Depois de oito anos e meio na prisão devido a uma acusação infundada de blasfêmia, o cristão paquistanês Ranjha Masih foi absolvido, no dia 10 de novembro, pela Suprema Corte de Lahore.
Ao final de uma audiência de duas horas sobre o caso, o magistrado Asif Saeed Khan Khausa determinou que a falta de evidências concretas contra Ranjha Masih requeria sua completa absolvição.
O advogado, Justin Gill, que liderou a equipe de defesa de Ranjha, disse esperar que a ordem para a libertação do antigo funcionário de um hospital fosse decretada no dia seguinte. “Então, em dois ou três dias, ele deverá estar fora da prisão”, disse Gill. “Eu acho que ele ainda não sabe disso, mas nós falamos para sua esposa”.
De acordo com um porta-voz do Centro de Ajuda Assistencial e Assentamento (CLAAS), que tratou do processo de apelação de Ranjha, ele será transferido para um local seguro e desconhecido depois de sua liberação.
Prisão perpétua
Preso em maio de 1998, durante o funeral do bispo John Joseph, Ranjha Masih foi condenado e sentenciado a prisão perpétua por uma corte distrital em abril de 2003.
Masih, 50 anos, foi acusado de jogar pedras e derrubar uma tabuleta que continha um verso do Alcorão durante o funeral. Ele era amigo próximo do bispo, que cometeu suicídio para protestar contra o fato de os cristãos serem alvo das leis de blasfêmia no Paquistão.
“A conclusão do juiz Khausa foi de que não havia evidências suficientes para manter a condenação”, disse Justin Gill ao Compass. “E havia muitas discrepâncias entre as testemunhas”.
Em sua apelação diante da corte, o advogado disse que ele enfatizou as contradições entre o que diziam as testemunhas de acusação e o testemunho de um oficial de polícia que investigou as evidências poucas horas depois que seu cliente foi preso.
“Todas as testemunhas de acusação declararam que a tabuleta na qual o verso do alcorão estava escrito foi quebrada em dois pedaços e caiu”, disse Justin. “Mas o inspetor que conduziu a investigação disse em sua declaração que as tabuletas do local estavam todas intactas depois do incidente. Nenhuma havia sofrido danos”.
Na verdade, disse o advogado à corte, foi somente 20 dias depois que os acusadores de Ranjha produziram os danos na tabuleta, declarando que ele jogou pedras e um sapato nela.
Este lapso de tempo documentado foi um fato importante para o veredicto de absolvição dado pelo juiz, declarou um observador da corte ao Compass.
Irregularidades
A mesma discrepância foi estabelecida claramente diante da corte distrital pelo advogado de defesa de Ranjha Masih, Khalil Tahir Sindhu, disse um porta-voz do CLAAS. “Ranjha devia ter sido absolvido naquela corte”, disse ele.
Porém com a corte de Faisalabad repleta de ativistas muçulmanos e jornalistas, o juiz distrital declarou Ranjha culpado.
Apesar do alegado crime de Ranjha Masih de desrespeito às palavras do Alcorão estar na seção 295-B da lei de blasfêmia do Paquistão, ele foi inexplicavelmente acusado pela seção 295-C, por insulto ao profeta muçulmano Maomé.
Ainda mais estranho, a corte de apelação notou agora, que sua condenação sob a seção 295-C requeria pena de morte. Mas ao contrário, a corte distrital o sentenciou a prisão perpétua.
Apelações contra a condenação de Ranjha foram apresentadas desde maio de 2003, porém só em junho de 2004 o juiz Khausa concordou em atender o caso.
O advogado Justin Gill identificou o muçulmano que apresentou as acusações contra seu cliente, Muhammad Jahanzeb, como “uma pessoa influente, filho do antigo prefeito de Faisalabad”. Apesar de, sob a lei paquistanesa, um juiz poder abrir uma ação contra alguém que apresente falsas acusações, Justin admitiu que, “normalmente, isso não acontece no Paquistão”.
Casado com seis filhos e vários netos, Ranjha tem agora 58 anos. Enquanto estava na cadeia, seu cabelo e barba ficaram brancos e ele sofreu com artrite, hemorróidas e inchaço nos joelhos.
Mantido vendado e acorrentado durante as primeiras semanas de detenção, Masih disse a seus advogados que foi espancado e torturado repetidas vezes por autoridades policiais antes de ser transferido para a Prisão Central de Faisalabad.
No último mês de maio, a Sociedade Internacional de Direitos Humanos da Alemanha condecorou Masih com o Prêmio da Fundação Stephen por “perseverança em manter sua fé cristã” sob perseguição.