Leia antes: A Noiva I e A Noiva II
Amigos, onde, então, começa o verdadeiro problema? Não começa no abuso nem na decepção. Na verdade, estes abusos, embora devam ser denunciados e repudiados, mas poderiam muito bem ser evitados se simplesmente o povo de Deus se desse ao trabalho de conhecer a Bíblia minimamente ao invés de se acomodarem a engolir tudo o que é cuspido dos púlpitos, sem qualquer análise ou critério. Acontece que é muito mais fácil sentar e escutar do que abrir a Bíblia, estudá-la, comparar texto com texto, refletir, analisar. É aquilo que poderíamos chamar de analfabetismo bíblico funcional: o sujeito tem o Livro, sabe ler, tem a unção do Espírito Santo que nos guia a toda a verdade, mas não faz nada disso. Prefere ficar escutando passivamente e não se dá ao trabalho de desenvolver uma relação pessoal com Deus. Acaba virando um Jó, religioso, temente a Deus, que se desvia do mal, mas que não conhece a Deus. Conhece só de ouvir falar. Só de repetir as frases feitas que ouve os outros proferirem, mas que não fazem qualquer sentido dentro da sua própria realidade.
Esta situação é o prato cheio para quem dela quer se aproveitar. Se uma instituição estruturada aparece no contexto, propondo ser o intermediário perfeito entre você e Deus, é tudo o que queremos. Venha, sente-se, dê sua oferta, assuma compromissos nas variadas atividades que oferecemos e continue tocando sua vida. Pouco a pouco, começamos a absorver em tal nível esta rotina, que ficamos surpresos, ofendidos até, se alguém nos diz que isso tudo não passa de religiosidade e que, ao contrário do que pensávamos, está nos levando para longe de Deus, não para perto dele. A propósito deste assunto, sugiro ouvir as séries Espiritualidade e Cristianismo x Religião, disponíveis em irmaos.com.
Na verdade, se os cristãos se dedicassem mais a conhecer e viver a essência do cristianismo, nada disso aconteceria. O grande objetivo da pessoa salva é se tornar igual a Cristo. Pensar, agir, reagir, amar, caminhar, falar como ele. Quando nos dispomos a este exercício, tudo ao nosso redor muda de perspectiva. Não ficaremos mais discutindo amenidades na igreja. Não precisaremos mais de pessoas que nos digam a cada instante o que está certo ou errado. Não aceitaremos como verdade algo que sabemos que Jesus jamais aceitaria. Encontraremos a verdadeira liberdade. Foi exatamente o que Ele nos prometeu: “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. Não há espaço para uma pessoa que é como Jesus se tornar escrava de homens, esquemas ou instituições. Este é grnade segredo que perdemos no emaranhado de nossas estruturas, modelos e sistemas.
Há uma gigantesca diferença entre ser cristão e ser membro de uma igreja. Você pode ser membro de uma igreja ou de uma instituição religiosa sem ser um cristão de fato. Mas uma vez que você se tornou um cristão verdadeiro, regenerado pelo sangue de Jesus, não fará sentido tentar viver esta nova vida isoladamente do corpo. Este compromisso será tão natural quanto a nossa necessidade de viver em comunidade.
A esta altura, chegamos a um ponto fundamental. Acabo de ler um livro que aponta brilhantemente algumas distorções que tem levado a Igreja ao oposto de sua missão: ao invés de aproximar as pessoas de Deus, ela acaba de alguma colocando-se no lugar de Deus. Muita gente acha que “buscar a Deus “é sinônimo de “ir à igreja”; que “servir a Deus” é o mesmo que “participar de atividades cristãs”; que “viver uma vida de adoração” é “fazer parte da equipe de louvor” e assim por diante. Na verdade, a igreja não é sinônimo da presença de Deus nem tampouco os ajuntamentos do povo de Deus (chamados de “cultos”, “reuniões”, “celebrações” etc) são o único local de encontrar-se com Ele. Pode-se participar de todas as atividades de uma igreja e ao mesmo tempo estar tão longe de Deus quanto se possa imaginar. Tudo isso está correto. Porém, a solução proposta pelo autor, que ecoa o pensamento de milhares de pessoas desapontadas em todo o mundo, derruba por terra todo o excelente cabedal de conceitos que foi construído. A conclusão, aparentemente correta, deixa brechas para interpretações perigosas: “não precisamos de compromisso com uma instituição religiosa”.
