“Conheçamos e prossigamos em conhecer ao SENHOR; como a alva, a sua vinda é certa; e ele descerá sobre nós como a chuva, como chuva serôdia que rega a terra.”[1]
Dos assuntos que mais dividem os grupos cristãos, as questões litúrgicas sempre tiveram grande êxito em trazer divisão no meio da Igreja. Em alguns momentos históricos, a discussão litúrgica foi mais importante que as questões teológicas enquanto gatilho para separação. Não quero bailar sobre esta história tão cheia de brios feridos.
Liturgia é a forma de sistematização do culto público da igreja. Originalmente introduzida pela igreja romana, a “liturgia da missa” deveria constar de ritos iniciais (saudação, ato penitencial, Kyrie e Glória); liturgia da palavra (duas leituras do Antigo e do Novo Testamento, aleluia, evangelho, homilia, credo ou profissão de fé); liturgia eucarística (oferendas, prefácio, Sanctus, Benedictus, cânon romano ou introdução à consagração); rito da comunhão (pai-nosso, Agnus Dei, comunhão) e ritos finais (oração e bênção final). As igrejas protestantes também adotam princípios de liturgia para o culto público. Algumas liturgias são mais rígidas, admitindo poucas variações nas partes do culto. Outras são totalmente flexíveis, inadmitindo qualquer forma de sistematização do culto. Particularmente, creio que em um culto público, alguma sistematização deve ser adotada para privilegiar a Palavra (seja falada, cantada ou representada) e a oração. No entanto não quero tratar neste artigo da liturgia do culto público, mas da liturgia do viver diário do cristão.
Ao longo dos séculos, o cristianismo distorceu cruelmente o sentido de “culto”. O dicionário Aurélio expressa de forma limitada o significado de culto quando define o termo como: “Adoração, veneração, reverência, preito”. Cultuar a Deus é bem mais do que isto.
Cultuar ao Senhor é conhecê-lo mais. O conhecimento de Deus não é meramente intelectual. Deus não nos fez somente mente. Fomos feitos intelecto, emoção e ação. Conhecer ao Senhor é um processo de transformação de todas estas etapas. A liturgia do Viver Cristão precisa conter doses diárias de conhecimento intelectual a respeito de Deus, mas também doses proporcionais de meditação e submissão ativa á Sua Palavra. Precisamos nos exercitar em momentos devocionais recheados de oração dedicada. Este princípio de liturgia individual só passa a ter significado quando colocado em prática. “Eu te conhecia só de ouvir, mas agora os meus olhos te vêem.” [2] Só passaremos a compartilhar desta experiência de Jó quando, como ele, nos envolvermos em um compromisso de estabelecer uma íntima relação com nosso Deus.
Cultuar ao Senhor é louvá-lo publicamente. Os primeiros cristãos compreendiam bem este princípio litúrgico para o viver diário. “… falando entre vós com salmos, entoando e louvando de coração ao Senhor com hinos e cânticos espirituais” [3]. Estudando atentamente os textos bíblicos relacionados com a palavra louvor, é possível inferir claramente que o termo louvor não trata somente das palavras de gratidão que saem da nossa boca. Louvor é uma disposição interna do nosso coração que nos direciona a atitudes de gratidão. Trata-se de um mover íntimo que nos move a proferir palavras de gratidão. Não podemos distorcer este significado. Assim, se alguém está realmente grato, sua gratidão deve ser de alguma forma, publicamente reconhecível e vice versa.
Cultuar ao Senhor é imbuir-se de um íntimo desejo de prosseguir em Sua direção. O profeta Oséias foi bastante feliz ao usar o termo prosseguir no texto acima. Prosseguir significa literalmente dar seguimento, continuar. A liturgia do viver cristão nos convoca a dia-a-dia nos achegar para mais perto do Senhor em uma relação de total dependência física e espiritual. Quanto mais perto de Deus, mais longe do pecado estaremos. Não precisamos nos preocupar com o que perder aqui neste mundo. Não há o que perder na finitude da temporalidade se Deus nos chama para a Eternidade ao Seu lado. “Não tenha o teu coração inveja dos pecadores; antes, no temor do SENHOR perseverarás todo dia.”
Culto com liturgia rígida ou liturgia maleável… Se não for acompanhada com a liturgia pessoal do viver cristão diário produzirá muito pouca maturidade na sua vida.
Carpe Diem[5] em culto ao Senhor!
Até a próxima.
Notas:
[1] Oséias 6:3 [2] Jó 42:5 [3] Efésios 5:19 [4] Provérbios 23:17 [5] “Carpe Diem” quer dizer “colha o dia”. Colha o dia como se fosse um fruto maduro que amanhã estará podre. A vida não pode ser economizada para amanhã. Cada dia é um novo dia que Deus fez para você, meu irmão. Utilize as 24 horas que Ele te deu para cultuá-lo. “Rogo-vos, pois, eu, o prisioneiro no Senhor, que andeis de modo digno da vocação a que fostes chamados,” (Efésios 4:1)