O retorno do gorducho

Amigos, não precisava ser justamente contra o Verdão. Que fosse contra o Treze de Campina Grande, o XV de Jaú, o Batatais ou o Santos. Resumindo, que fosse contra um time pequeno. Mas não foi. Foi contra o Palmeiras e só se fala nisso. No mundo inteiro já se ouviu falar que Ronaldo Gordômetro voltou (de novo). Não sei se podemos dizer que foi em “grande estilo”, mas pelo menos foi mais do que notícia. Talvez esteja se tornando uma superexposição da marca, uma certa saturação. Quem ficou sem moral com esta história foi a minha médica, que quer me convencer a emagrecer 12 kg. Oras, bolas: por que eu teria que emagrecer, se o Ronaldo Bolão daquele tamanho ainda morde R$ 500.000,00 por mês?

Não se discute o talento de Ronaldo. Ele vai sempre figurar entre os melhores do Brasil e consequentemente do mundo. Vencedor, rico, realizado profissionalmente, notícia por onde quer que passe, tudo isso auferido em razão de sua capacidade extraordinária de jogar futebol. A jogada de marketing do Corinthians foi fenomenal, literalmente. O cara vale o quanto pesa. Perdão. Este trocadilho vai soar ironia. Ele vale o quanto ainda joga.

Aí entra em campo uma jogada que não entra em campo: a vida pessoal. Ele já deixou bem claro, em tom irritado, que as suas atitudes fora das quatro linhas não dizem respeito a ninguém. Apesar de ser um atleta profissional, sujeito a certas limitações que a atividade impõe a quem a pratica, ele defende o direito de fazer o que quiser, beber quanto quiser, chegar a hora que quiser, sair com quem quiser, desde que dentro de campo faça o que dele ali se espera: gols. Não me interessa discutir se ele tem razão ou não. Sobre isto, pondero apenas que uma pessoa pública, formadora de opinião, que recebe boa parte de seus rendimentos advindos de uma entidade chamada “direitos de imagem” deveria cuidar mais do que faz em público. Mas esta discussão, pelo menos para mim, é irrelevante.

O interessante é que mais uma vez vem à tona uma diferença extremamente importante, que se dá nas carreiras das estrelas. Trata-se da distinção entre talento e caráter. Em praticamente todos os setores de atividade humana é cobrado pelo menos alguma virtude que se agregue à capacidade. Fica evidente que no caso de atores, desportistas de alto nível e demais celebridades isto simplesmente não se leva em conta. Não é preciso nada além do que a virtuose técnica, a habilidade diferenciada e, em muitos casos, nem isso. Pois se uma pessoa se torna notícia, é entrevistado no rádio, TV, jornais e revistas só por ter participado de uma estupidez consumada como o tal BBB, não preciso dizer mais nada. Se o Ronaldo e todas as outras celebridades dependessem, por menor que fosse o grau, de algum traço de caráter, estariam fadados ao fracasso consumado.

Eu assisti a um renomado palestrante e consultor um dia desses que fazia referência a este fato. Dizia ele que não basta a um diretor ter capacidade administrativa, visão de negócios, dominar as estratégias de mercado, se ele não for “moralmente defensável”. Não era um pastor, um padre ou rabino que estava dizendo isto. Era um consultor corporativo. Já se percebeu que o talento, sozinho, não é suficiente para sustentar uma organização durante os tempos de crise, durante as tempestades e crises. Todo mundo sabe que o talentoso que não tem caráter pode dar lucro por um tempo, mas um dia a casa cai. Se o diretor premiado e vitorioso na vida empresarial não vê dificuldade em trair a mulher com a secretária, nada garante que ele não vai fazer o mesmo com os sócios, assim que tiver uma oportunidade. O empresário que incentiva seus vendedores a pagar propina para os compradores não deve se surpreender quando ficar sabendo que seus fornecedores fazem o mesmo com seus próprios funcionários. Talento sem caráter é como um muro sem alicerce: qualquer vento mais forte derruba fácil. Mas até mesmo nas empresas dá-se um jeito e se aceita a coisa assim mesmo. O importante são os três pontos ou o balanço positivo no final do exercício.

A única organização do mundo que ainda continua exigindo a presença deste binômio perfeito é a igreja de Jesus. Aqui, não há espaço para gente que faz mas não é. Ninguém aplaude um cristão somente por suas realizações e serviços prestados. Não se “paparica” um sujeito que não vale nada porque “não tem ninguém com a capacidade de fazer o que ele faz entre nós”. Não se passa mão na cabeça de um grande músico que engravidou a namorada ou que arrumou outra mulher, não se joga para debaixo do tapete a conduta antiética, imoral ou ilegal do mantenedor principal da igreja. Aqui, talento sozinho não vale nada, se não for acompanhado por um caráter compatível, que se revela em um comportamento ilibado.

Será mesmo?