Maquilando defunto

Amigos, a vida não é fácil para ninguém. Minha amiga Nilva Heffernan que me desculpe, mas discordo dela quando ela fala que “a vida é dura pra quem é mole”. Acho que a vida é dura mesmo para todo mundo. Mas para alguns, a coisa parece pior.

Um dia desses, assistindo a uma dessas reportagens feitas por jornalistas que não têm muito o que fazer (e que são passadas para quem tem menos ainda assistir), acabei vendo uma coisa que comprova o que disse acima. Um homem , agente funerário de elite, oferece um serviço VIP para quem quer enterrar seus queridos com muita classe e cheiro de “Azzarô”. Ele não dá um simples “banho” no cadáver, mas vende um pacote de preparação mortuária, que inclui maquilagem, sombra, batom, pó de arroz, banho de perfumes finos, penteados especiais e mais uma porção de coisas que darão, segundo ele, uma aparência melhor ao falecido. Que servicinho complicado, hein?

Ora, com todo o respeito que o assunto merece, porque mexe com os sentimentos da gente, e sem querer fazer pilhéria com ele, quero dizer que, pessoalmente, eu dispenso os serviços do amigo. Quando eu morrer, podem enterrar o mais rápido possível, nem precisa velar muito (alguns vão querer fazer isso mesmo, mas eu me dirijo aqui aos meus verdadeiros e muitos amigos…). Afinal, o corpo só vai voltar ao pó mesmo, é uma lei debaixo da qual todos nos encerramos. O espírito volta a Deus que o deu, o resto espera a redenção da glória.

Mas o serviço deste senhor me fez pensar que muitas vezes a gente acaba perpetuando certas coisas, atitudes, filosofias, jeito de ser e de trabalhar, e até de servir a Deus e que não funcionam e não servem para mais nada, senão para enterrar. E dá-lhe maquilagem para ver se melhora a cara.

Não raras vezes, conhecemos ou freqüentamos igrejas que estão mais mortas do que vivas, mas que fazem o possível para fingir que não estão. Tendo reuniões em que se canta de olhos fechados e em que se prega a reafirmação dos conceitos que favoreçam a cúpula dominante, está ótimo. Para esconder as mazelas de um modelo falido, muitas vezes se promove a exacerbação do homem, a colocação de pessoas em pedestais para acrisolar vaidades e promover uma apologia do que não funciona, e já se mostrou ineficaz.

Como seria bom ouvir de vez em quando a voz que diz “Desperta, ó tu que dormes, levanta-te de entre os mortos e Cristo te iluminará” (Ef 5:14). Se a coisa não vai bem, não adianta maquilar. O que está morto, está morto. Só o poder de Deus pode ressuscitar. Não adianta continuar agindo como se aquilo fosse permanecer para sempre, se a sua época já passou. É a lição dos “odres velhos e odres novos” que Jesus falou aos farizeus. Às vezes ficamos tão obcecados pela idéia de provar que os outros estão errados, que ficamos eternamente velando cadáver. Cadáveres como o tradicionalismo inconseqüente, a falta de visão, nossa maneira de trabalhar sem resultados e etc.

É tão difícil nos livrarmos deles como é difícil a hora da separação de um ente querido. Mas o fato é que temos de encarar que, se o nosso modelo chegou ao fim, que descanse em paz! Se eu não posso oferecer mais, porque o meu vinho já secou, que Deus levante outro e conduza as coisas para a glória do Senhor. Se a minha maneira de trabalhar não tem produzido frutos, por mais que eu goste ou esteja acostumado e ela, que se vá. Aliás, se é por falta de adeus, até logo.

Até quando vamos segurar o avanço da obra de Deus na nossa igreja ou na nossa cidade porque estamos empetecando o que já se foi?

Pensando bem:

Só um imbecil não muda de idéia.