho Testamento. É o Deus dos puritanos. É o Deus dos fundamentalistas, atrasados, ultrapassados. Quando veio Jesus, tudo isso mudou. Agora é tudo paz e amor. Pois sim. Inegavelmente, a cruz de Cristo é a maior expressão de amor e graça de que este mundo teve notícia. Mas você já leu o que Deus diz a respeito daqueles que não aceitam esse amor demonstrado pela morte do Senhor por eles? Os adeptos do “Deus paz-e-amor” já leram, por exemplo (e note que agora estamos no Novo Testamento, já na era pós-encarnação e pós-morte de Jesus), Hebreus 2:2,3:

Pois se a palavra falada pelos anjos permaneceu firme, e toda transgressão e desobediência recebeu justo castigo, como escaparemos nós, se descuidarmos de tão grande salvação? A qual, tendo sido anunciada inicialmente pelo Senhor, foi- nos depois confirmada pelos que a ouviram.

Ainda em Hebreus12:28-29:

“Pelo que, recebendo nós um reino que não pode ser abalado, retenhamos a graça, pela qual sirvamos a Deus agradavelmente, com reverência e temor; pois o nosso Deus é um fogo consumidor.”

E o que dizer de 1 Tessalonicenses 2:

“… quando do céu se manifestar o Senhor Jesus com os anjos do seu poder em chama de fogo, e tomar vingança dos que não conhecem a Deus e dos que não conhecem a Deus e dos que não obedecem ao evangelho de nosso Senhor Jesus; os quais sofrerão, como castigo, a perdição eterna, banidos da face do Senhor e da glória do seu poder.”

E 2 Pedro 3:5-8:

“Pois eles de propósito ignoram isto, que pela palavra de Deus já desde a antiguidade existiram os céus e a terra, que foi tirada da água e no meio da água subsiste; pelas quais coisas pereceu o mundo de então, afogado em água; mas os céus e a terra de agora, pela mesma palavra, têm sido guardados para o fogo, sendo reservados para o dia do juízo e da perdição dos homens ímpios.”

E o livro de Apocalipse, com toda a tenebrosa descrição do juízo que será despejado aos baldes sobre a terra e seus moradores rebeldes, é ficção? É poesia?

A crítica que ouço é que “os puritanos gostam mais desses versículos do que daqueles que falam do amor de Deus”. Muito bem. Antes de mais nada, não sou puritano e sei que a ênfase que foi dada a este aspecto das Escrituras pode ter sido desproporcional. Não nego isso, mas também não estou discutindo isso. A questão em tela é que este ensino não é “dos puritanos”. É da Bíblia. Tem o mesmo peso e o mesmo valor de “Deus prova o seu amor para conosco pelo fato de ter Cristo morrido por nós sendo nós ainda pecadores” ou “Nada pode nos separar do amor de Deus” ou “Deus amou o mundo de tal maneira que Deus seu Filho unigênito para que todo o que nele crê tenha a vida eterna”. Embora cada um de nós possa, por diversos motivos, identificar-se mais com este ou com aquele texto, nenhum de nós tem o direito de omitir ou se esquivar daquilo que foi deixado para nossa advertência. Não temos que dar nem mais nem menos ênfase a este ou àquele atributo da divindade. Labora em erro quem faz qualquer uma dessas coisas.

Existe um Deus que ama e ama de verdade. Tanto que nos enviou Seu Filho amado para fazer-se carne, habitar entre nós e resolver o problema do pecado definitivamente. Este mesmo Deus é um Deus totalmente santo, tão puro de olhos que não pode ver o mal, segundo Habacuque 1:13. É o mesmo Deus a quem pertence a vingança e que retribui o mal feito, segundo Romanos 12:19. Não são “Deuses” diferentes. Um não é o Deus puritano e o outro neo-liberal e pós-moderno. Um não é o Deus da “religião” e o outro da “liberdade de uma espiritualidade mais descolada”. Só existe um Deus, que convive equilibradamente com estes aspectos, de tal maneira que nenhum deles pese de forma desproporcional ou injusta. O que passar disso vem do maligno.

Não é de admirar que quem ainda não O conhece duvide de que isto é possível. Quem anda com o Deus verdadeiro pela fé não tem dúvida a respeito disso.

De que lado você está?

Pensando bem:

Para aqueles que vivem exigindo que eu cite “nomes”, um recado: se o seu pastor ou professor ou líder prega as coisas apontadas neste texto, ele é um deles.