Pelo prêmio da soberana vocação

Fico impressionada com a vida do apóstolo Paulo. Com a maneira como foi chamado por Deus (Atos 9), como se comportou diante desse chamado e, principalmente, como sofreu por causa do chamado.

Muitas pessoas, ao se lembrarem da vida de Paulo, logo pensam nos inúmeros açoites, naufrágios e prisões que ele sofreu. Porém, quando leio o seu próprio relato, vejo alguém muito satisfeito com o Deus a quem serve, muito realizado no ministério que recebeu e muito feliz pelo privilégio de exercê-lo. Para Paulo, o sofrimento foi usado para testemunhar o poder de Deus, aperfeiçoado na sua fraqueza.

Paulo, apesar de ser um homem culto e com um passado de empenho na sua religião, depois que conheceu a Cristo, ficou com um currículo bem manchado, humanamente falando; afinal, ele passou vários anos sendo perseguido por pessoas que queriam prendê-lo, algumas vezes foi mesmo preso e em muitas outras, viveu fugindo de cidade em cidade para não ser pego. Poderíamos dizer que para a carreira de Paulo, ter entregue sua vida a Cristo foi um retrocesso. Mas será que Paulo estava arrependido? Será que ele queria voltar à vida de perseguidor para deixar de ser perseguido? Obviamente não. Paulo tinha orgulho do seu chamado e agora importava cumpri-lo da maneira mais digna e excelente possível.

Entre os capítulos 22 e 28 do livro de Atos, Paulo repetiu a história do seu chamado sete vezes. Ele testemunhou diante de gente importante da época (presidente Félix – At 24; rei Agripa – At 26 e líderes judeus – At 28: 17 a 24), mas também diante do povão (At 22). Seu testemunho causou curiosidade de muitos (Félix e sua esposa, Drusila – At 24: 24 a 26; Agripa – At. 25:22), fez outros tantos pensarem (At 25: 26 e 27) e outros, quererem matá-lo (At 22: 22 e 23: 12). Ele gastou muito tempo explicando para pessoas, a quem ele não devia explicação, porque deixou de lado sua vida de sucesso como perseguidor para ser perseguido. Ele deixou sua vida ser literalmente consumida no Reino de Deus. Hoje, para os cristãos Paulo é um exemplo, porém naquela época, ele chegou a ser considerado louco (At 26: 24).

Nós não sabemos a real história de vida das pessoas que nos cercam, talvez não saibamos nem a dos nossos familiares. Alguns eventos da vida nós fazemos questão de esconder; outros só contamos para pessoas muito próximas (mesmo assim com medo de sermos traídos) e; outros estão patentes em nós, escreveram nosso temperamento e concederam a pessoas comuns a visão que elas têm de nós. O passado de Paulo o elevou na sociedade judia. Ele era muito bom no que fazia. Era um religioso de mão cheia (At 22:3), mas ele preferiu mostrar que Cristo só usou o seu passado para dar maior brilho ao contraste do seu presente. O admirável é que mesmo Paulo sendo tão radicalmente transformado por Cristo, hoje nos lembramos com muito mais facilidade da sua vida como cristão. Apesar do seu ótimo currículo como religioso no passado, foi o seu presente como servo que se tornou eterno. A religião por si só, aproxima você dos ritos e afasta de Deus, relacionamentos o aproximam de Deus e fazem você carregar pessoas na mesma direção!

Como humanos, é normal que façamos planos. Penso que seja até saudável, pois nos motiva, nos guia rumo a um alvo, mas minha preocupação é com o que almejamos para nossa vida. O que significa sucesso para nós. No que temos investido nosso tempo, e mais, nossa paixão. Em muitas agendas não há espaço para o Reino de Deus ou ele está concentrado em atividades institucionalizadas, isto é, dependente das programações da igreja.

O que me motivou a escrever esse artigo é a eminência de defender uma tese de mestrado. Em meio a projetos acadêmicos, nunca surgiram tantas oportunidades de servir a Deus como agora em minha vida. Parece que Deus quer me mostrar onde tenho colocado meu coração. Geralmente planejamos coisas e investimos em situações que nos darão muito retorno, mas nenhum retorno a Cristo. Assim, servimos a nós mesmos e não a Ele, buscando estabelecer um reino próprio e não o dEle.

Não quero com isso dizer que só mostramos serviço cristão na igreja. Não, muito pelo contrário, creio que é fora de lá que somos reais testemunhas. Também não acho que todos nós temos que abandonar o trabalho chamado secular para cumprirmos nossa vocação cristã. Parafraseando At 10: 15, diria: Não faça secular ao que Deus purificou. O lugar que você está e a posição que ocupa, foram cuidadosamente planejadas por Deus. Glorifique-O lá! Agora, a sua conduta e os seus sonhos, Deus deixou por sua conta, mesmo sabendo do risco que corria. Risco de ser esquecido e talvez até envergonhado. Porém, creio que Deus não dá ponto sem nó, por isso investiu em você. Sabia que você podia honrá-Lo se de todo coração desejasse. Supriu você de dons e de fé para ajudá-lo na sua missão. Mas, para mostrar maior amor ainda, deixou você com as ferramentas na mão, ficou do lado olhando, sugerindo modificações, dando idéias, mas ainda é você quem constrói.

Depois que a história da sua vida tiver construído uma herança, será que você verá um sorriso de aprovação no rosto de Deus diante do legado deixado?