Amigos, impressionante a nossa tendência a querer explicar o inexplicável, a ponderar o imponderável, a resolver os mistérios do universo, a discutir a solução para os problemas do Uzbequistão, a tentar encontrar uma resposta para o segredo de Tostines. Parece que todo mundo tem uma vocação impressionantemente bem afiada para resolver as questões que não lhe dizem respeito. Somos chamados a uma espécie de discussão etérea, distante da nossa realidade. Gostamos de discutir assuntos que não tenham a ver conosco.
Apreciamos também arrumar soluções para aquilo que não podemos controlar. Somos hábeis, por exemplo, para educar os filhos do vizinho, para dizer como as coisas deveriam andar na igreja do vizinho, na empresa do vizinho. É uma tendência natural do ser humano.
A explicação para este comportamento me parece bastante óbvia. É mais fácil, apesar de contraditório e hipócrita, rir e criticar o cisco no olho do outro, enquanto a gente carrega um galho inteiro no nosso próprio olho. Nem é o caso de que não haja nada no olho do outro. Jesus disse que primeiro a gente limpa o nosso olho e depois vai ajudar o outro a limpar o seu. Já viu gente que saiu da igreja porque diz “não agüentar mais tanta gente hipócrita” ou “não suportar mais tantas brigas” ou fazer um tanto de outras críticas? A pergunta que fica é esta: se eles são tão bons a ponto de nem suportar mais os erros, se enxergam tão bem os problemas, por que será que não fazem nada para ajudar a corrigi-los? Em geral, são pessoas que não tem nem nunca tiveram o menor envolvimento com nada, não querem compromisso com nada e usam essas frases como desculpas para justificar sua vidinha medíocre. É como o caso daqueles que criticam as atitudes, decisões e orientações do gerente, mas não estão dispostos sequer a fazer o relatório de suas próprias atividades. O sujeito chega atrasado todo dia, não cumpre suas metas, mas tem a solução para todos os problemas da empresa. Dá para levar a sério?
Seria bom aprendermos a fazer a nossa parte. Isto quer dizer eliminar as falhas naquilo que está debaixo da nossa responsabilidade. Se cada um limpar a sua própria calçada, a rua vai ficar limpa. Cada um fazendo a sua parte em um relacionamento, vai eliminar 50% dos riscos de situações de conflito. É mais ou menos a idéia da “Regra de Ouro” que Jesus enunciou no Sermão do Monte: “Tudo, pois, que quereis que os homens vos façam, assim fazei-o vós também a eles”. Cada um fazendo a sua parte em um projeto, vai aumentar em muito a chance de que este projeto termine no prazo e com sucesso. Cada um fazendo a sua parte na igreja, vai haver crescimento equilibrado e sadio.
A verdade é que à medida que se vive, vai-se descobrindo que a vida é mais fácil do que imaginamos. Não podemos controlar o que as outras pessoas sentem, como elas reagem, como elas agem. Mas podemos controlar como nós sentimos, reagimos e agimos. Aí está um precioso segredo. Preocuparmos mais conosco mesmos e deixar que cada um faça o seu. Eu não posso amarrar a minha vida por causa da imaturidade do outro. Não posso estagnar minha carreira, meu ministério, o propósito da minha vida, porque alguém decide estagnar a sua. Infelizmente, muita gente vai ficar para trás. Daqui a 50 anos eles vão estar no mesmo lugar, discutindo as mesmas coisas, lutando com os mesmos problemas mesquinhos, brigando pelo mesmo osso.
Eu não preciso fazer parte disso. Porque eu posso fazer a minha parte. Não preciso viver tentando justificar meus erros e fracassos em função do que os outros fazem ou deixam de fazer. Ainda que os outros sejam uma igreja, um pastor, pai ou mãe, amigos íntimos ou confidentes. Mesmo que eles conspirem contra minha vida, contra o meu caráter, contra o meu ensino, contra o meu estilo. Eles não precisam determinar o que eu vou realizar na obra de Deus, a menos que eu assim o permita. Você vai encontrar ao longo da sua caminhada uma porção de gente que tem uma lista pronta e apimentada daquilo que você faz de errado. Pegue a lista, leia, analise diante de Deus. Se tiver alguma coisa que seja verdade e que precisa ser corrigida, pare e resolva. Se não tiver, vá em frente. Apenas se lembre de que muitas vezes nós fazemos a mesma coisa com os outros. Como alguém já disse, somos juizes implacáveis com o erro alheio, mas somos advogados compassivos com os nossos próprios.
Quando passei a entender isso, tirei um peso imenso das minhas costas. Percebi qual inútil é perder tempo com aquilo que os outros estão fazendo, dizendo, inventando, publicando, costurando enquanto você dorme. Eis aí um exemplo daquilo que não podemos controlar. Se eu começar a listar nesta coluna as coisas que já fiquei sabendo a meu respeito e que rolam na chamada “boca do povo”, o espaço seria curto. Se eu fosse responder a cada insinuação feita, a cada calúnia plantada, a cada fofoca espalhada, eu não faria outra coisa na vida. Resolvi ignorar isso tudo e me concentrar em fazer a minha parte. Nunca poderia ter tomado uma decisão melhor.
Afinal de contas, não sou dono de nada. Não morri pela igreja. Não foi meu o sangue derramado para comprá-la. Ela não é a minha Noiva. Eu continuo amando a igreja e pedindo a Deus que nunca me deixe perder a paixão por ela. Não há nada que eu queira fazer mais na vida do que trabalhar em prol da expansão do Reino de Deus neste mundo. Mas consciente de que o Reino é de Deus. Eu faço apenas a minha parte.
Já vivi, confesso, alimentado pela expectativa de que as coisas poderiam ser diferentes. Que as estruturas poderiam mudar. Que a visão pudesse ser ampliada. Já lutei por isso, com muito vigor. E não me arrependo por um só minuto dos projetos e empreitadas com os quais me envolvi para que isso se tornasse realidade na minha geração. Não digo que não consegui nem que desisti.Apenas mudei a perspectiva. É que, antes, se nada disso acontecesse, tudo para mim teria sido em vão. Quando no meio do caminho, sonhos ruíram, eu achava que tinha sido um fracasso, que não tinha valido a pena. Questionei se valia a pena tentar outra vez.
Hoje, não penso mais assim. Porque meu sucesso não depende daquilo que as pessoas fazem, mas daquilo que eu faço. Depende de permanecer fiel ao chamado que Deus me deu, à vocação que ele me fez. Usando o mote, depende de fazer a minha parte.
Talvez um dia, fazendo a minha parte, eu descubra que fiz muito mais do que podia imaginar nos primeiros sonhos.