A questão que não foi apresentada é que “Igreja” também não é sinônimo de “instituição religiosa”. O conceito bíblico de “Igreja” não envolve nem um templo, um local de culto, nem uma instituição humana, com CNPJ ou registro na Junta Comercial. Não é disso que a Bíblia trata quando se refere a uma igreja. Paulo não fundou denominações. Elas vieram, basicamente, depois da Reforma Protestante, fruto da explosão de interpretações livres, mas ao mesmo tempo particulares e intransigentes, de determinados aspectos das Escrituras, tais como os dons espirituais, formas de batismo, modelos de governo da igreja etc. Paulo trabalha para formar IGREJAS nas cidades por onde passava com sua equipe, isto é um ajuntamento de pessoas que moravam ou conviviam numa mesma região, a fim de que pudessem exercer mutualidade (aquela coisa de “uns aos outros”, “uns para com os outros” etc). Essas pessoas assumiam compromissos de relacionamento, de apoio, de comunhão, de encontro, de companheirismo. Esta dimensão do Cristianismo, tão presente nas cartas apostólicas, não pode ser vivida senão na vinculação do cristão a um corpo local. Se nos afastamos disso e criamos uma aberração, a culpa não é do conceito. É nossa.
É importante observar que a institucionalização da igreja não existe somente por não termos uma sede humana, que controla ou identifica um determinado grupo de igrejas. Tanto é verdade que existem muitos movimentos cristãos que apregoam ser “a melhor e última bolacha do pacote” (como é o caso do chamado Movimento dos Irmãos, ou Irmãos de Plymouth) pelo simples fato de que suas igrejas não têm uma ligação formal com uma sede humana, mas nos quais os mesmos erros de luta pelo poder, de divisões do corpo por causa de assuntos menores, de orgulho e até de ocorrência dos mesmos abusos advindos de manipulações e partidarismo são vistos e legitimados em nome da “preservação da unidade” e da “defesa da sã doutrina”.
Oras, se o problema que leva tanta gente a viver um cristianismo religioso é que perdemos a essência do Cristianismo dentro da Igreja de Cristo, passando a viver nosso barulho interno de maneira que nem ouvimos mais a doce voz do Senhor batendo do lado de fora, como foi o caso da igreja em Laodicéia (Apocalipse 3:20), a solução não é rejeitar a igreja ou torná-la descartável. A Igreja é projeto de Deus. Esta não é uma opinião deste autor. É um ensino claramente exposto pelo próprio Senhor Jesus. É o principal sentido de sua declaração “o que estiver ligado na terra, será ligado no céu; o que estiver desligado na terra será desligado no céu”. Observe o contexto destas palavras. Jesus estava ensinando sobre como tratar de um problema de relacionamento em uma congregação local. Ele conclui dizendo que se o infrator não quiser resolver o problema e resistir à autoridade da igreja, ele deve ser excluído da comunhão do corpo local. Portanto, o assunto no contexto é comunhão, não salvação. E ao concluir, Jesus deixa clara a importância da comunhão com a igreja local. Uma vez desligada a comunhão de um cristão com a igreja local, a comunhão (não a salvação, mas a COMUNHÃO) deste cristão com o céu fica interrompida.
Observe que a “igreja” aqui não pode se referir aos cristãos de qualquer parte do mundo, assim como quando nas cartas apostólicas os autores de referiam aos crentes de um determinado lugar. O conceito de igreja local é claríssimo nas Escrituras. As manifestações locais do corpo de Cristo são estabelecidas para que os membros da Igreja universal que vivem em determinada área convivam. Hebreus 12:22-23 afirma que ainda não chegamos à assembléia universal, isto é, embora passemos a fazer parte dela desde que nos convertemos a Cristo, ela ainda não se juntou num lugar só, como vai acontecer um dia.
Qual seria a razão do Senhor Jesus falar sobre este assunto nesses termos, se fosse verdade que “o importante é estar bem com Deus” e que “ter um vínculo com uma igreja não é necessário”, bastando ao cristão saber que ele pertence ao Corpo de Cristo?
Com a palavra, mais uma vez, os membros do clube “Quem-Precisa-De-Uma-Igreja?”.