Minha retrospectiva (1)

Amigos, foi um ano difícil. Não gosto muito dessa história de “melhor ano da minha vida!” ou “pior ano da minha vida!”, por causa da instabilidade da vida humana. Nada há tão ruim que não possa ficar um bocado pior, mas nada há de tão péssimo que não possa melhorar. Então essas análises são algo superficial.

Mark Twain dizia que um gato que sobe na chapa quente nunca mais subirá numa chapa, esteja ela quente ou fria. Com isso, ele adota um paradigma que vai levar consigo para o resto da vida. A conseqüência é que ele pode perder um aconchegante lugar de descanso numa tarde de inverno. Portanto, não quero ser um gato de chapa. Quero levar deste ano as lições que me permitam ser mais cauteloso, depender mais de Deus, esperar as soluções que vêm dEle, aprimorar habilidades que foram recebidas para uso em Seu Reino, aprender a viver mais intensamente, fazer bom uso do tempo e das oportunidades, edificar, construir, reformar, influenciar, formar opinião, ajudar a restaurar, a pôr de pé o que precisa ser erguido e a derribar e pisotear o que precisa ir ao chão.

2006 foi para mim um ano de lições inesquecíveis. Foi um ano de descobrir nuances do doce e suave sabor da amizade. Tive a graça de fazer alguns novos amigos, redescobrir antigos dos quais Deus me aproximou e aumentar, assim, meu caríssimo círculo de gente fiel, comprometida com Deus e com aqueles que amam a Deus, gente leal, companheira de todas as horas. Não posso citar todos aqui. Até porque, dizer que alguém é meu amigo nem sempre é bom negócio. Para o amigo, bem entendido. Alguns, por fazê-lo, têm sido chamados às falas, precisam dar explicações, passam pela inquisição. Então vou poupá-los desse incômodo. Como este já está escaldado e com a devida independência que a vida lhe proporcionou, vou personificar no Cara do Site o símbolo desses Amigos Classe A, top de linha, com todos os acessórios. Meu abraço forte e sincero, Paul. Sei que você já agüentou poucas e boas por este seu amigo menor, de tamanho e importância, mas continua aí, do outro lado da linha.

A todos os outros “vocês”, que nessa categoria se encaixam, sintam-se abraçados e agradecidos. Saiba que Deus usou sua vida em momentos ásperos da minha para me manter em pé. Certamente, você não tem noção do impacto que teve na minha vida aquela conversa, aquelas férias proporcionadas, aquele almoço, aquele telefonema, aquele abraço (quanta gente me procurou este ano apenas para me dar um abraço. Como valeu!!), aquele e-mail, aquela carona, aquela pizza. E aquela conversa no Shopping Serra Azul? Você saiu da sua casa, gastou seu tempo, sua gasolina, sua paciência, só para me ouvir. E aquela força na despedida da rodoviária de… bom, você sabe de onde, dando a maior força para seguir em frente? E aquele papo na porta do embarque do aeroporto, que quase me faz perder o vôo? E aquela acolhida no momento crucial do ministério, dizendo “pode vir, confiamos na sua palavra, as portas estão abertas”? E aqueles longos papos nas aulas de inglês (oops, essa dica é muito quente…)? Deus, na sua graça, multiplicou essas pessoas. Mesmo quando quis, não consegui ficar só. Surpreendeu-me o tanto de gente que me acompanhou, que me ligou e ainda liga com interesse sincero. Teve gente gastando muito, porque passou horas comigo em interurbanos. Glória a Deus pelo Skype!! Por ele recebi apoio, cuidado e amizade de gente da Terra Brasilis, mas também (vejam que chique!!) Europa, da América do Norte e da África. Nunca poderei esquecer nossas conversas, seus conselhos, sua preocupação genuína. Choramos juntos, via-satélite, diante do Senhor. Um dia (e ele já está nascendo!!) comemoraremos juntos a vitória que o Senhor já reservou para nós. Sei que vocês sofreram conosco, oraram por nós (por favor, continuem) e nos querem bem. Vocês andaram a 2ª milha, a 3ª e a 4ª. E sei que se for preciso andarão até a 10ª.

Fui recebido em uma comunidade cristã que não tinha qualquer obrigação de fazê-lo, mas que o fez por amor. Tornou-se minha igreja por 6 meses, mesmo sabendo que tudo levava a crer que não ficaria nela, como de fato não fiquei. Não por falta de vontade ou espaço, mas pela porta nova que o Senhor colocou diante de nós. Fiz amigos ali (alguns já devidamente descritos acima). Convivi e continuarei a conviver com a amada PIB-PIRA por opção e por aceitação. Confirmei com vocês na prática o que em teoria já ensino há muito tempo: é mil vezes preferível andar com quem tem convicções diferentes, mas que lhe respeitem, do que com aqueles que supostamente têm as mesmas convicções e não o façam. Há coisas que são mais importantes do que dogmas ou sistemas de interpretação da letra da lei.

