“Ora, o traidor tinha-lhes dado esta senha: Aquele a quem eu beijar, é esse; prendei-o e levai-o com segurança” (Marcos 14:44).
Judas nunca conseguiu derramar lágrimas. Atravessou a vida totalmente insensível, e nem as cenas mais comoventes vividas pelos personagens bíblicos tocou seu coração.
Quando em Betânia, Maria, agradecida pela ressurreição do seu irmão Lázaro, ungiu os pés de Jesus, enxugando-os com seus cabelos, foi por ele duramente censurada: “Por que não se vendeu este perfume por trezentos denários e não se deu aos pobres?”.
Aquela cena tocou profundamente o coração de Jesus, pois falava de sua morte.
Judas, ao contrário, foi ter com os principais dos sacerdotes e lhes propôs um grande negócio: um plano para entregar seu Mestre pela soma de trinta moedas de prata – dez por cento do valor atribuído ao perfume de Maria.
E diante de muitas curas e ressurreições, seu coração permanecia como a mais fria pedra de mármore.
Um coração seco jamais fará brotar lágrimas dos olhos.
Na escura noite da traição, frente a frente com Jesus, aproxima-se do seu rosto para beijá-lo. Provavelmente a única vez que o beijou. E mesmo assim, para dar um sinal aos soldados. Aquele era um beijo enganoso: “… porém, os beijos de quem odeia são enganosos” (Provérbios 27:6). O olhar de Jesus jamais lhe comoveu: “com um beijo traís o Filho do Homem?”.
Que diferença do seu colega de apostolado, Pedro. Ao presenciar a prisão de Jesus, passou a segui-lo de longe. O amor fez com que Pedro tivesse vergonha de fugir; o medo fez com que ele tivesse vergonha de se aproximar. Mas, ao presenciar a cena do julgamento de Jesus, foi profundamente tocado pelo seu olhar e chorou amargamente. Se Pedro tivesse derramado as lágrimas sem ver a cruz poderia ficar desesperado; se tivesse visto a cruz, mas não derramado lágrimas, ficaria apenas arrogante.
Judas, tocado pelo remorso, foi enforcar-se. Nada mudou seu coração desde o primeiro contato com Jesus até aquela última noite. Uma vida cheia de paradoxos: viveu e caminhou ao lado da luz, mas nunca abandonou as trevas. Depois da ceia memorável, saiu na escuridão. O evangelista João destaca: “Ele, tendo recebido o bocado, saiu logo. E era noite. Como viveu, morreu na escuridão do pecado e sem derramar lágrimas”.
Pedro, tocado pelo arrependimento, foi restaurado por Jesus. Judas, tocado pelo remorso, seguiu seu próprio caminho para longe de Jesus.
Que nossas vidas tirem lições destas duas vidas: sigamos o caminho de Pedro levando sempre no coração o olhar de Jesus, e jamais permitamos que uma pequena faísca da vida de Judas modifique totalmente nossa vida.
por Orlando Arraz Maz