Sem rumo

Amigos, escrevo pela primeira vez a respeito do governo Lula. Não que esta seja uma coluna de política, mas já que é para comentar o fato da semana, esperei para ver se seria relevante. E foi.

Não que eu considere justo ou ponderado fazer uma análise definitiva de um governo ainda no final de seu primeiro ano. Muito menos que eu desconsidere o fato de que, para comparar com alguma justiça o Lula com seu antecessor, precisamos esperar pelo menos mais 7 anos. Foi o tempo em que os tucanos-urubus estiveram no poder. Só então poderemos estabelecer termos melhores para dizer quem foi pior do que quem. Inclusive já é bom ir deixando claro que qualquer um pode criticar o governo, menos o tucunato. Chega a dar nojo ver a tropa de choque do PSDB discursando no Congresso e nas propagandas políticas e criticando, por exemplo, como na última vinheta do partido, “um governo de juros altos, que gasta mais com o FMI do que com educação”. Dá para acreditar que o partido que fez os acordos que ora são honrados tenha o descaramento de dizer isso? Cabe na sua cabeça que um tucano tenha a coragem de falar em “juros altos”, se quando deixaram o governo a taxa Selic batia nos 26,5%?

Eu posso falar do governo, porque eu votei no Lula. Nunca fiz campanha, sempre respeitei quem pensava diferente, mas assumo que votei e hoje direi porquê.

Foi justamente porque eu sabia que o país não suportaria mais 4 anos de tucanices. Estávamos estourados em todos os sentidos. Os últimos anos só foram bons para banqueiros ou para aqueles que fazem suas fortunas através da agiotagem, formal ou informal, legal ou ilegal, em um país onde quem produz ganha um terço do que quem especula no mercado financeiro.

Foi um tempo em que se agravaram as injustiças sociais e os disparates da vergonhosa distribuição de renda no Brasil. Foi um tempo em que se divulgavam estatísticas fraudulentas, demagógicas, para “inglês ver”. Um exemplo disso estava na Educação. Paulo Renato dizia que quase 100% das crianças estavam na escola. Alguém deveria fazer hoje um estudo com os alunos que entraram na escola durante o governo FHC ou os governos estaduais do PSBD e iríamos descobrir a beleza do ensino desses últimos 8 anos. A maioria dos alunos que entrou na escola nesse período nem sabe ler e escrever direito.

Foi um tempo de apagão, quando ficamos no escuro literalmente, fomos obrigados a viver descobrindo maneiras de viver sem energia elétrica e ainda fomos obrigados a pagar a conta para as empresas multinacionais que não podiam ter prejuízo.

Foi o tempo dos seqüestros, do tráfico da desordem.

Foi o tempo de abafar CPI´s, de entregar o patrimônio do povo de mão-beijada, com a farra das privatizações. Aliás, faltou explicar onde foi o dinheiro delas. Além de venderem pela metade do que valia, não conseguiram aliviar a dívida pública, que, ao contrário, triplicou de tamanho.

Foi por tudo isso que votei no Lula. Não por achar que ele ia mudar tudo. Não por acreditar nos “10 milhões de emprego” e nem por acreditar que no fim do seu governo, “todo brasileiro teria direito a três refeições por dia”, como ele disse no seu discurso de posse. Mas para mudar. Do jeito que estava não dava para ficar.

Então, acabou a campanha. Havia projetos, havia incertezas, havia medo de que o governo rompesse os contratos firmados. Nada disso aconteceu e o tal “mercado” começou a ficar tranqüilo. O dólar caiu, o risco Brasil caiu, renovaram o contrato com o FMI e até a bolsa e o Palmeiras subiram. O “mercado” foi ficando cada vez mais feliz, beirando o deslumbramento. Daí a minha pulga de estimação, a FHC, voltou pra trás da minha orelha. Porque quando o “mercado” está feliz, algo me diz que o povo vai sofrer. Quando os banqueiros enchem os bolsos, os meus sempre se esvaziam. Porque é do couro que sai a correia. Se alguém ganha demais, alguém vai perder demais. Esta é a regra do jogo.

Agora, aparece o Valdomiro. E com ele as nuvens carregadas que começaram a cobrir o Palácio do Planalto. De repente, surge a figura quase imperial de Dom José Dirceu, que com a cara mais lavada do mundo, considera o assunto “encerrado”. “Não”, grita o povo. “Queremos uma CPI”. “Mas ela vai atrapalhar a economia”, rebate o governo. “Mas ela é política”, grita outro defensor. “A gente já fechou os bingos. Não precisa fazer mais nada”. Espere. Espere mais um pouco. Espere e repita. Quem está dizendo isso? Será que a fita voltou e parou no lugar errado? Não, não é possível. Já ouvi estes argumentos antes. Quem mesmo os defendia? Não, não pode ser. O PSDB? A base do governo anterior? Imagina, você ficou louco! Deputados e senadores do PT jamais se oporiam a uma CPI para investigar denúncias de corrupção. Eles são pela ética, pela transparência. Foi esta a bandeira com a qual o PT foi criado e cresceu. Chegou ao poder falando disso. E até aqui, vinha tendo uma prática coerente. Se perder isso, vai ter que voltar para a porta da fábrica no ABC (quer dizer, naquelas que sobraram) e começar tudo de novo.

Que rumo este governo quer tomar? Onde pretende chegar? Aliado a José Sarney, Renan Calheiros e ACM, pode-se esperar coisa boa? Detalhe já destacado: eu posso falar isso porque votei no Lula. Os que votaram no Serra têm que ficar caladinhos, porque Lula só é ruim justamente porque imita Fernando Henrique, nos atos e na ética.

Por isso, estou procurando o telefone do gabinete da Heloísa Helena. Quero ligar para ela. Se alguém souber, me passe. Isso, sim, é que é coerência. Ela é mesmo a minha voz neste Senado agora. Parabéns, HH! É assim que se faz. Nada de dobrar-se ao sabor do vento que interessa mais. Mudar sim, sempre que preciso. Adaptar-se às novas realidades, ajustar-se às demandas impostas pelos novos tempos, tudo bem. Mas vender a honra, isso jamais.

Que o governo acorde enquanto é tempo. Vou orar por isso. Mesmo porque, no tempo da ditadura e dos governos que priorizavam os interesses de uma minoria, fomos ensinados que os cristãos devem orar pelo governo. Agora, parece que alguns se esqueceram disso. Então, é para orar só quando o nosso partido está no poder ou é para orar em qualquer circunstância, para que Deus tenha misericórdia de nós e nos dê a paz? Agora é Lula, então agora não precisa mais de oração?

Continuamos precisando, talvez mais do que nunca, inclusive porque este governo até aqui segue sendo o mesmo de todos os outros antes dele.

Pensando bem:

Ore pelo governo brasileiro.