Amigos, não tenho a intenção de ser polêmico, embora suponho que este artigo poderá provocar reações apaixonadas. Sei disso porque tenho discutido o tema com amigos, vez por outra, e raramente estas conclusões se tornaram unanimidade.
Sabem o que eu penso? Tem pessoas que nunca mudarão. Pessoas não mudam. Elas não querem mudar. Elas gostam do jeito que são. Algumas, inclusive, estabelecem condições para quem com elas queira se relacionar e este contrato envolve aceitá-las como são. Seu temperamento, seu gênio, suas manias e até suas idiotices e imaturidades. Mesmo que sejam intragáveis, elas não estão dispostas a encarar o assunto. Quem é mole e indeciso, vai ser mole até morrer. Quem é língua solta, vai ser língua solta até morrer. Quem é turrão, vai ser turrão até morrer. Quem é duro de lidar, vai ser duro de lidar até morrer. Quem é destemperado, assim será.
É por isso que se você é jovem, solteiro, livre e desimpedido e começou a perceber um padrão de comportamento que não lhe agrada ou que lhe é insuportável na sua suposta pessoa amada, com quem pretende viver e conviver pelo resto de sua vida, pense bem. Mas pense muito bem mesmo. Não espere, não se iluda nem conte com o fato de que “depois tudo vai ser diferente”. Pode ser. Mas a probabilidade maior é de que nunca seja. O sujeito dado a ser violento em palavras ou atos quando é solteiro, vai ser assim, em maior ou menor medida. Quem trata mal a seus pais, não tem compromisso, não é fiel, não se decide, não gosta de trabalhar, não dá bola para o que é certo e errado e não se incomoda com nada disso, por que motivos haveria de querer mudar, depois que conquistou o que lhe interessava? Então, se você está muito certo de que o ama, vai ter que se contentar e aprender a conviver com esses defeitos. Se eles forem insuportáveis para você, avalie. Se não estiver disposto a aceitá-los, desista. Mas não diga depois que você não sabia que seria assim.
Sejamos honestos: estamos verdadeiramente dispostos a mudar? Lembro-me de um e-mail que recebi de um amigo, há mais de dez anos. Discutíamos, amigavelmente, a necessidade de algumas mudanças em determinada organização. Lá pelas tantas, esse amigo me perguntou: “certo, precisamos mudar tantas coisas aqui, mas e você, está disposto a mudar também?” Era uma pergunta interessante, que me fez pensar. Queremos mudar o mundo, a igreja, a empresa, o mercado, o governo, a família, o cônjuge, a Bíblia, os filhos. Mas nós mesmos, no fundo, no fundo, não queremos mudar.
Pessimista? Descrente? Como conciliar isso com o poder transformador do Evangelho? Como não crer no que Deus pode fazer na vida de uma pessoa? Para que serve, então, a fé que remove montanhas? Quem se converte não muda radicalmente? Não vira nova criatura? Não deixa tudo para trás e começa tudo de novo?
Não sejamos precipitados. A resposta a essas indagações pertinentes pode ser “sim” ou “não”. Depende do que entendemos por “nova criatura”. Não nos esqueçamos de que a nova criatura vai conviver com a velha natureza. A pessoa convertida não deixa de ser a pessoa que era antes num passe de mágica. Sim, ela apreende novos valores, passa a gostar de outras coisas, ganha novos hábitos, às vezes ganha novos amigos. Esta é a mudança. Mas ela continua com sua mesma personalidade. A salvação não altera o DNA. As características pessoais permanecem. Por isso, o máximo que acontece é que alguns percebem que tem problemas, reconhecem que precisam ser diferentes e tentam, lutam muito, se esforçam, para mudar. Mas nunca ficarão livres do mal. Terão que aprender a administrá-lo. Terão dias melhores, dias piores. Terão vitórias e derrotas. Mas nunca mudarão por completo. Como um alcoólatra, precisarão levantar a cada dia e dizer que, por aquele dia, ele estará limpo. Se, no entanto, vacilar, pode por tudo a perder a sobriedade que com tanto sacrifício conseguiu. Há um goleiro Bruno dentro de cada um de nós. Se o apóstolo Paulo foi capaz de reconhecer que “em mim, isto é, na minha carne não habita bem nenhum”, não será diferente com você.
Então virão as histórias, as “experiências”, os relatos emocionados de “como eu era diferente e agora sou outra pessoa”. É mesmo? Quem disse isso? As pessoas que lhe conhecem ou você mesmo? Se forem as pessoas, pode ser que elas não sabem aquilo que só você e Deus sabem. Se for você mesmo, pode ser que as pessoas tenham uma opinião diferente.
Por esta razão, é uma notável insensatez tentar viver para mudar os outros. Causa uma terrível frustração, um sentimento de dever jamais cumprido, uma sensação de angústia por perceber que todos os esforços se mostram vãos. Passamos a vida tentando fazer com que os outros pensem de outro jeito, sejam de outro jeito, reajam de outro jeito. Sem perceber, ao mesmo tempo em que estamos tão envolvidos neste processo, os outros estão fazendo a mesma coisa conosco. E tão frustrados como nós estamos, estão eles também. Pense se esta não é a maior causa de conflitos em todas as áreas da atividade humana. Quanto estresse é causado simplesmente porque queremos a todo custo convencer o nosso semelhante a mudar. Viva a sua vida e deixe que cada um viva a sua. É o melhor jeito de não criar rugas.
Conta-se a fábula do escorpião que, querendo atravessar a lagoa, pediu carona nas costas de uma rã. O anfíbio recusou. Disse que não, que ele acabaria por enterrar-lhe o ferrão venenoso e matá-lo. O escorpião, astuto, argumentou que ele não faria isso, porque se o fizesse, ambos morreriam afogados. Convencido, a rã concordou. Atravessou o lago todo, na santa paz. Quando tocaram a margem do outro lado, ia descendo do lombo, o escorpião não agüentou. Cravou seu veneno na pobre rãzinha, que enquanto estrebuchava para a morte, indagou, desalentada: “Mas por que? Mas por quê?” “Desculpe”, responde o escorpião, “não tenho como negar a minha natureza”.