Demônios do Templo (2)

Leia antes: Demônios do Templo (1)

— Boa tarde. O senhor é o marido da Sra Cláudia dos Santos Tibúrcio?

— Sim, sou eu. O que está acontecendo?

— Sua esposa deu à luz há pouco mais de uma hora. Minutos após o nascimento o recém-nascido começou a apresentar uma dificuldade que o impedia de respirar por si só. Também observamos que seu coração estava muito acelerado e seu tônus muscular ficou flácido. Foi trazido para a UTI Neonatal pelo pediatra de plantão. Nós o colocamos em uma máquina para respirar, iniciamos antibióticos pela veia umbilical. Há 15 minutos atrás ele apresentou um quadro de convulsão generalizada. A hipótese diagnóstica pra ele é…

— Onde está Cláudia?

— Choque séptico. Perdão?

— Onde está minha esposa? Ela está bem? Sofreu algum dano?

— Não sei lhe dizer. Sou plantonista da UTI Neonatal. Creio que o senhor poderá encontrar-se com a esposa logo. Concluindo meu relatório…

— Doutor, obrigado pela atenção. Confesso que não entendi quase nada do que o senhor falou, mas entendi que o bebê teve um negócio grave e está respirando com um aparelho. É isso? E vocês estão cuidando dele para nós?

— Sim, estamos cuidando dele. Vá ter notícias da sua esposa e mais tarde conversamos novamente.

— Obrigado.

Adilson saiu da porta da UTI e retornou ao posto de enfermagem. Uma auxiliar gorda e desajeitada preparava algumas medicações para aplicar nas pacientes. Afoito, perguntou em que quarto estava a esposa.

— Cláudia da Silva?

— Não, Cláudia dos Santos. Por favor, em qual enfermaria ela está?

O 520B ficava no fim do corredor. Uma sala ampla, construída para ser almoxarifado do andar, foi transformada em enfermaria. Cláudia estava no último leito, bem perto da janela de onde se podia avistar a linha do trem. Deitada, ainda com algumas contrações de acomodação no pós-parto, meio desconfortável com os pontos que começavam a doer, avistou Adilson na porta e o chamou para si.

Adilson beijou-lhe a testa e sentou-se na cadeira ao lado para conversar. Com o coração miúdo, relatou para Cláudia que o bebê estava na UTI em um estado não-muito-bom mas que estava sendo cuidado. Seu tom de voz tentava esconder sua apreensão para transmitir segurança para a esposa. Seguraram as mãos e oraram.

Dois dias depois, Cláudia, já sem dores recebeu alta do hospital. Recebeu livre acesso ao quinto andar para visitar o bebê. O hospital Ana Neri foi o pioneiro na iniciativa “Hospital amigo da criança” cujos princípios preconizam a humanização, inclusive do tratamento intensivo, permitindo às mães visitarem seus bebês, desde que bem orientadas quanto às medidas sanitárias.

O recém-nascido piorou muito nas horas seguintes ao parto. Sofreu uma parada cardíaca no mesmo dia do nascimento por volta das 23 horas. Foi reanimado com massagem cardíaca. No dia seguinte foi introduzida uma droga para aumentar a força dos batimentos cardíacos que, devido à infecção, estavam enfraquecidos. Dois dias depois, durante uma crise convulsiva, o tubo de respiração saiu da traquéia, o que ocasionou novo procedimento de intubação.

Ao final da primeira semana de vida o recém-nascido permanecia no respirador. A infecção estava sob controle e a droga cardiológica começou a ter sua dose desmamada. A fração inspirada de oxigênio que inicialmente era 100% começou a ser lentamente diminuída até aproximar-se da fração do ar ambiente (21%). Os pulmões davam sinais que estavam melhorando. No final de semana seguinte os parâmetros do aparelho respirador estavam mínimos indicando que em breve a criança seria extubada.

Exatos quinze dias de internação desde o nascimento, o recém-nato recebeu alta para a Unidade Intermediária — uma espécie de unidade semi-intensiva — para ganhar um pouco de peso e proceder investigações adicionais. A única medicação em uso era o anti-convulsivante, introduzido por ocasião da primeira crise convulsiva, mas que seria modificado para outro por via oral.

O médico da Unidade Intensiva solicitou alguns exames. Uma tomografia de crânio, um exame de fundo de olho e um ecocardiograma para avaliar possíveis seqüelas da sepsis.

Durante todo esse tempo Cláudia e Adilson visitavam o bebê diariamente. Cláudia ai pelo menos três vezes ao dia na UTI e outras duas no banco de leite para retirar o leite materno que era dado ao bebê na UTI. Adilson vinha de manhã e à noite nos horários de visita.

Três dias depois de ir para a UI o casal foi informado que o bebê receberia alta. Antes, porém, o médico da UI queria ter uma conversa com o casal.

Continuação: Demônios do Templo (3)