Amigos, há mais de dois anos esta coluna escreveu um artigo sob o título “10 razões porque Romário é o melhor do mundo“. Ele ainda está disponível nos arquivos de Colunet. Naquela oportunidade, ressaltei as qualidades técnicas excepcionais de um atleta fora-de-série, que era capaz de decidir sozinho uma partida de futebol, sua atividade, e que, por isso mesmo, destacava-se como um dos maiores jogadores de todos os tempos. Apliquei 10 lições práticas. Nem todos entenderam adequadamente a idéia, houve quem reclamasse do texto etc.
Hoje, sou forçado a voltar ao tema. Esta semana, o baixinho tetra-campeão, 37 anos, várias vezes celebrado pelos entendidos do esporte mais popular do mundo como o melhor de todos, foi capa de jornal e manchete de TV no mundo inteiro. O motivo? Uma vergonha. Espancou, junto com o Zé Colméia (será que é porque anda com o Catatau?), um torcedor que o importunava da arquibancada, durante um treino nas Laranjeiras, campo do falido Fluminense. Não sei se compensará queimar muito a pestana tentando tirar muitas lições do lamentável episódio, mas algumas reflexões são inevitáveis, quase automáticas.
Primeiro, Romário me fez pensar sobre a hora certa de pendurar as chuteiras. Você pode não entender como nem porque, mas imediatamente ao saber da notícia, lembrei-me da história de Saul e Davi. Deus escolheu este para substituir aquele, e avisou-lhe: “Tirei teu trono de ti e dei a outro que é melhor do que tu”. Já ensinou bem o sábio Salomão: “Tudo tem seu tempo”. Ninguém é insubstituível. Ao contrário, o segredo do sucesso é justamente a sabedoria de saber quando não é mais a nossa vez. Não sou o único a achar que a de Romário já passou. Não importa se ele continua fazendo um golzinho aqui e outro ali. Ele já não é mais o mesmo e deveria ter sido aconselhado a parar no ano passado. Na pior das hipóteses, ele teria evitado a palhaçada desta semana. A vida é dinâmica. Todos se lembram que ganhamos a copa de 94 APESAR do Parreira e POR CAUSA do Romário. Mas isso foi há quase 10 anos. Um dia é um dia. Outro dia é outro dia. Amanhã o hoje vai ser ontem.
Infelizmente, não é só o Romário que não sabe a hora de parar. Vejo um monte de gente segurando o progresso na obra de Deus porque já perdeu o bonde da História, não quer adaptar-se às novas realidades e ao mesmo tempo não se toca que tem mais gente que pode assumir a camisa 11. Minha vó diria que esse é o tipo de gente que “não bebe nem desocupa o copo”. E continua na frente das igrejas, fazendo uma bobagem atrás da outra, dando as cartas e achando-se os donos da verdade. Seria tão bom que eles encerrassem a carreira, pelo menos em campo. Talvez poderiam se transformar em comentaristas, técnicos, diretores. Mas no campo, têm que ser carregados pelos outros. Seu tempo já passou.
Segundo, Romário me fez pensar que as realizações do passado jamais servirão para justificar as bobagens do presente. Um cara que ganhou uma Copa do Mundo praticamente sozinho, merece o respeito. Mas nem por isso se tornou um cidadão acima dos outros. Precisa respeitar também. Não está acima do bem e do mal.
Não se pode usar o que a gente fez ou foi, como se nossas proezas passadas nos servissem de salvo-conduto para dizer ou fazer o que bem entendemos. Quantos há que se escudam por trás de sua idade, experiência ou histórico ilibado para sair pelo mundo distribuindo veneno, sectarismo e belicosidade. Falam o que querem, do jeito que querem, para quem querem. Se são argüidos, defendem-se dizendo que já fizeram isso ou aquilo, que têm tantas décadas de fé e tal. Dou graças a Deus pelo passado de muitos homens, mas às vezes desses mesmos homens não se pode dizer o mesmo acerca do seu presente. E Salomão, de novo, ensina que “melhor é o fim das coisas do que o seu começo”.
Terceiro, Romário me faz pensar que a competência traz notoriedade e quem não sabe lidar com isso fica notoriamente marcado. Se fosse um perna-de-pau (ou seja, um dos jogadores do Corinthians, por exemplo) que tivesse feito isso, ninguém daria muita bola. Afinal, ninguém chuta cachorro morto. Mas foi o Romário, atleta conhecido no mundo inteiro, que já jogou na Europa, que já recebeu prêmios internacionais. O resultado não podia ser outro. Todos os canais do mundo deram a notícia. Quanto maior a fama, maior a lama. Este é preço de sermos melhores do que os outros. Quando acertamos, ninguém se lembra. Quando erramos, ninguém se esquece.
Mas esta é a regra do jogo. Quem ganha destaque na vida, precisa se cuidar mais do que os outros. Os olhos das pessoas costumam estar mais em cima dos que estão em evidência. Isso é natural. E uma tremenda responsabilidade. Aqueles que estão “à frente” são mais visados mesmo e tem que ser assim. Até porque é de se esperar que aqueles que alcançam notoriedade desenvolvam concomitantemente uma maturidade que os ensine a agir e a reagir adequadamente. Senão, vão virar capa de jornal.
Ou, conforme o caso, o assunto da vez nas rodinhas.
Pensando bem:
Quanto maior a fama, maior a lama.