Amigos, existem certas expressões do evangeliquês que são bonitas mas incomodam. Não pelo valor energético contido de espiritualidade, mas pelo fato de que muitas vezes não passam de chavões. A gente sabe que na prática não vão significar nada. Por exemplo, alguém encontra com você no meio da rua, vocês começam a conversar e de repente a pessoa diz: “Por favor, ore por mim”. E você responde à meia-voz, num tom bem taciturno: “Pode deixar, irmão. Vou orar por você”. Aí você vira a esquina e nem se lembra mais da pessoa nem do seu problema.
Cada vez que alguém me diz que está orando por mim eu fico pensando que se todo mundo estiver dizendo a verdade, estou coberto por toda a minha vida pela bênção da intercessão. Porém, se for só uma expressão bonita, um jargão que pega bem, estou frito. Sei que há muitos que oram por mim de verdade, pelos quais sou muito grato a Deus. Muitos dos meus leitores fazem isso regularmente. Está certo que alguns oram para que eu pare de escrever, outros para que eu pare de falar, mas a maioria ora pelo meu bem-estar, minha vida, família e ministério. Obrigado a todos vocês.
Resolvi que eu nunca mais responderia que vou orar por alguém se eu realmente não estiver disposto e comprometido a fazê-lo. Disposto até que a gente está, porque o espírito na verdade está pronto. Mas a carne é fraca. E esquece, deixa de lado. Então, passei a usar o esquema do caderninho. É simples. Funciona como uma agenda de compromissos. Quando quero mesmo orar por alguém ou por alguma coisa, anoto pelo menos um dia da semana para fazer isso. Não vou dizer que vou orar todo dia, porque talvez não consiga cumprir. Mas pelo menos uma vez por semana estarei lá, falando com o meu Pai a respeito daquele assunto. Claro que tem coisas que a gente precisa orar todo dia. Também resolvi passar a anotar pelo menos algum daqueles pedidos de oração que são anunciados na igreja (já que a maioria não se sabe quem é, nem do que se trata e depois de anunciado nunca mais se ouve falar no(s) sujeito(s) por quem se orou).
Então, resolvi fazer uma lista de amigos. Quantos são e como precisam de apoio! Fiquei impressionado com o número de pessoas importantes que fazem parte da minha vida. Não foi possível orar por todos eles num dia só. Dividi-os ao longo da semana. Uma parte deles está no campo missionário, outros estão em lutas, outros em momentos de cruciais decisões na vida. Tem aqueles que precisam de dinheiro, outros de marido ou esposa, outros precisam de consolo. Alguns estão estudando, terminando suas teses ou procurando emprego. Outros estão desanimados, outros cansados, outros indecisos. Outros estão felizes, com dinheiro no bolso, saúde pra dar e vender. São normais esses meus amigos. São gente que enfrenta problemas. Felizmente, não achei entre eles super-homens nem meninas superpoderosas, do tipo que já sabem tudo, não precisam de nada, não compartilham seus problemas com ninguém. Esses nem serviriam para ser meus amigos. Porque ficariam decepcionados comigo logo e me abandonariam.
Quando estava me acostumando com este esquema, um pensamento cortou minha mente e meu coração como um raio num dia de tempestade: como é que fica aquele ensino de Jesus sobre orar pelos inimigos e abençoar os que nos perseguem? Como é aquele negócio de que se fizer o bem só para quem nos quer bem, não estamos sendo nada diferentes dos gentios? Quer dizer, desejar o bem para quem gosta de nós, quem torce por nós, quem nos ajuda quando precisamos de alguma coisa, não é virtude alguma. É no máximo uma questão de gratidão. Uma obrigação. Mas querer bem quem nos quer mal, quem fala mal de nós pelas costas, quem não tem coragem de falar o que quer e prefere mandar recado, quem coloca sua vida em risco por causa de maledicência, isso é outra conversa.
Sabendo que não é nada menos do que isso o que Deus espera de um cristão, tentei começar a fazer. Orava pelos amigos, um por um, pedido por pedido. E aí concluía, meio sem graça: “E, Senhor, lembra também daquelas pessoas que não gostam muito de mim. Amém”. Não ia muito além disso, com algumas variantes textuais que dependiam da pressa ou do humor. Também, como é que você vai orar por quem, assumidamente, não lhe tem qualquer simpatia? Não é natural.
Mas percebi que não era esse o espírito do ensino de Jesus. Não era bem isso que ele esperava de um cristão. Não era simplesmente uma questão de tirar um item da agenda, para dar como resolvida uma ação de religiosidade. Resolvi dar um passo além. Abri outra coluna na minha agenda, para as quartas-feiras. “O cantinho dos desafetos”. Listei nome por nome as pessoas de quem eu me lembrava que de alguma maneira ou por algum motivo não são exatamente pessoas a quem possa (ou deva) chamar de “amigos”. Alguns são, declaradamente, inimigos. Deus o sabe. Passei a orar por eles, por nome. Citando cada um, devagar. Às vezes mencionando o que fizeram ou o que andam dizendo.
Esta prática tem sido extremamente didática. Primeiro, porque felizmente para o meu colesterol e para meu sono tranqüilo (graças a Deus não estou entre os crentes neuróticos que só dormem à base de remédios), a lista de amigos é 4 vezes maior. Deus tem me dado a graça de ter muito mais amigos do que desafetos. Segundo, porque percebi que não se pode agradar todo mundo, o tempo todo. Terceiro, porque percebi que entre os meus amigos mais especiais há pessoas de quem discordo em muitas coisas. Não é preciso concordar em tudo para se ter um amigo. Tenho amigos aspersionistas, pentecostais e até corintianos. Nem eu nem eles somos perfeitos. Quarto, porque descobri que, em função das mesmas coisas que escrevo nesta coluna ou prego em variadas tribunas, e pelas quais alguns me odeiam, outros tem encontrado direção e compartilham comigo suas vidas. Oro por muitos dos meus leitores que me escrevem. Quinto, porque ao invés de me estressar com lembranças amargas, envenenando minha vida, simplesmente passei a entregar o problema nas mãos dAquele que julga retamente. Faz muito bem à saúde física, mental e espiritual. Experimente.
Então, àqueles que costumam me espiar por aqui para saber o que eu ando fazendo e dizendo, vai um pedido e uma informação. Espalhem ambos por aí, vocês são bons nisso. O pedido: vocês podiam mudar de assunto e falar de outra pessoa, para variar. A informação: toda quarta-feira, coloco seus nomes diante do trono da graça.
Pensando bem:
“Que eu não cometa o pecado de deixar de orar por vocês!” Profeta Samuel, dirigindo-se ao povo que o havia rejeitado (I Sm 12:23 – tradução livre)