Ouvi esta expressão do pastor Ariovaldo Ramos, no 32º Encontro Sepal para Pastores e Líderes, e as palavras não param mais de se repetir em meu coração.
Se você perguntar para qualquer cristão mais sério e que tenha um mínimo de conhecimento da Palavra de Deus o que é Graça, a resposta será, tenho quase certeza: “Graça é favor imerecido”. E realmente é, ensinou o pastor Ariovaldo, mas não apenas isso. A Graça de Jesus é muito mais.
Somente o fato de você abrir os olhos pela manhã já é um ato gracioso da parte de Deus e continuar vivo é uma demonstração ainda maior da Sua infinita Graça. Indo por esse caminho você vai concordar que “favor imerecido” é uma descrição simplista demais de algo que é infinitamente superior a qualquer expressão que o nosso limitado vocabulário possa produzir. Não existem palavras humanas suficientes e capazes de definir a Graça de Cristo.
Tenho pensado que, na verdade, nenhuma ação de Deus em favor da humanidade está alheia à Sua Graça. Nascer é um milagre da Graça. Cada vez que uma criança nasce, Deus nos lembra que a Salvação veio através do ventre de uma mulher. Que da semente da mulher viria Aquele que esmagaria a cabeça da serpente. E cada nascimento comprova a intenção graciosa de Deus por nós. O choro de um bebê é a voz de Deus dizendo: “Vocês valem a pena. Eu continuo amando vocês”.
Mas se o nascimento de um bebê é a extensão da Graça, a morte, quase sempre, é a maldade humana e demoníaca em ação para tentar frustrar os planos do Criador. Mesmo assim, até mesmo a morte é transformada em uma expressão de Graça da parte de Deus para com a humanidade. Se após o pecado não houvesse morte, também não haveria salvação e remissão de pecados, pois “sem derramamento de sangue não há remissão de pecados”. Se não houvesse morte, não haveria salvação – Jesus precisou morrer para nos salvar. E se a salvação vem pela fé e a fé em Jesus, então cada vez que um adolescente de classe média morre por overdose, sem ter recebido a Jesus, a Graça não se tornou para ele uma realidade salvadora. Por isso, a morte como iniciativa humana e demoníaca é a maré contrária à Graça salvadora, pois cada vez que um adolescente morre baleado no mundo do tráfico, nas favelas, se ele não recebeu a Jesus como o seu Salvador, a Graça não se tornou para ele uma realidade salvadora.
Cada vez que uma mulher morre nas mãos de um marido embriagado e violento, sem ter recebido Jesus, a Graça não se tornou para ela uma realidade salvadora. E isso diz respeito a nós, cristãos, e não a Deus. Pois Deus já doou de si, Ele já derramou a Sua Graça. Por isso, o mínimo que podemos fazer é usar a Graça que nos alcançou para alcançar outros, antes que a possibilidade de vermos a Graça se tornar salvação se encerre pelo fim trágico de uma bala perdida, de uma facada de ódio, da morte encomendada pelo traficante ou até pelo preço que a droga cobra.
Você pode dizer que a culpa de tudo isso não é sua, não é nossa, mas eu estou convencido do contrário. Porque se a gente não mata, pelo menos deixa morrer. A gente não puxa o gatilho, mas aceita a miséria passivamente. A gente não enfia a faca, mas não ensina que ninguém precisa viver assim. A gente não amarra a bomba na barriga para matar os inocentes que são julgados culpados nem sei do quê, mas a gente não vai ensinar os terroristas que eles podem servir a Deus sem precisar matar pessoas para mostrar sua devoção e garantir a salvação.
Assim, a voz que deveria erguer profecias contra o pecado, contra a maldade, contra tudo o que tenta sabotar a Graça de Deus, fica calada, e isso não é menos que puxar o gatilho. Matar não é menor que deixar morrer.
Infelizmente muitas mãos que deveriam ser a prova de que a Graça existe, funciona e salva, permanecem encolhidas para o órfão e a viúva, pois, desmemoriadas, não lembram que a religião que Deus aceita como pura e sem manchas é justamente lembrar do órfão e da viúva e não se deixar corromper pelo mundo (Tiago 1. 27).
E enquanto nós, cristãos, que recebemos a Graça, não a distribuímos, na verdade, usamos a Graça de Deus contra o Deus da Graça. Ou seja, Deus nos deu Graça para dividir, para compartilhar, mas nós nos calamos, nos escondemos nas paredes da religiosidade e esquecemos que graça que não funciona, simplesmente não é graça.
As crianças que morrem de fome não têm tido tempo de conhecer o Salvador porque nós não estamos repartindo o amor a ponto de elas crescerem. E isso vale para todos os que morrem sem Jesus. Nós deixamos de distribuir a Graça através do pão, do sopão, da creche, da conscientização, do amor concreto, e isso é contribuir para que o desejo do Pai de que todos sejam salvos, seja sepultado em nosso egoísmo, alienação e falta de amor.
Precisamos distribuir a Graça de Deus através das ações sociais. Precisamos correr para salvar nossas crianças devoradas pela fome. Precisamos prolongar a vida. Precisamos dar mais tempo para que as pessoas conheçam o Salvador. Precisamos gritar em todas as esquinas contra a injustiça e contra a matança indiscriminada dos nossos jovens. Para que eles tenham a oportunidade de experimentar, de fato, a Graça que salva da perdição e que oferece a vida verdadeira.
Cada vez que encolhemos a mão para fazer o bem, cada vez que entesouramos ao invés de repartir, cada vez que nos omitimos de fazer o bem, usamos a Graça de Deus contra o Deus da Graça. Por isso, fazer o bem a todos, cuidar dos órfãos e das viúvas, salvar as nossas crianças que gritam de fome nas esquinas de todas as ruas, abraçar mendigos, visitar hospitais, ser a mão do amor concreto do nosso Deus, é a única maneira aceitável de um cristão viver.
Não tem jeito, quem conhece e entende e já experimentou a essência da Graça de Jesus, sabe que, se não for repartida, perde o significado e acaba se transformando em ofensa contra o Deus que ama a todos e deseja que todos sejam salvos. Se agirmos assim, usaremos a Graça de Deus contra o Deus da Graça e não seremos melhores que as mentes do mal que dominam este século e que não descansam no ofício de impedir que pessoas valiosas para Deus, pessoas pelas quais Jesus morreu, se percam e nem cheguem a conhecer o que é a maravilhosa Graça do nosso Deus de amor.
por Clóvis Jr.