Hotel Ruanda

Hotel Ruanda é aquele tipo de filme que assusta muito mais do que as produções do gênero de terror. Isso porque é uma história triste, revoltante, que, além de ser baseada em fatos reais, ainda acontece enquanto estamos em casa assistindo ao filme.

Em 1994, quase um milhão de civis morreu em um conflito acontecido em Ruanda, África. O fato, apesar de ser recente e extremamente atroz, não é ensinado nas escolas, muito menos lembrado por memoriais ou reportagens. E pior: conflitos étnicos muito parecidos vêm acontecendo em outros países africanos, principalmente, sem que haja qualquer alerta ou intervenções vindas dos países do grupo conhecido como Primeiro Mundo. É este alerta que “Hotel Ruanda”, dirigido pelo irlandês Terry George, quer fazer. Por meio da história de Paul Rusesabagina (vivido pelo excelente Don Cheadle), o longa mostra algumas das atrocidades acontecidas nesse conflito tribal. O estopim dele foi o assassinato do presidente Habyarimana. A partir desse ponto, as duas etnias, que formam a população ruandense – tutsies e hutus –, entraram em guerra.

Enquanto os exércitos americano e europeu fecharam os olhos para o conflito, Paul não teve outra escolha a não ser abrigar milhares de refugiados no Mille Colines, hotel de luxo que dirigia, protegendo as mais de mil pessoas que chegaram ao local em busca de ajuda. O protagonista, que no começo do filme está interessado somente em defender sua mulher Tatiana (Sophie Okonedo) e os três filhos pequenos, começa a encontrar força e coragem para seguir em frente protegendo cada vez mais pessoas da forma como pode: barganhando, conversando e desafiando as armas que lhe são apontadas.

Qualquer semelhança com A Lista de Schindler não é coincidência, mas sim o reflexo da crueldade que a alma humana é capaz de atingir quando Deus é deixado de lado. O terror do genocídio de civis inocentes, condenados por sua etnia, é muito mais grave do que um assassino em série. Mas assusta somente aos capazes de pensar na crueldade. O herói deste filme, no entanto, não tem superpoderes, mas sim alma. Se no começo do filme ele só está preocupado em salvar sua família, aos poucos ele acaba incorporando seus vizinhos ou qualquer um que pedisse abrigo, porque eles acabam tornando sua própria família. A ruandense.

“Hotel Ruanda” não apela da violência explícita para tocar o espectador. Por meio das insinuações de situações extremas, Terry George cria cenas sensíveis e cruéis, capazes de dar nó na garganta. Talvez o mais assustador neste filme é que o genocídio tenha sido conduzido por civis. Os hutus pegaram em facões para eliminar os tutsis. Assim, intolerante e cruel. Mas, além disso, os poderosos das grandes potências preferiram fechar os olhos quanto ao genocídio e retirar suas tropas e civis do país africano. Afinal, a Ruanda é uma nação pobre e africana. Melhor perder quase um milhão de pessoas a alguns soldados do que sujar as mãos em troca de nada era o pensamento “primeiromundista”. E é contra essa forma de pensar que “Hotel Ruanda” se posiciona ao mostrar de forma tão sensível a história deste herói da vida real.

Vale a pena assistir a versão em DVD devido ao documentário produzido com declarações do próprio Paul Rusesabagina que vem nos extras. A história ganha mais força ainda.