Amigos, ele vem chegando de novo. Sorrateiro, matuto, silencioso. Não sei quem o inventou, mas ele veio para ficar. Quem nunca ficou com cara de bobo quando ele passou? Quem não se deixou enredar pela licenciosidade que ele provoca? Por que não deixar que o folclore em torno dele se mantenha?
Lembro-me quando, ainda um pré-adolescente, recebi o telefonema assustado de uma amiga da igreja. Seu pai precisava entregar um pacote urgente e estava com o carro quebrado numa determinada rua e esquina. Peguei minha bicicleta e, solícito, corri ao local. Ledo engano: 1º de abril.
Não vou mentir. Já escrevi sobre o tema. Foi em 2004. Não houve comentários. Acho que na época não havia este recurso em Colunet. Eu citei os dias do profeta Isaías nos quais a verdade sumiu, andava tropeçando pelas ruas (Isaías 59:14-15). É um texto extremamente atual, esse de Isaías.
Pais mentem para os filhos (“Não vai doer nada!”); filhos mentem para os pais (“Preciso do carro para levar a tia da Fabiana no médico”). Presbíteros mentem para os membros (“Não confie no Bastião, ele fala mal de você quando você não está”), membros mentem para os pastores (“Não tenho ido de domingo de manhã porque estou trabalhando demais”). Funcionários mentem para os superiores (“Cheguei atrasado porque o ônibus quebrou”), superiores mentem para os funcionários (“Não posso dar aumento porque o faturamento caiu muito”). Gerentes de banco mentem para os correntistas (“Essa aplicação rende muito mais do que a renda fixa”), correntistas mentem para o gerente (“Pode pagar o cheque que eu deposito hoje até às 2 da tarde”). Vendedores mentem para os compradores (“O caminhão quebrou novamente”), compradores mentem para os vendedores (“Seu concorrente está com o preço 30% menor”).
E assim vamos vivendo, de mentira em mentira, até que todo mundo passa a acreditar e a mentira vira verdade. Uma verdade mentirosa. Ou uma mentira verdadeira. O Kazuza cantava que “mentiras sinceras me interessam”. Quais são as mentiras sinceras? Para falar a verdade, não conheço. Conheço mentiras perversas, mentiras devastadoras, mentiras sem-vergonha, mentiras cafajestes. Mentiras sinceras, não.
Enfim, o dia da mentira pode nos ensinar muito sobre o dia da verdade. Exemplos:
- Assuma o desafio de falar a verdade. Sem exagerar nem diminuir. Sem omitir nem acrescentar. Somente a verdade. O sim ou o não. O que passar disso vem do maligno. E, diria Jesus, “ele nada tem em mim”.
- Não acredite em tudo o que você ouve. Em especial aquilo que você ouve sobre a vida alheia. É impressionante como as pessoas se surpreendem quando passam a ouvir o outro lado, aquele omitido ou distorcido pela mentirosa língua maledicente. Muita coisa que era mentira virou verdade só porque a gente acreditou nela. Nunca forme opinião sobre qualquer pessoa baseado somente no que as pessoas dizem. Interesses falam mais alto e a mentira corre solta quando se trata de defendê-los.
- Não passe para frente aquilo que sabe ser mentira ou que não sabe se é verdade. Em dias de internet, o que se espalha de mentira sobre as coisas e as pessoas, é uma festa. Maldito seja o Orkut! Via de regra, ando deletando tudo que é mensagem com Power Point de musiquinha. O que tem de texto apócrifo, de gente que nunca teria escrito aquilo, mas que se vê assinando textos de imbecis e vagabundos que não têm o que fazer é cada vez mais comum. Como eu não tenho tempo de checar tudo o que recebo para saber se procede ou não, jogo fora de cara. Faça o mesmo. Você deixa a rede mais limpa e a mente mais livre de bobagens.
- Não engula o que uma pessoa diz só porque ela é pastor ou líder. Alguns deles também mentem descaradamente. Mentirosos precisam ter boa memória, mas alguns são tão amadores que mentem e depois esquecem do que mentiram. E acham que todo mundo é tão trouxa como eles e se esquece também. O pai dessa amiga que me pregou a peça de 1º de abril era um presbítero. Eu mesmo ouvi quando, para livrá-la de uma enrascada, ele lhe deu o seguinte conselho: “Você vai ter que mentir. Tem horas que não tem jeito: tem que mentir!” Se um pai e presbítero pensa assim, o que não pensarão os outros…
- Mentir e coçar é só começar. Se a gente começa, fica difícil parar. Diz o ditado que não é difícil contar uma mentira. O difícil é contar uma só. Mentira atrai mentira. Ela vira algo tão natural que passamos a conviver com ela de maneira despreocupada. Tem gente que mente mesmo quando não precisa. É um vício.
- A coisa mais difícil de se conquistar na vida é a credibilidade. Quando as pessoas descobrem que a gente costumava mentir, dificilmente recuperamos o respeito delas. Quem vai acreditar em nós, se tudo o que a gente diz precisa ser verificado?
- Ser mentiroso não é chique. É ridículo. Especialmente quando as pessoas descobrem nossa mentira e a gente fica com cara de tacho. Mesmo aqueles que já perderam a vergonha na cara são ridicularizados pelas mentiras que contam. Alguns não aprendem e continuam do mesmo jeito.
- Quando você engana os outros, mesmo que tenha sucesso na empreitada, no fim das contas você está enganando a si mesmo. Você se safa do incômodo da situação, limpa a sua barra e o nome da sua família. E sai dando risada, achando que fez os outros de bobo. Na verdade, o maior bobo é você mesmo. Às vezes aquela era a grande chance que a vida lhe estava oferecendo para você deixar de ser besta.
E se nós decidíssemos ter o dia da verdade? Mas não de qualquer verdade. Da verdade segundo Deus, que é a verdade em amor. Verdade não pode vir sozinha. Tem que ser com amor. O amor é o tempero da verdade. Amor sem verdade é covardia. Verdade sem amor é grosseria. Precisamos de amor e verdade, juntos. Se bem que é melhor uma verdade amarga do que uma doce mentira.
Não é verdade?