Agora, esta lição é uma moeda rara e, como tal, tem dois lados. Nesta área de relacionamentos, aprendi a duras penas que até mais importante do que saber quem são seus amigos de verdade e cultivá-los, é mister identificar os falsos e afastar-se deles antes que isso lhe custe a própria vida. O custo à vista é altíssimo, mas a médio e longo prazo os resultados são extraordinários. Chegar a esta conclusão nem sempre é fácil. É complicado admitir que você errou. Que andou com quem não devia. Que pôs para dentro de casa quem devia ter sido pego na armadilha para lobos. Sim, porque em última análise, a decisão de escolher os amigos é nossa. Você não pode escolher se vai ter um pai decente ou um primo de caráter. Mas é seu dever escolher bem com quem você vai andar, com quem você vai compartilhar sua vida, quem você vai deixar andar, carregar e influenciar seus filhos até que tenham condições de decidir sozinhos, a quem você entregará confidências, com quem você vai fazer negócios e assim por diante. Por isso, descobrir um falso amigo é concluir que você errou. Calculou mal. Tomou um drible-da-vaca. Não soube discernir entre um elogio e uma bajulação. Não percebeu que o pacote de presente era na verdade uma propina. (É que os corruptos, seja de dinheiro seja de moral, estão tão acostumados a comprar as pessoas que você não percebe a diferença se não prestar bem atenção.)

Pois é. Pela misericórdia de Deus e algumas noites de soluços e lágrimas, alguns “amigos-da-onça” que rosnavam ao derredor sem que eu percebesse (ainda que, em alguns casos, estivesse devidamente alertado há bastante tempo), foram devidamente desmascarados. Não por minha perspicácia ou pelas minhas fontes de informação, mas pela ação direta de Deus. Entendo hoje melhor o sentido da frase “fui salvo da boca do leão”, que Paulo usou referindo-se provavelmente a César.

Aprendi também que sua única responsabilidade em relação a seu ministério é cumpri-lo. Não adianta tentar defender-se de acusações que possam maculá-lo, não é preciso temer portas fechadas, não é preciso criar expectativas. É só fazer a sua parte. “O que se requer do dispenseiro é que seja achado fiel”. O resto, nem que o mundo inteiro se ponha contra, não consegue impedir. Que dirá uma meia dúzia de caipiras. Com todo respeito aos caipiras, obviamente. Afinal nem todo caipira é bronco. Vá fazendo o que lhe vier à mão, segundo as suas forças. Se faltarem forças, de duas, uma: ou Deus vai renová-las ou você está no serviço errado. Nesse caso, pare tudo, ore e procure outra coisa para fazer.

Aprendi que “resultado” não é tanto o que você consegue ver nas pessoas como fruto do seu trabalho entre elas, mas é muito mais o que Deus consegue fazer em você como fruto do Seu Espírito em você mesmo. E isso nem sempre é visível. Lembra da propaganda “tem coisas que só a Philco faz por você”? Tem coisas que só Deus faz em você. Algumas dessas coisas precisam ser evidenciadas. Outras, não. Falo daquelas que pertencem à categoria da experiência única, pessoal, intransferível. Ninguém tasca. Podem tirar seu nome da lista ou nem colocá-lo, podem cortar seu nome da escala ou da lista de preletores, podem sujar seu nome, podem atacar seu caráter, podem dizer uma coisa na sua frente e outra quando você vira as costas, podem escrever carta ou o que for. Nada, mas nada mesmo, conseguirá roubar aquilo que Deus chegou para você e disse “toma, isso é para você”. Quando chegar esse dia, desvencilhe-se de qualquer amargura. Deponha sua reclamação de direitos, de foro íntimo, seu ego ferido ou mesmo seu coração despedaçado. Com todo respeito: nessa hora, simplesmente curta!

Apesar de eu também ser um Soares, aqui não é a seção de “Abra Seu Coração Para o Missionário”. É só um balanço, com o qual muita gente se identifica, porque já viveu e aprendeu antes de mim. Sorte a sua. Eu só aprendi agora.

Antes tarde do que mais tarde. Porque nunca é demais.

Ainda nesta semana, espero, continuo.