“…conflitos externos e temores internos. Deus porém consolou-nos com a chegada de Tito”
(2 Co 7.5,6)
O suicídio de pastores, líderes e filhos de líderes cresce e preocupa, tendo sido até batizado de “onda de suicídios”, mesmo não sendo algo novo. Há registros bíblicos de líderes como Sansão, Saul e Judas que tiraram suas vidas. Van Gogh, que além de pintor foi pastor, é um dos mais famosos a aplicar a pena capital contra si mesmo. Nos últimos anos, vários pastores americanos tiraram suas vidas e, assim como no Brasil, o fato passa a ter certa frequência.
O que está acontecendo com os que estão na função de cuidado, mas não conseguem administrar suas próprias demandas? Por que pessoas que já ajudaram a tantos, desistem da própria vida? De acordo com o Instituto Schaeffer, “70% dos pastores lutam constantemente contra a depressão, 71% se dizem esgotados, 80% acreditam que o ministério pastoral afetou negativamente suas famílias e 70% dizem não ter um amigo próximo”.
A causa mais comum noticiada para o suicídio de pastores e líderes é a depressão associada ao esgotamento físico e emocional, além de traições ministeriais, baixos salários e isolamento por falta de amigos. Sim, pastores têm poucos amigos, e às vezes nenhum. Isso é visível em reuniões nas quais a maioria conta proezas, sucessos, vitórias e conquistas na presença dos demais, num clima de competição para mostrar que possui êxito no exercício ministerial. Entretanto, quando a conversa é íntima, o sofrimento se revela. Boa parte está cansada, desanimada, chateada com a igreja e com a liderança. Muitos possuem dificuldades no cuidado com a família e as finanças de alguns estão desequilibradas.
Isso acontece, em parte, porque pastores contemporâneos são cobrados como executivos ou técnicos de clubes de futebol, que precisam oferecer resultados numéricos às suas instituições. Caso contrário, perdem seus membros, emprego, salário, moradia e sustento da família. É uma pressão enorme sobre os ombros de um ser humano.
A figura do pastor-pai-cuidador está escassa; aquele que expõe a Palavra à comunidade-família, aconselha os que sofrem e cuida dos enfermos e das viúvas. Há uma crise de identidade funcional entre o chamado pastoral e as exigências do mercado religioso institucional.
Ao olhar as palavras de Paulo no texto acima citado, percebe-se como o Senhor usou a chegada de Tito para consolá-lo no momento em que ele passava por conflitos internos e externos. Há alguns anos, a psicóloga Fátima Fontes, quando perguntada sobre livros que pudessem ajudar em momentos difíceis, respondeu com brandura e firmeza: “Nesses momentos, não precisamos de livros, precisamos de amigos”. É verdade, parece que é isso que o apóstolo deseja ensinar, quando menciona a chegada de Tito, bem como o pedido que faz a Timóteo em uma carta, no final de sua vida: “traga Marcos com você porque ele me é útil” (II Tm 4.11). É notável que nos versos seguintes ele pede a capa, os pergaminhos e os livros. Mas primeiro ele precisava de uma pessoa, Marcos. Como diz o Ed René Kivitz: “pessoas precisam de Deus, mas pessoas também precisam de pessoas”. Foi “a chegada de Tito” que consolou o apóstolo Paulo, e era Marcos, acima da capa e dos livros, que teria mais utilidade.
É urgente que se perceba a humanidade limitada e finita de pastores e líderes e que passos sejam dados por indivíduos e instituições para melhorar a qualidade de vida dos que servem ao corpo de Cristo. Seguem algumas sugestões:
Pastores:
- Fazer algo que traga alegria, prazer: ver filmes, pescar, caminhar, nadar, dançar, viajar. Atividades que o façam se sentir mais humano;
- Encontrar um amigo que o aceite como é, com suas bobagens e defeitos, com quem se possa jogar conversa fora e não se saiba explicar o porquê da amizade. Ela apenas existe, nada mais, sendo inclusive possível fora de sua igreja local;
- Encontrar um conselheiro ou terapeuta de confiança para abrir a alma. Pessoas de confiança, “Titos” e “Marcos” são imprescindíveis nas horas difíceis, diante das lutas da vida que parecem invencíveis.
Instituições:
- Promover encontros de pastores que possuam caráter terapêutico/curador com facilitadores habilitados na condução de compartilhamento de emoções que afetam a vida pastoral;
- Diminuir as pressões de resultados sobre a função pastoral. Pastor não é um executivo, nem técnico de futebol, mas um cuidador do rebanho-família;
- Estabelecer um padrão mínimo de orçamento-salário pastoral, para que ele e sua família não sofram privações.
Que o Senhor continue a prover sobre seu rebanho “pastores segundo o seu coração”. Amém.