Uma Filosofia de Vida pode ser definida como a conduta que rege a forma de viver de uma pessoa. A construção de uma Filosofia de Vida varia de acordo com o contexto de cada um, e pode ser influenciada ou alterada de acordo com fatores sociais, econômicos, políticos ou religiosos. A expressão também define a forma como cada indivíduo constrói seu sistema de valores e, desta forma, é um forte indicativo de como irá conduzir sua vida.
Três livros bíblicos têm sua autoria atribuída a Salomão: (1) Cantares [ou Cântico dos Cânticos], (2) Eclesiastes e (3) Provérbios. Arranjados nesta sequência – e considerando suas temáticas –, poderíamos resumir os três livros da seguinte maneira:
- Em Cantares Salomão é um jovem impetuoso que experimenta a vida e o amor.
Sua Filosofia de Vida ainda está em formação. - Em Eclesiastes temos Salomão adulto. Já conheceu a vida, o amor, a riqueza e o poder.
Precisa agora definir sua Filosofia de Vida. - Em Provérbios encontramos Salomão mais maduro.
Salomão agora é capaz de transmitir sua Filosofia de Vida pela experiência – o método vicário. Desta forma, podemos aprender sem ter que repetir seus passos.
Eclesiastes é o único livro de filosofia – filosofia pura – incluído no cânon Bíblico. A palavra que mais se repete no livro é vaidade. É preciso refletir profundamente sobre a vida para saber o que é vaidade e distinguir daquilo que é sem-sentido o que deve fazer parte da nossa Filosofia de Vida.
A diferença entre a filosofia e a religião está na diferença entre falar e ouvir – entre o homem falando sobre Deus e Deus falando sobre o homem. A filosofia é a busca do homem por Deus; a Bíblia é a história da busca de Deus pelo homem.
Em Eclesiastes Deus permanece absolutamente calado. O autor não apela a nenhuma revelação divina para endossar suas palavras; apenas à razão natural do homem e àquilo que pode ser observado pelos cinco sentidos.
Em Jó, Deus também permanece na maior parte da história em silêncio – exceto no começo e no final. E estas duas manifestações divinas fazem toda a diferença, tanto em Jó quanto em Eclesiastes: Porque Deus fala, Jó percebe ter tudo, mesmo quando não tem nada. Por permanecer calado, o Koheleth não tem nada, mesmo tendo alcançado tudo. Portanto, ainda que Eclesiastes seja um monólogo, trata-se de um monólogo inspirado por Deus. Ele nos mostra que a vida, ainda que plena de realizações, é completamente sem sentido. Eclesiastes nos faz perguntar: Há alguma coisa além do vento?
Um breve resumo do livro
O argumento do Koheleth pode ser sintetizado nos três primeiros versículos do sermão, ampliado e desenvolvido nos seus doze capítulos e no resumo final. Como num sermão bem elaborado, os três primeiros versículos apresentam o sermão todo em miniatura.
O primeiro versículo resume o (1) título e o autor; o segundo versículo resume o (2) ponto de vista que o pregador irá explorar; o terceiro versículo formula a (3) argumentação.
1 Palavras do pregador[1], filho de Davi, rei em Jerusalém.
2 Vaidade[2] de vaidades, diz o pregador; vaidade de vaidades, tudo é vaidade.
3 Que proveito tem o homem, de todo o seu trabalho, com que se afadiga debaixo do sol?
(1) O Título do livro e seu autor: O título original de Eclesiastes são suas primeiras palavras. Desta forma o título do livro não é “Eclesiastes”, nem “O Pregador”, mas “As palavras do Pregador”.
Eclesiastes não é uma biografia, mas um sermão. Desta forma, o foco do leitor do livro não deve ser uma investigação crítica e especulativa sobre seu autor, mas o fruto de uma profunda reflexão dos eventos vividos e relatados.
(2) O Ponto de vista: Tentativas de definir o ponto de vista do autor: (1) sem Deus – não somente sem Deus, pois o autor fala frequentemente em Deus; (2) sem fé em Deus – também não está certo porque o Koheleth nunca duvida de Deus; (3) sem uma fé em Deus que seja maior que a vida – que não passa de vaidade – e, portanto, valha a pena viver ou morrer – a vida não passa de uma bolha de sabão, a sombra de uma sobra, um sonho dentro de outro sonho. A terceira opção parece ser a mais completa para definir o ponto de vista do autor.
(3) O argumento essencial do livro é uma dedução dura:
- Todo “trabalho” acontece “debaixo do sol”.
- Tudo o que acontece “debaixo do sol” é “vaidade”.
- Portanto, todo “trabalho” é “vaidade”.
Trabalho é todo o produto da ação humana – todos os nossos esforços, estilo de vida e valores. Tudo que possa se candidatar a supremo sentido da vida. Ao longo do texto o autor mostrará cinco Filosofias de Vida candidatas a supremo sentido da vida. Cinco esforços, cinco trabalhos, cinco estilos de vida populares e universais.
As cinco Filosofias de Vida (trabalhos) explorados pelo Koheleth em Eclesiastes também são reconhecidos em outras culturas, por exemplo no tradicional Quatro Desejos do homem do hinduísmo, nos Diálogos de Platão, na Ética de Aristóteles, nas Confissões de Agostinho, no Tratado da Beatitude de Aquino, em Civilização e seus Descontentes de Freud, além de Kierkegaard, Sartre, Dostoievsky, Hermann Hesse, Tomás Mann e Albert Camus.
1. Sabedoria | conhecimento, filosofia – satisfaça a mente |
2. Prazer | hedonismo – satisfaça o corpo |
3. Dinheiro e Poder | materialismo – satisfaça o medo |
4. Altruísmo, filantropia e honra | ética – satisfaça a consciência |
5. Religião e piedade | religião – satisfaça o espírito |
Eclesiastes é um livro pessimista?
Eclesiastes é um livro para pensar, concluir e responder. O apóstolo Paulo passou por isto e relata sua experiência em Filipenses 3:8 “Mais do que isso, considero tudo como perda, comparado com a suprema grandeza do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor, por quem perdi todas as coisas. Eu as considero como esterco para poder ganhar Cristo”.
Para um cristão, essa é a mensagem do Koheleth: O ouro mais puro desta vida é apenas esterco [ou vento se preferir] sem Cristo. Com Cristo, entretanto, qualquer metal [ou até mesmo o vento da vida] se transforma na maior das riquezas!
Notas:
[1] Pregador = Koheleth (o pregador, o coletor de frases / sentenças, aquele fala na assembléia, o pesquisador, o debatedor, o argumentador)
[2] vaidade, vazio, bolha de sabão – sensação de futilidade. A NVI traduz como inutilidade