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Quando chega a hora de partir (1)
Quando chega a hora de partir (2)
Amigos, nem sempre a gente considera sair de uma igreja por causa de problemas. Às vezes você precisa mudar de cidade para estudar, trabalhar, casar ou outro evento inerente à condição instável da vida humana. Se a empresa resolve transferi-lo para Cingapura, nem sempre há muito que se discutir. Se nossa vida é dirigida por Deus, vamos encarar estes fatos com naturalidade.
Portanto, às vezes a decisão de sair nos cabe e às vezes simplesmente precisamos sair, por motivos alheios à nossa vontade. Então vem a segunda fase. Para onde ir agora?
É muito fácil responder com o chavão: “vá para onde Deus mandar”. Embora corretíssima sob o ponto de vista teológico, nem sempre esta frase ajuda muito. É óbvio que o cristão comprometido com Deus quer andar no centro da Sua vontade, mas a questão não é essa. A questão é: como eu vou saber que estou fazendo a vontade de Deus? Como saber se não estou seguindo meu coração, meu enganoso coração?
A Bíblia não tem uma resposta pronta para esta dúvida. Porém, encontramos princípios que devem ser seguidos. Não vivemos mais nos primeiros tempos, em que ser cristão ou reunir-se numa igreja cristã era algo definido sem muita dificuldade. Não havia a enxurrada de denominações, interpretações, visões e ministérios como há hoje. Chegando em Corinto, era só procurar “a igreja de Deus que está em Corinto”. Pronto. Hoje, infelizmente, vivemos uma outra época.
O interessante é que cada igreja se acha “a” igreja de Deus em determinado lugar. Todo mundo se acha e se oferece como a melhor opção. Uns porque não têm denominação. Outros, exatamente pelo motivo contrário. Uns porque se consideram detentores de uma revelação especial e única. Afinal, se ele é um “Apóstolo” que recebe uma visão de Deus, quem sou eu para discutir com ele? Outros vão pelas estatísticas. Tantos milhões de batistas não podem estar errados. E assim vai. No meio desse fogo cruzado, você precisa apenas escolher um lugar para se reunir e viver sua vida cristã em comunidade. E fica na dúvida, com toda razão.
Além dos princípios do Novo Testamento para se testar a autenticidade de uma igreja sob o crivo do Cristianismo autêntico, princípios esses que não vou expor aqui, pressupondo que você os conheça, atrevo-me a dar algumas sugestões práticas na hora de definir um lugar adequado onde passar o tempo que vem pela frente, até que Deus indique outra coisa. Elas não vêm em ordem de importância. À medida que fui catalogando, fui escrevendo.
- Partindo do pressuposto de que eu sei que não existe igreja perfeita, será que eu creio pelo menos que podem existir igrejas maduras e sadias que sirvam de opções viáveis, ou eu penso que nunca mais vou achar uma igreja como a minha?
- Estou disposto a encontrar esta boa opção, considerando seriamente se eventualmente eu me acharei em uma delas? Afinal, não quero me tornar um “sem-igreja”.
- Estaria disposto a aceitar as diferenças em uma outra igreja local (o que certamente vai haver) sem me lançar num “pular de galho em galho”? Essas diferenças podem ser assimiladas ou são absolutamente irreconciliáveis com princípios fundamentais da Bíblia?
- Estou bem consciente de que preciso ser membro de uma igreja, com tudo o que isso represente de privilégios e responsabilidades?
- Esta igreja-opção centra seu ensino na Palavra de Deus ou é mais adepta de cada moda nova que vem e que vai? Ali serei uma ovelha a ser cuidada ou mais um número para pagar a conta dos projetos pessoais (às vezes megalomaníacos) de seus líderes?
- Esta igreja é preocupada e envolvida diretamente com a obra missionária, mesmo quando isso não traga benefícios diretos para a comunidade local? Missões é um assunto encarado de que maneira?
- No que diz respeito à santidade de seus membros, nesta igreja pode tudo, é proibido proibir ou é uma igreja que segue suas próprias regras de conduta e prática, mesmo que a Bíblia não dê apoio a tais procedimentos?
- Como é o ambiente nessa igreja? As pessoas tratam-se com respeito? Os problemas de relacionamento são tratados pela liderança? A maledicência é condenada de púlpito e no dia-a-dia? Existem preferências, levando em conta posição social, cultural etc?
- Qual a opinião que as pessoas de fora têm a respeito dessa igreja?
- Qual a opinião dos próprios membros da igreja sobre ela?
- Como é a liderança dessa igreja? Está tudo centralizado na mão de uma pessoa só? É uma igreja familiar, daquelas que têm famílias quatrocentonas orbitando em volta da liderança?
Creio que estes são aspectos importantes, que não podem faltar na balança. Não basta saber o que a igreja escreve na sua declaração de fé ou nos seus estatutos. No papel a gente pode colocar qualquer coisa. Muita coisa linda que se escreve na prática não tem nada, mas absolutamente nada a ver. É o mesmo que comprar um carro usado olhando o manual do fabricante. Quando foi feito, tudo era ótimo e funcionava. Alguns anos depois, precisa examinar com mais cuidado.
Aprendi uma coisa na vida: não é tão importante onde se está, mas como se está. Como diz o filósofo, pastor e conferencista, “a felicidade não é um lugar onde se chega, mas é como se vai”. Não adianta criar amarras. Raízes, sim. Porque raízes nutrem, fortalecem, mantém de pé. Amarras, não. Não é para ficar preso a esta ou aquela cor, a esta ou aquela tradição. Isso é o de menos. No fim das contas, o que vale é o que se faz, o que se realiza, o que se deixa. O que vale é como marcamos as pessoas pelas quais passamos na vida. Picuinhas pseudo-doutrinárias não têm peso.
E por isso, não posso imaginar que exista somente um lugar no planeta onde eu possa exercer meus dons, desenvolver meu ministério, ser edificado pela mutualidade, crescer na graça e no conhecimento, ser nutrido pela Palavra de Deus, liderado por gente séria, incentivado na minha caminhada, erguido quando cair, apoiado quando precisar, acompanhado até morrer. Tem que haver mais de uma opção.
Sabendo disto, quando chegar a hora de partir, posso partir na paz.
Sem crises, sem grilos.
Pensando bem:
Raízes, sim. Cadeias, jamais.