Amigos, visitar o xópin é um exercício interessante. Consagro esta prática ao lado de passeios em aeroportos. Ambos nos permitem observar pessoas, ver coisas lindas e caras sem ter que, no entanto, gastar um centavo por elas. Isto se você for a pé, porque senão vai ter o custo de estacionamento.
Descobri que o xópin é de certa maneira um lugar democrático. Ali ninguém sabe nada sobre a vida de ninguém e por isso mesmo todos se tornam iguais. Posso parar demoradamente em frente a vitrines caras, estilo Brooksfields, Polo Play, Barreds e fazer comentários com minha esposa (“olha que preço ótimo daquele terno, está só R$ 999,00!”), mesmo que eu não tenha a mínima intenção ou condição de pagar nem 30% desse valor. Nada mais barato para lustrar o ego do que observar atentamente as caríssimas jóias da H.Stern, uma vez que ninguém sabe se sou cliente potencial ou não. Para todos os efeitos, eu o sou.
Interessante notar que mais gente está ali fazendo a mesma coisa. Seu comportamento é típico. Quem sabe, 2% das pessoas que transitam pelos corredores iluminados, cheios de ofertas e coisas chiques, entram e compram alguma besteirinha. Esses saem das lojas fazendo questão de balançar bem alto as sacolinhas de griffe, batem em você sem querer para que você note o que compraram e te olham de cima para baixo, como que a dizer “eu posso, eu gasto, eu compro!” Sui generis também é a atitude dos que só vão ao Carrefour. Nem pensar em caminhar pelo xópin com sacolinha de supermercado. Não é “in”.
Ninguém me conhece. Posso ser tanto o porteiro do meu prédio como o dono da construtora. Crio coragem e sento perto do quiosque da Nutty Bavarian. Analiso bem a situação. Sim, tem o cone “kids” que, por minúsculo, é um pouco menos caro. Posso pedir um deles. Tenho aliança no dedo, os que me virem com um daqueles, certamente vão pensar que é para algum filho. Na fila, o cliente da frente está fazendo a mesma coisa. Percebo os olhares invejosos dos que passam. Não é qualquer um que pode pagar uma fortuna dessas por meia dúzia de nozes lambuzadas. É uma questão de status. É uma questão de estar no xópin.
Imagino se muita gente que vai à igreja todo final de semana não pensa que, na realidade, está mesmo indo ao xópin. Deixa as crianças no parque de diversões, a classe de Escola Dominical, enquanto aproveita para dar uma olhada, exibir o guarda-roupas novo, participar do programa, ouvir um pouco de música, pegar as crianças dali a algum tempo e voltar para casa. Se por acaso sobraram uns trocados no bolso, podem colocá-los na sacola, como quem dá aquele “agrado” para guardadores de carro.
Como no xópin, você pode entrar e sair sem levar nada. Pode passar um tempo, distrair-se um pouco, ver pessoas, olhar vitrines, mas chegar à porta de saída do mesmíssimo jeito que entrou. Você pode escolher o que mais lhe interessa e até decidir que nada daquilo é para o seu bico. Tudo muito interiorizado. Ninguém precisa saber quais são as suas reais intenções. Não existe lei que proíba olhar e não levar. Ou ouvir e não escutar. Ou ser ensinado e não aprender.
Dá para fazer isso por muito tempo, sem que ninguém note. Conheci pessoas assiduamente freqüentadoras do “Xópin da Fé”. Não faltavam nem que chovesse canivete aberto virado para baixo. Os demais transeuntes (eu incluído) achavam que eles eram o tipo de consumidores que sustentavam o Xópin. Se eles resolvessem passear em outro lugar, seria terrível para o nosso. Qual não foi a surpresa quando eles decidiram não apenas parar de ir ao nosso xópin, como também se divorciar, mandar cada filho para um lado e meter o pé na jaca.
Histórias assim são lugar-comum. Porque, em nossa sociedade pós-moderna, inventaram o “foro íntimo”. Ele é mais conhecido popularmente como o “ninguém-tem-nada-a-ver-com-a-minha-vida”. Tenho ouvido gente assumir cada vez com mais facilidade a história de que você pode levar o cavalo à água, mas não pode obrigá-lo a beber. Em outras palavras, cada um por si e que Deus tenha misericórdia de nós.
Meu cone de nozes lambuzadas está se esvaziando. Olho de um lado e de outro, felizmente o corredor está vazio. Posso bater no fundo do saquinho para fazer sair o último grãozinho, o que seria impensável na presença de outros finos consumidores.
Jogo o cone no lixo orgulhosamente e saio. Não preciso gastar mais nenhum centavo. Sou um cidadão da era do buffet capitalista.