Amigos, é meu primeiro artigo do ano novo. Normalmente, deveria se esperar um texto falando de esperança, reflexões para viver um ano feliz, uma retrospectiva, uma análise do que se foi e do que se espera. De certa forma, farei isso. Mas não esperava fazê-lo a partir de um evento desta natureza.
Confirmando o que a Bíblia diz, os pecados de alguns homens se manifestam imediatamente, ao passo que outros demoram um pouco, mas acabam um dia vindo à luz. No último Jornal da Band de 2009, o até então impoluto jornalista Boris Casoy, defensor da ética, da cidadania, da lisura e da justiça social, fez um comentário absolutamente preconceituoso e desprezível, humilhando dois garis que tinham acabado de desejar aos telespectadores um feliz ano novo. Sem saber que o áudio estava aberto, Casoy comenta com os colegas de bancada: “que m… dois lixeiros desejando felicidades do alto de suas vassouras” e “dois lixeiros, o mais baixo da escala do trabalho”. Não apenas isso, mas o comentário foi seguido de gargalhadas pelos colegas de bancada. Qual foi a graça do comentário, para justificar as risadas? Consentimento? Aprovação?
O episódio gerou protestos indignados por todo o Brasil, inclusive deste colunista numa carta à direção da TV Bandeirantes. Ao saber que o Brasil tinha ouvido sua infeliz declaração, Boris foi obrigado a se desculpar. No dia seguinte, num comentário lido e com uma indisfarçável má vontade, ele afirmou que “num vazamento de áudio” (como se o problema fosse esse e não o que fora dito) ele tinha feito um comentário ofensivo aos garis e pedia “profundas desculpas”. Interessante que para fazer o comentário ele falou sem ler nada. Veio de dentro, do coração. Era o que realmente pensava. Na hora de pedir desculpas, precisou de um teleprompter. Quem consegue acreditar que entre o arrependimento sincero e a pressão do departamento jurídico da emissora prevaleceu o primeiro? Não seria surpresa se um dia viermos saber que o demitido foi o operador de áudio que deixou passar a sujeira escarrada da boca do ex-jornalista em atividade.
Carregado de prepotência, o comentário demonstra claramente o verdadeiro homem por trás do terno e do microfone. Um ser que se considera acima dos demais, para quem a função que se exerce nos escalona. Onde estaria, nesta visão, a profissão de jornalistas? Se fôssemos contar pelo número de calhordas como ele que a exercem, haveria classificação? Do alto de suas vassouras garis prestam um serviço mais útil do que todos os jornalistas que a Boris se assemelham deste país. Sem garis o Brasil para. Sem gente como Boris Casoy andaríamos mais depressa, com menos hipocrisia e mais ética, cidadania, lisura e justiça social.
Não nos esqueçamos, no entanto, de que não é somente o Boris que pensa assim, para vergonha de boa parte da população. Que sejam ouvidos os garçons, porteiros, empregadas domésticas e babás por este Brasil e ficaremos estarrecidos com as histórias de humilhação, desprezo e desumanidade com que são tratados diariamente por muita madame de classe média. A máxima odiosa do “você sabe com quem está falando” é a verbalização do sentimento casoyano de que alguns valem mais do que outros em função do carro que dirigem, do bairro onde moram, da profissão que exercem, do sobrenome que carregam ou da cor de sua pele. Tem gente que ainda acredita na satânica mentira (se bem que todas as mentiras são satânicas) da raça superior, da classe média esclarecida, dos povos “desenvolvidos”. São aqueles que ainda aceitam rótulos, classificações, ou como ouvimos no bendito vazamento, “escalas”. Eu cheguei lá, você não. Então eu valho e você não vale nada.
Não nos esqueçamos de que este é um sentimento que ronda todo e qualquer coração. Faz parte da natureza decaída e perversa do ser humano. Todos nós temos o potencial de pensar e agir de acordo com esses valores invertidos, que leva alguém a achar que é mais do que alguém, pelos mais variados motivos. Ainda hoje, pleno 2010, escuto da boca de gente que se acha esclarecida, cristãos até, piadinhas de mau gosto, racistas, preconceituosas, zombeteiras, vergonhosas e desprezíveis. Para não parecer desagradáveis, os bajuladores ao redor dessa gentalha costumam rir. São como os colegas de bancada do Boris. Nota zero para quem conta a piada e nota zero para quem ri delas. São como o ladrão e o receptador. Tornam-se cúmplices das obras infrutíferas das trevas, ao invés de reprová-las (Efésios 5:11).
Que o acontecido no apagar das luzes de 2009 no telejornalismo nacional sirva para reflexão de todos os cristãos de bem neste país, de modo que nos recusemos a compactuar com toda sorte de segregação.
E assim teremos um 2010 melhor.