Amigos, quanto mais eu vivo, menos entendo o mundo. Quando você pensa que já viu de tudo, você abre o jornal e encontra uma notícia como esta: um camarada esteve preso por oito meses numa penitenciária de São Paulo com identidade de mineiro de Borda da Mata. Quando foram ver, o cara era um mexicano, traficante procurado pela polícia espanhola. Aí eu me pergunto: como é que o homem conseguiu falar português com sotaque de mineiro, uai, sendo mexicano? E ainda por oito meses! Será que algum dia ele pediu pro carcereiro conseguir um PAN DE QUESO para ele tomar no cafezinho da tarde? Você consegue imaginar isso? É surreal, companheiros. Cada dia que passa o ser humano se supera. Consegue ser pior do que o imaginável. E, cá entre nós, eita historinha mal contada essa, hein, sô?
Enquanto tentava deglutir a notícia, acabei pensando que isso não era assim tão difícil. Afinal de contas, às vezes convivemos por tantos anos com uma pessoa, dentro da mesma igreja, às vezes até dentro de casa, achando que ela é uma coisa e, quando vamos para ver, é algo tão diferente, que não é de se surpreender que os guardas todos, delegados e sei lá mais quem teve contato com o tal presidiário, enfim, que todo mundo se enganasse, acreditando mesmo tratar-se de um mineiro DE LA FRONTERA. Um dia a casa caiu, mas até lá longos meses se passaram.
Como são surpreendentes as pessoas! As que não conhecemos bem, que nos parecem à distância tão agradáveis, simpáticas, promissoras, talentosas, solícitas, espirituais, dedicadas, sérias, capacitadas,… (pode continuar preenchendo a lista…) de repente, ao nos aproximarmos para um exame mais detalhado, ainda que desprovido de preconceitos, demonstram-se bastante diferentes. Podem mudar, num passe de mágica, de mineiros em mexicanos. Há pessoas que se tornam experts em fazer os outros de bobos; acham-se espertos, mais sabidos que os outros. Mal sabem eles que estão, na verdade, enganando-se a si mesmos.
Muitas vezes o que os denuncia, como no caso em tela, é o simples abrir de suas bocas. Faz lembrar de Pedro ao redor da fogueira, tentando negar que conhecia Jesus. “O seu modo de falar o denuncia”, disse a criada atenta (Mt 26:73). Este modo de falar, no caso de Pedro e do traficante desmascarado, certamente se referia ao sotaque. Mas há outras nuances do nosso falar que nos denunciam também. Por exemplo, você pode passar uma imagem de bom moço, de homem de Deus, de sujeito dedicado à família, aos bons costumes, à ética. Mas se isto não for verdade, um dia você vai deixar escapar pelo canto dos lábios alguma coisa que demonstre quem você é na essência. Nesse dia o pano vai cair. Alguém vai logo perceber que “o rei está nu”. E a vergonha, a menos que você já a tenha perdido há tempos, será muito grande. A verdade já foi dita por alguém mais brilhante do que eu: você pode enganar muita gente durante muito tempo, mas não vai conseguir enganar todo mundo o tempo inteiro.
É verdadeiramente decepcionante quando você descobre que uma pessoa não é o que você pensava. Traz uma imediata sensação de frustração, um sentimento de traição, uma angústia de morrer. Não é fácil constatar que a gente foi enganado, mesmo depois de tanto tempo. Mas acontece. Pessoas conseguem.
Agora, também tem uma coisa: algumas vezes a gente se engana porque quer. Quem manda a gente ficar julgando pelas aparências? Quem manda a acreditar em tudo o que as pessoas parecem ser? Por que razão fazemos tanta questão de endeusar pessoas que nem conhecemos direito? É ou não é por interesses mesquinhos, por politicagem barata, por provocar ciúmes nos outros que nos rasgamos em elogios e juras de amor por gente que nem sabemos quem é, abrindo mão e descartando sumariamente aqueles que conhecemos e em quem podemos confiar? Então, tem gente que merece levar uma invertida mesmo. Para aprender largar mão de ser besta.