“Se um rinoceronte entrasse neste restaurante agora, não há como negar que ele teria um grande poder. Mas eu seria o primeiro a levantar-me e garantir-lhe que ele não tem qualquer autoridade por aqui”. G. K. Chesterton
O pecado no coração é espaçoso e assustador como o rinoceronte de Chesterton[1]. Você já sentiu como se houvesse um grande animal à solta dentro da sua alma tentando impulsionar-lhe para o mal, inclinar você para direções contrárias, impelindo-o a praticar o mal que tanto deseja evitar, sem conseguir fazer o bem que tanto deseja fazer? Como o rinoceronte, ele tenta forçar-se sobre você, controlar, dominar, manipular, mesmo que você se levante e diga que ele não tem autoridade nenhuma. Ele trabalha constantemente para pressionar e gerar moldes malévolos e intenções impuras. O pecado que habita em nós é usurpador do trono da alma.
Os teólogos o chama de pecado residente. Paulo chama da lei do pecado em Romanos 8:2: “Porque a lei do Espírito da vida, em Cristo Jesus, te livrou da lei do pecado e da morte.” Se parece com a lei da gravidade, poderosa e influente, puxando para baixo mesmo os crentes mais experientes e maduros. A lei do pecado é como uma enxurrada que nos leva rio abaixo com força e violência. Você não se sente por vezes cansado, lutando contra a maré, sendo levado por ela? “Por que a natureza pecaminosa é contrária ao Espírito, e o Espírito é contrário à natureza pecaminosa. Eles estão em conflito um com o outro, de modo que você não faz o que quer” (Gálatas 5:17). Embora queiramos nos livrar plenamente do seu poder ele ainda exerce um controle parcial sobre nós. O pecado residente age como sedutor do coração, ameaçador da fé, praticante de assédio moral interno. Como quer que o chamemos, ele é um inimigo de Deus e de nossas almas.
O profeta Jeremias escreveu o seguinte: “Enganoso (tortuoso como um labirinto) é o coração, mais do que todas as coisas, e perverso (incurável, compreende todo tipo de iniqüidade); quem o poderá conhecer? Eu, o Senhor, esquadrinho a mente, eu provo o coração; e isso para dar a cada um segundo os seus caminhos e segundo o fruto das suas ações.” Jr 17:9,10.
O conceito coração nas Escrituras é utilizado de diferentes maneiras. Às vezes refere-se à mente que acredita ou é iluminada (Romanos 10:10, Efésios 1:18); outras vezes o coração representa a vontade de decidir, a capacidade de agir (2 Coríntios 9:7, Efésios 6:6); ou também compreende o sentimento, o afeto (2 Coríntios 2:4) . Em Hebreus 4:12 o coração pensa e sente. O coração, portanto, abrange a mente (pensamentos, planos, decisões, discernimento), vontade (escolhas e ações); sentimentos (desejos, afetos, repulsa, imaginação, emoções); e a consciência (senso de certo e errado, que aprova ou condena a mente, a vontade e os sentimentos).
Esse coração, segundo o profeta Jeremias é um labirinto que só Deus pode desvendar, uma equação matemática que só o Espírito pode solucionar. Os computadores não podem decifrar o seu genoma. Ninguém sabe completamente o seu segredo. Você poderia facilmente admitir que não conhece nem sequer o coração de sua(seu) esposa(o) e filhos, das pessoas mais íntimas e amigas. Na verdade não compreendemos nem mesmo o nosso próprio coração. Porque sempre curtimos aquela música, sentamos naquela cadeira, gostamos daquele doce de leite ou escolhemos o sorvete de flocos? Por que num dia o nosso sangue está tão quente e a energia tão elevada enquanto noutro dia nos sentimos desanimados e infelizes como um galho seco? Você poderia numerar todos os eventos e imagens que impressionam o seu coração e fazem com que ele se incline para esta ou aquela direção? Você nunca foi surpreendido pela falta de sinceridade e até mesmo pela insatisfação, medo, ressentimento e raiva que encontrou no seu coração? É isso mesmo: o coração é complicado, indecifrável, insondável e pecaminoso.
Uma coisa é ouvir uma palestra sobre AIDS – como ela se espalha, o que faz com um corpo sem imunidade, como ela é poderosa, como ela mata os africanos, e assim por diante. Outra coisa seria ouvir o seu médico dizer-lhe, “você está com AIDS – Sinto muito.” Pense sobre o pecado que habita em você, em suas inconsistências e ambiguidades. É algo diferente quando você se sente subjugado pela sua força, insanidade, influência, miséria, sujeira, iniquidade, ambição, inveja, cobiça, sensualidade e infelicidade.
O problema do pecado é que ele age como um terrorista, se escondendo nas cavernas secretas do coração como Bin Laden no Paquistão. Você nunca sabe quando virá o próximo ataque. Como lutar contra um inimigo que desaparece, justamente na hora que os aviões e tanques de guerra avançam (e aqui eu represento os cultos, conferências, louvores e outros momentos de clímax espiritual) reaparecendo do nada pelas costas, inflingindo ataques suicidas geralmente quando você se encontra desarmado e distraído, onde menos esperar?
Mas em que sentido o pecado foi derrotado? A resposta é que o Senhor Jesus derrubou o seu governo na cruz, enfraquecendo seu poder, e até mesmo o matou pela raiz para que ele não mais produza o fruto da morte eterna. Ainda assim, pecado é pecado, seu propósito e sua estratégia permanecem inalterados; seu veneno ainda nos morde e suas unhas afiadas ainda nos agarram pelo pescoço.
A diferença para o cristão é ter em si a energia espiritual e divina para dizer: não vou me render, pelo contrário, vou conseguir nadar rio acima! Reconheça que ele está em você, conheça suas áreas fortes e fracas, enfrente-o com o sangue de Cristo. Mesmo que o mal esteja presente na sua alma com cara e força de um rinoceronte, se levante diariamente e diga: “Você não tem autoridade por aqui! A única autoridade no meu coração é Cristo: venha o seu domínio e o seu reino, Senhor, seja feita a sua vontade!”
Notas:
[1] Chesterton foi um escritor, poeta, jornalista, historiador, biógrafo, teólogo e filósofo britânico.