A adaptação de Robert Crumb do livro inicial da bíblia está no primeiro lugar da lista do New York Times dos quadrinhos mais vendidos. “Gênesis” tem como personagens Adão, Eva, Caim, Abel, Noé, Abraão, Sara, Jacó e José e utiliza o texto bíblico original e integral.
A obra levou quatro anos para ser concluído, período no qual Crumb se dedicou a um estudo profundo nas pesquisas mais atuais a respeito do texto bíblico, à iconografia clássica e em um material fotográfico gigantesco da Terra Santa.
Apesar do autor não se afastar das polêmicas, como retratar cenas de nudez, sexo, incesto e violência –trechos que afinal estão presentes no texto original-não se trata de uma obra satírica, mas de um retrato respeitoso e sincero de um dos maiores quadrinistas vivos de um dos livros mais fundamentais da cultura ocidental.
Robert Crumb controla ímpeto na sua versão underground de Gênesis
Depois de quatro anos de documentação e dedicação em sua casa na Provença, na França, Robert Crumb acabou sua obra mais ambiciosa, “Gênesis”, uma adaptação do primeiro livro do Antigo Testamento que recebeu um contorno underground.
“Me controlei”, confessa Crumb na introdução do livro que traz uma etiqueta “só para adultos” e no qual o ilustrador “diz ter tentado não dar um tratamento excessivo de criatividade, às vezes confundindo condição do texto, tentando reproduzir todas e cada uma das palavras do texto original, extraído de diversas fontes”.
A Criação, Adão e Eva, Caim e Abel, Noé e o Dilúvio e a Torre de Babel são algumas das passagens reinterpretadas por Crumb com seus inconfundíveis traços em preto e branco, em mais de 200 páginas que unem uma expressão gráfica e um texto vigoroso.
Como descreve o ilustrador “com muitos significados aprofundados em nosso inconsciente coletivo e em nosso inconsciente histórico”.
Nascido na Filadélfia em 1943, mas residente na Provença francesa desde 1991, onde vive um exílio voluntário dedicado integralmente aos desenhos, Crumb é considerado o pai da história em quadrinhos underground e se transformou em um dos desenhistas mais influentes do século 20, por levar ao limite a linguagem das vinhetas com ironia e sem dificuldades.
Sem esquecer de temas como sexo, nu, violência e incesto, desta vez Crumb rendeu-se à própria força do texto, desenhando um Deus sem aditivos, que aparece poderoso e com uma longa barba branca.
“Se minha interpretação literal e visual do Gênesis ofende alguns leitores, em minha defesa só posso dizer que me aproximei dele como um trabalho meramente ilustrativo, sem intenção de ridicularizar nada nem fazer brincadeiras visuais”, explica Crumb, consciente que sua obra não estará isenta de polêmica.
Embora Crumb desenhe às mulheres do “Gênesis” por uma perspectiva mediterrânea, exagerando nas curvas e nos contornos, o desenhista adota seu estilo fiel, um olhar mais realista e menos caricatural para concentrar-se nos fatos com atmosferas traçadas de maneira minuciosa.
Crumb, que além de desenhista é um apaixonado por música, à qual dedicou parte de sua vida, era um fervoroso católico até alcançar os 16 anos.
Agora, no entanto, é um agnóstico declarado que examinou o verdadeiro conteúdo da Bíblia e da Torá por meio de dezenas de versões para desafiar interpretações fantasiosas nas quais pinçou o escabroso, segundo Emilio Bernárdez, coeditor de “Gênesis”.
Nesta obra, afirma Bernárdez, “se impõe o respeito, porque o texto não se pode inventar, nada do que Crumb pudesse inventar seria mais ridículo”.
“Crumb limitou-se a modelar e a transferir em imagens o que aparece na Torá dos judeus e na Bíblia dos católicos”.
“Gênesis” foi colocado à venda na semana passada em uma dezena de países.