As Suzanes de cada um

Amigos, desde que o bárbaro crime de Suzane e os irmãos Cravinhos assolou o país, em outubro de 2002, muito se escreveu e se disse, inclusive nesta coluna (Barbáries da classe média, nov 2002), sobre as razões que levam uma pessoa a agir dessa forma. Fóruns acalorados e acirrados debates tomaram conta da Internet. Pais ficaram assustados. A sociedade foi alertada mais uma vez sobre o fato de que a miséria e o analfabetismo não são os únicos componentes da violência e da criminalidade.

Agora, depois de algumas semanas de um espetáculo circense e grotesco, em que advogados pagos a peso de ouro fizeram de tudo, inclusive abandonando o fórum e deixando todo um sistema judiciário com cara de tacho, saiu a condenação. Suzane von Richthofen, seu ex-namorado e comparsa Daniel foram condenados a 39 anos e 6 meses. O outro irmão, Cristian, pegou “somente” 38 anos e 6 meses. Ainda virão recursos e jogadas jurídicas e no final das contas é capaz de ficarem presos mais alguns dias e pronto. É só passar um pouco a atenção da mídia e as coisas poderão modificar-se sensivelmente no que diz respeito às penas dos condenados.

Muita coisa chamou atenção nesse julgamento. Primeiro, a maneira como os acusados e seus defensores lutaram todo o tempo para jogar a culpa uns nos outros. Em dado momento, Suzane evocou até a presença de um espírito imundo que atormentava seu namorado e que o levou ao crime. Não nego que isso seja possível. O mundo espiritual é real e sua função é mesmo a de matar, roubar e destruir. É possível também que ela tenha alguma razão ao afirmar que se sentia pressionada por seu namorado. Porém, o que poderia justificar ou amenizar a responsabilidade dela? Desde que mundo é mundo, a tendência do ser humano é transferir a culpa. Ninguém assume nada. Não se tem vergonha de fazer, mas para arcar com a responsabilidade depois, é outra conversa.

Depois, a cara de pau de algumas testemunhas, que afirmaram que Suzane não mente. Depois daquela entrevista no Fantástico, ficou difícil provar isso.

Há outras tantas histórias e informações sobre o caso. Não se pode esquecer que a mídia cobriu o evento também por interesse de audiência, não por interesse moral ou em defesa da sociedade. Então, as informações não são isentas. São mais sensacionalistas do que jornalísticas.

Mas há algo que me assusta mais do que a história em si, com toda a sua perversidade, desamor, impiedade e estupidez. Há algo que me deixa com uma enorme pulga atrás da orelha. É saber que potencialmente, qualquer um de nós, inclusive eu, poderia ter cometido a mesma atrocidade. Paulo diz que em nossa carne não habita bem nenhum. O bem que queremos fazer, não fazemos. O mal, que não queremos, este é o que fazemos. Isto é assustador. Todos nós temos o gene do pecado, e se não fosse a graça de Deus, que nos transforma e se manifesta salvadora, educando-nos a renegar a impiedade e as paixões mundanas, o nome de qualquer dos meus leitores poderia estar hoje nas páginas policiais.

Isto não diminui em absolutamente nada a responsabilidade dos condenados. Eles fizeram e têm que pagar por isso. Até o fim. Sem redução de pena. Sem habeas corpus. Não deveriam existir atenuantes. Os que me conhecem mais de perto sabem que tipo de pena eu defendo para estes casos. Cabe, sim, às autoridades constituídas julgá-los no máximo rigor da lei.

A nós cabe uma profunda reflexão. Somos todos Suzanes e Cravinhos. Não somos melhores do que eles. Se dermos vazão aos nossos instintos pecaminosos, desaguaremos sem dúvida nenhuma no mesmo poço de lama e perdição. O que Deus disse a Caim serve até hoje para nós como um alerta máximo: “eis que o pecado jaz à porta; o seu desejo será contra ti; mas a ti cumpre dominá-lo. Ninguém nasce com a tendência para o bem. A inclinação natural de todo ser humano, salvo ou perdido, é ceder ao desejo do pecado, em todas as suas manifestações, da mentira para o pai ou para a esposa até matar os pais com pauladas enquanto dormem.

Se não estivermos conscientes disso, vamos nos surpreender com as atitudes que muitas vezes surgem até mesmo no meio do povo de Deus. Não são poucas as escabrosas histórias do que anda acontecendo dentro das igrejas. Há pouco tempo ouvi de uma grande igreja em São Paulo que flagrou filhos de diáconos e líderes fumando maconha no banheiro do templo. Já vi casos de “jovens cristãos”, gente com responsabilidades na igreja, participando de orgias regados a sexo, drogas e álcool. Acampamentos cristãos têm tido problemas sérios de homossexualismo, drogas, imoralidade e comportamento. Na maioria dos casos conhecidos, a reação dos pais é a mesma dos pais dos Cravinhos: buscar atenuantes e justificativas, tentar atrapalhar e até impedir o trabalho da justiça, jogar a culpa para cima dos filhos dos outros, ressentir-se pecaminosamente da disciplina da igreja, tentando defender a honra da família. Alguns só vão entender que este não é o caminho quando acontece uma tragédia. Que Deus nos livre delas!

Não adianta tentar negar um fato bíblico: se qualquer um de nós – não importa quem sejamos, qual o nosso sobrenome ou qual a nossa posição no Reino de Deus – dermos espaço ao pecado, ele vai ser “contra nós”. Vai deixar sua marca e fazer seu estrago.

Quem nega isso precisa ser questionado quanto à sua sanidade mental. Agora, quem defende quem faz isso precisa ser questionado quanto à sua sanidade moral e espiritual.