King Kong

Quando o King Kong original foi lançado em 1933, o mercado cinematográfico amargava uma forte crise de público iniciada quatro anos antes, com a quebra da Bolsa de Nova York. Em tempos de profunda depressão, não era nada fácil convencer o espectador – que mal tinha o que comer – a colocar a mão no bolso para comprar um ingresso de cinema. Os produtores sabiam que era necessário produzir filmes diferenciados, grandiosos e/ou escapistas, que funcionassem como uma espécie de “fábrica de sonhos” (a expressão foi cunhada naquela época) para uma platéia desencantada, triste e desiludida.

A Warner apostou no filão dos chamados “filmes de gângsteres”. A Metro iniciou sua longa tradição de belos musicais com finais felizes. E a Universal descobriu que o público adorava exorcizar seus medos através de monstros do calibre de Drácula, Frankenstein e A Múmia.

Passados mais de 70 anos, provando novamente que a história é cíclica, o mercado cinematográfico mundial vê outra vez o seu público diminuir. A crise agora é provocada não mais pela bolsa de Nova York, mas pelos DVDs, home theaters, altos preços do ingresso de cinema, downloads, pirataria, etc. Mas os produtores continuam sabendo que, para convencer o espectador a colocar a mão no bolso e comprar um ingresso de cinema, é necessário produzir filmes diferenciados, grandiosos e/ ou escapistas. Por isso, nada melhor que ressuscitar o gorilão da RKO e refazer um King Kong turbinado com um mega orçamento superior a US$ 200 milhões e o prestígio de “Peter – O Senhor dos Anéis – Jackson”. Para velhos problemas, velhos remédios.

Este novo King Kong acerta em vários pontos. O primeiro é tentar resgatar – dentro do possível – a história clássica que o escritor Edgard Wallace ajudou a criar para o filme de 1933, apagando desta forma o engano que foi a versão de 1976, estrelada por Jeff Bridges. Assim, a ação é ambientada nos charmosos anos 30, o que proporciona uma reconstituição de época de encher os olhos.

Um dos acertos do filme é valorizar a dimensão “humana” do gorilão, se é que podemos falar assim. Afinal, este é um dos principais trunfos de toda a trama, pois é só na medida em que Kong mostra que não é uma besta-fera, que é possível desenvolver a idéia de que os humanos são os verdadeiros selvagens. Felizmente, os efeitos especiais (alguns beirando à perfeição, outros nem tanto) não eclipsaram esta dimensão humana da história.

Também é eficiente a maneira pela qual o roteiro retarda a entrada de Kong na tela, criando um clima crescente de suspense e construindo os personagens dentro de seu devido tempo. O grande erro do filme, contudo, fica por conta de seu exagero. Uma vez mostrado o grande astro que todos querem ver, King Kong se torna vítima de sua própria grandiosidade e envereda pelo perigoso (e usual) caminho do “filme-videogame”. Há seqüências intermináveis de perseguições e lutas que, além de não contribuírem em nada para o desenvolvimento da narrativa, diluem a carga dramática e emotiva que a produção havia conseguido criar em sua primeira parte. São cenas inteiras que ficariam melhores num Nintendo que numa tela de cinema. Coisas do tipo “ajude nossos heróis a escaparem dos brontossauros – Fase 2”. Mas não dá pra negar que são cenas “de tirar o fôlego”.

Na somatória, King Kong é um filmaço. Cumpre o que promete e deve rapidamente se transformar num grande sucesso de bilheteria. Mas o seu bom início e seu final satisfatório ficariam muito mais valorizados se o miolo não fosse tão esticado por cenas que trocam a dramaticidade pela adrenalina sem conteúdo. De qualquer maneira, vale lembrar que os produtores continuam sabendo que, para convencer o espectador a colocar a mão no bolso e comprar um ingresso de cinema, é necessário produzir filmes diferenciados, grandiosos, escapistas, etc, etc, etc…