Mudança de paradigmas: A identificação de uma igreja bíblica

As chamadas “igrejas neo-testamentárias”, ou “as igrejas que se reúnem como nós”, ou “as igrejas de Deus que estão em tal lugar”, ou ___________________ (complete o espaço em branco como você preferir), normalmente ensinam que os seguintes pontos definem uma igreja como sendo uma igreja que segue o Novo Testamento:

1. Ausência de vínculo institucional ou denominacional
Isso significa que Deus nunca estabeleceu qualquer concílio humano ou uma sede terrestre para a sua igreja, antes indicou que cada igreja local deveria ser autônoma e independente, embora devesse manter comunhão e colaboração com as demais. Cada igreja é uma manifestação local do corpo de Cristo em um determinado lugar. Na verdade, você não encontrará nomes, constituições nem convenções de qualquer espécie no Novo Testamento quando se trata de Igreja de Deus. A igreja não era, portanto, uma organização, mas um organismo.

2. Ausência da distinção entre “cleros” e “leigos”
Claro que havia os apóstolos que tinham autoridade e claro que os verdadeiros líderes eram respeitados. Mas não foi senão muito depois da morte do último apóstolo, já dentro da igreja decadente que abraçou-se ao império Romano que apareceram os primeiros “ordenados para o ministério sacerdotal” da história da igreja. Quando veio a Reforma, este aspecto não foi modificado. Não nos esqueçamos de que os instrumentos de Deus para conduzi-la eram na sua maioria, senão todos, oriundos da Igreja Católica, e embora protestaram a respeito de alguns dogmas centrais da fé, as igrejas que formaram eram fortemente influenciadas pelo estilo eclesiástico católico. Este foi um mal não corrigido pela Reforma. É um resquício da igreja apóstata que só causaria preocupação anos mais tarde, quando irmãos de várias partes do mundo começaram a desejar reunir-se o mais próximo possível do padrão do Novo Testamento. Embora alguns não gostem desta alcunha, esta é a razão porque ficaram conhecidos como “O Movimento dos Irmãos”. Eles não queriam ter entre si títulos que fizessem diferença de um irmão para outro. Queriam que todos fossem conhecidos apenas como “irmãos”.

3. Liderança plural
Ao invés de ter na igreja um único homem, “do clero”, formado do seminário e que toma todas as decisões sozinho, a igreja bíblica é governada por um colegiado de homens de Deus, reconhecidos pela igreja por seus dons, ministério e caráter.

4. Observância a alguns princípios de reunião
Os ajuntamentos da igreja eram realizados no poder do Espírito Santo, que se manifestava em meio a uma postura regulamentada no povo de Deus. Isto tem a ver com a participação dos irmãos, a ordem do culto, uso do véu etc.

Há alguma coisa a ser questionada ou abandonada no que está exposto? Não vejo porquê. Pessoalmente (atenção agentes secretos, anotem isso!) eu tenho convicção e ensino estas coisas. Na igreja local onde me reuno ensinamos isso à igreja e é dessa forma que conduzimos o trabalho local. De forma geral, descontadas as diferenças de interpretação aqui e ali, todos concordam que é assim que deve ser. Onde está o paradigma? Aí é que está a sutileza. Em cima de coisas corretas e bíblicas, foram criados alguns paradigmas absolutamente humanos.

Em primeiro lugar, o que identifica uma igreja como verdadeira ou falsa não é a forma como ela se organiza ou se reúne, mas é fundamentalmente o que ela prega e o que ela crê. Ou seja, há mais no Novo Testamento para crivar uma igreja do que somente esses pontos e suas subdivisões. Por exemplo, Paulo escrevendo aos Tessalonicenses diz que eles eram um “modelo (protótipo, padrão, paradigma) para todos os crentes” (I Te 1:7) e não foi por seguirem nenhum dos pontos acima que eles foram chamados assim. Os motivos apresentados são bem outros. Analisar a autenticidade de uma igreja com base em meia dúzia de princípios é paradigma humano. É muito triste quando alguém se sente no direito de determinar quem são as igrejas verdadeiras e quem são as falsas baseado apenas em alguns preceitos que, mesmo sendo bíblicos e corretos, não resumem tudo o que significa ser “uma igreja do Novo Testamento”. E o pior é que algumas vezes nem bíblico é o preceito. Muitas vezes são apenas repetições de conceitos humanos, advindos de distorções grosseiras das Escrituras.

Este paradigma perverso tem sido a causa de muito mal-estar entre irmãos e nunca deu qualquer fruto, a não ser um orgulho intragável daqueles que se acham os únicos defensores da verdade. Passou da hora da gente parar com bajulação barata para ganhar IBOPE, dando-lhes um espaço que não merecem para envenenar o povo de Deus com esse espírito.

Em segundo lugar, as igrejas que seguem estes princípios (às vezes nem seguem tanto quanto imaginam), depois de décadas submetidas ao tratamento de choque, quase uma lavagem cerebral, com o primeiro paradigma, acabam acreditando que são realmente melhores do que as outras. Basta ver a maneira como se referem aos que fazem qualquer coisa diferente deles.

Ora, ainda que fossem esses os únicos requisitos de fidelidade, ao obedecer ao mandamento estaríamos fazendo apenas e tão somente a nossa obrigação. Não há qualquer motivo de orgulho quando estamos fazendo apenas o que se espera de nós. Mas ainda menos motivo temos quando fazemos menos do que se espera de nós.

Em terceiro lugar, a gente começa a acreditar que se cumprirmos os quatro pontos acima, tudo estará automaticamente resolvido. A igreja vai crescer e tudo vai bem. Aliás, perdoem-me a injustiça. Na verdade, os que defendem este ponto de vista raramente esperam que uma igreja cresça em número, porque segundo eles crescimento é a marca de quem não é autêntico. Durante décadas há pessoas que estão tentando se convencer e convencer aos outros de que Deus está tão contente conosco e que tudo o que se tem a fazer é continuar assim. Desenvolvemos uma estranha equação:

1) 4 princípios bíblicos + nossos paradigmas = resultados pífios

2) resultados pífios + (4 princípios bíblicos + nossos paradigmas) = fidelidade

3) fidelidade = aprovação de Deus
CONCLUSÃO: Nossos parcos resultados provam que nossos paradigmas estão certos e que Deus aprova tudo isso.

O problema é que, como tem coisa faltando na receita, o bolo não cresce. Fica aquele negócio seco, grudado na forma, sabe como? É por isso que ninguém engole mais.

Amigos, o paradigma divino não mudou. O seu propósito para a sua verdadeira e amada igreja continua o mesmo. O que cabe à nossa geração é descobrir o que alguns insistem em esconder: que a igreja verdadeiramente neo-testamentária é determinada por TUDO o que ele falou, não apenas pelas coisas que nós jeitosamente escolhemos, para facilitar as coisas na hora de explicar nosso fracasso.

Pensando bem:

“Tradição é a fé viva dos que já morreram. Tradicionalismo é a fé morta dos que ainda vivem.” Charles Swindoll