Os Fariseus IV

5. Gostavam muito de perguntas difíceis, mas não estavam interessados em aprender coisa alguma (Mt 22:15-22; 34-40; Mc 10:2)

Volta e meia você encontra os fariseus em reunião. Gostavam delas. Suas reuniões tinham como objetivo a formulação de perguntas bonitas, profundas, intrigantes. Mas sempre perguntas com segundas e terceiras intenções. Perguntas capciosas, provocativas, desafiadoras. Eles não queriam saber, não estavam preocupados em aprender. Aliás, o que se pode ensinar a um fariseu? Eles já sabem tudo!

Algumas ocasiões, as perguntas dos fariseus geraram dúvidas nas mentes dos discípulos também. Mas é notável a diferença como Jesus respondia a uns e a outros. A razão não é que Jesus já estava com a paciência esgotada ou com os nervos à flor da pele e dava logo uma resposta atravessada para cortar a conversa. Isso não acontecia com ele. Ele não precisava disso. Provou quem era e qual a sua sabedoria em cada resposta que deu. Mas ele sabia muito bem qual a intenção daqueles homens. Sabia onde queriam chegar e não perdeu tempo com eles além do necessário para ensinar, não a eles, mas aos outros que estavam por perto, alguma lição que valesse a pena levar para casa. O objetivo dos fariseus era criar polêmica para atrapalhar o ambiente. O de Cristo era ensinar para edificar vidas.

Nada contra uma mente questionadora. Nem sempre questionar é ser rebelde. Quem pergunta com sinceridade, querendo mesmo aprender, só tem a ganhar com isso. Mas não tem valor algum a pergunta conturbadora, que não acrescenta nada. Essa é descartável. Paulo, por exemplo, podia passar horas ensinando uma igreja, mas mandou Timóteo não perder tempo com “discussões insensatas, que para nada aproveitam, senão para a subversão dos ouvintes”.

Lembro-me de ter lido em algum lugar que o desenvolvimento humano atravessa, em geral, três fases: na primeira, aprendemos a fazer perguntas; na segunda, aprendemos as respostas a essas perguntas; na terceira, a fase da maturidade, aprendemos quais perguntas valem a pena serem feitas. Parece que os fariseus nunca chegaram a esse ponto.

6. Gostavam de dizer o que fazer, mas nunca faziam o que diziam (Mt 23:3)

O discurso dos fariseus sempre foi muito bem elaborado. Palavras certas, entonação, demonstração técnica de saber textual. Pregação bonita, de encher os olhos e os ouvidos. Suas aplicações dos textos difíceis da lei eram bastante complicadas. Sua exigência de consagração e dedicação à lei era bastante elevada. Moralistas, pregadores da santificação, da purificação cerimonial, defensores da identidade judaica como nação e como religião, exclusivistas extremados e radicais, sabiam tudo o que o povo devia fazer. Qual deveria ser sua ética, qual a melhor teologia, qual a melhor interpretação. Chegavam ao exagero de exigir coisas que nem mesmo Deus tinha exigido, só para mostrar como eles eram zelosos.

Mas tinham um pequeno probleminha básico: não faziam nada do que pregavam. A atual máxima (ou seria “mínima”??) “faça o que eu mando, mas não faça o que eu faço” nada mais é do que uma paráfrase desta denúncia do Senhor Jesus à atitude farisaica. Muita retórica, muita teoria, muito “blá-blá-blá”. Mas prática que é bom, zero. Se você quisesse andar direito, poderia até ouvir a mensagem dos fariseus, mas se tivesse vergonha na cara, não seguiria o seu exemplo.

Até hoje é assim. Quem mais vocifera contra o que chama de “desvio da verdade” são os que mais à margem dela se encontram. Isso vale mais do que nunca para as igrejas chamadas de “Os Irmãos”. É possível que no mundo evangélico de hoje não exista um grupo que mais caia neste erro do que nós. Enquanto criticamos amargamente os concílios humanos, defendemos nossos próprios modos de intervenção branca guetos através de nossas publicações e cruzadas “anti-tudo”. Exemplos? “Não se pode criar instituições pára-eclesiásticas”, a não ser aquelas que nós mesmo criamos. “Não se pode ter pastor ordenado”, porque segundo o que se ensina (embora isso nem seja mais verdadeiro) um pastor só detém o “controle sobre a igreja”. Mas os que mais gritam contra isso são precisamente os maiores dominadores de rebanho que a história da igreja brasileira já conheceu. Não são raros os casos daqueles que mandam e desmandam não apenas na sua própria igreja, como até em regiões inteiras. “Não pode haver agências missionárias”, porque é para haver independência e responder só ao Senhor, mas volta e meia um obreiro tem suas ofertas cortadas porque não quis seguir a batuta dos mantenedores, o que se constitui no pior e mais vil de todos os cabrestos: o do poder econômico.

Então, façamos o que Cristo mandou fazer com os fariseus. Ouçamos o que eles tem a dizer, mas vivamos ao contrário do que eles vivem. Não os imitemos. Muito da desgraça dos nossos dias reside no fato de que as pessoas tem medo de combater esta hipocrisia. Sob a desculpa do “respeito aos líderes”, escondemos o verdadeiro cerne do problema que sacode esta geração e que custará caríssimo a todos nós: precisamos deixar de ser a igreja que sabe tudo (ou julga que sabe) e passarmos a ser a igreja que faz aquilo que sabe.

Só assim seremos suficientemente autênticos para termos algum dia uma identidade para defender.