Madrugada alta.
Um vento frio cantava assombros em nossos ouvidos acostumados com a solidão das águas, pescadores que éramos.
Na vasta escuridão ao redor do barco que nos acolhia, lições de vida e espera.
Silêncio.
Meu coração, em especial, estava cheio de dúvidas. Aliás, os questionamentos sempre foram inquilinos do meu coração. Estava seguindo ao Jovem Galileu com devoção e entrega. Abrira mão de meus sonhos pessoais para viver os dEle. Não havia arrependimento em mim, apenas, aquele grito comum de minha angústia – sempre e sempre ansiando por uma explicação a mais.
Fui despertado de meus devaneios pelo grito de João:
– Olhem! Um fantasma!
Caminhando sobre as ondas, um vulto se aproximava de nós. Turbilhão em nossos medos. Lembranças de tantas e tantas estórias que faziam parte do nosso infantil cancioneiro. Taquicardias. Suores frios. Temores noturnos.
E uma voz familiar nos arranca do angustioso desconhecido.
– Não fiquem assustados. Sou eu!
Como um raio de sol rasgando um céu de nuvens pesadas, a forte voz do nosso Mestre afastou todo medo – Nele podíamos confiar.
– Jesus! É o senhor mesmo?
– Sim, Pedro…. sou Eu. Você quer caminhar comigo sobre as águas? Você quer confiar em mim o suficiente para vencer o natural? Você quer experimentar apenas CRER contra o impossível? Saia da segurança do barco… e caminhe até a Mim.
Sim! Era tudo o que queria! Parar de racionalizar todos os fatos… todas as imagens… todo o milagre… todo pão repartido para uma multidão… toda busca de certezas em meio a questionamentos… sim! é o que mais queria.
Meus pés pisaram resolutos em uma rocha de fé. E caminhei sobre as águas do Mar da Galiléia. Um passo… outro passo… e meus olhos firmes no Galileu não me permitiam racionalizar – mergulhar minhas dúvidas na Sua Força transformou a ausência de solidez da água em uma estrada segura.
Até que meu coração – ah, este meu coração! – jogou em minha entrega uma sementinha de dúvida. Olhei para o Racional. Tirei meus olhos da Fé. E comecei a afundar.
– Salve-me, Jesus ! Salve-me das águas das certezas . Elas me afogam. Elas me destróem a vida, Elas me afastam do que busco. Salve-me, Senhor, da visão do real e batize minha alma no sobrenatural.
Uma mão calejada e forte me alcançou. Firme. Estava novamente em segurança.
Daquela madrugada em diante, todas as vezes que quis transformar o encontro maravilhoso com o sobrenatural em pontos e contrapontos de conceitos, me lembrada de um mar agitado, um Mestre me convidando, uma resolução tomada e a verdade maior: eu caminhei sobre as águas.
por Vivian Santana