Como funcionamos

Com tantos artigos, livros e textos escritos sobre Imago Dei; com tantos teólogos, doutores e pastores falando sobre o assunto, sinto receio, medo e vergonha de ousar escrever algo sobre este tema. Refleti durante um bom tempo antes de escrever qualquer artigo, pois tenho buscado qual a minha verdadeira motivação para isso. Inúmeras vezes me peguei querendo escrever artigos e livros para ensinar aos outros coisas que meu ego insiste em dizer que só eu sei, outras vezes o que me impulsionava era a vontade de criticar teologias e ideologias que não estão de acordo com o que penso e vivo. Hoje resolvi escrever, pois, o único motivo que encontro dentro de mim é louvar a Deus pelo modo que Ele tem transformado minha vida, e minha gratidão me faz compartilhar um pouquinho do que tenho aprendido com meus irmãos. Se Deus usa até um jumento para falar com homens, creio que existe a possibilidade dEle me usar também.

Imago Dei, vem do grego e quer dizer “Imagem de Deus”. Este termo é utilizado na teologia Cristã referindo-se à criação do homem, o qual – como a Bíblia diz no livro de Gênesis – foi criado à imagem e semelhança de Deus. Muito poderia ser dito sobre Imago Dei, entretanto, a intenção deste artigo é abordar seu significado prático, cuja compreensão nos leva por um caminho de descobertas que moldam o nosso caráter.

Ser a imagem e semelhança de Deus pode querer dizer muito para uns e nada para outros. Cresci ouvindo que fomos assim feitos, porém isso nunca me trouxe nenhuma lição prática. Eram apenas palavras bonitas que os pastores diziam e que eu lia e relia na Bíblia. Talvez porque poucos saibam os efeitos de sermos feitos à imagem de Deus, ou, talvez porque eu nunca tenha entendido o que todos já entendem. Porém, nem um motivo, nem outro, cessaria minha sede de compartilhar a maneira simples e rasa que compreendo a profundidade dos mistérios de Deus.

Após anos freqüentando igrejas e lendo a Bíblia, nunca tinha parado para pensar que se somos a “imagem e semelhança de Deus”, significa que funcionamos como Ele. Esta idéia é absurda se você não encontra fortes argumentos para defendê-la. “Como assim eu funciono igual a Deus?” – você pode perguntar. A primeira vez que isto me veio à mente senti um cheiro de heresia. Entretanto a Bíblia começou a se encaixar na minha mente como peças de um quebra-cabeça e parece que de repente eu percebi – “Ah! É isso que Deus queria dizer”. Convido-o, portanto, a uma análise sem preconceitos, que deixe de lado todos os “achismos” e opiniões pessoais, e que esteja disposta a enxergar o que, de fato, a Bíblia diz.

Observe as comparações que a Bíblia faz em diversos versículos ao longo de seus livros: “Ame a teu próximo como eu vos amei” (Jo 13:34), “Portanto, sejam perfeitos como perfeito é o Pai celestial de vocês.” (Mt 5:48) e “Sejam santos, porque eu sou santo” (Lv 11:44, 1Pe 1:16). Outros versículos tratam de conceitos semelhantes, dizendo que Deus trata a humanidade como um único organismo; vê a igreja como um corpo; diz para sermos um, assim como Cristo é com o Pai; diz para dominarmos sobre a terra, assim como Ele domina sobre todas as coisas; diz para deixarmos nosso eu e nos doarmos uns aos outros, assim como Jesus se desfez de sua divindade para tornar-se homem e morrer por nós, além de outros conceitos e ensinamentos sobre como devemos ser, pois assim Deus o é.

Essas passagens bíblicas demonstram claramente que fomos criados para ser como o Pai. Nossa vida deve refletir o caráter dEle. Esse foi seu propósito quando nos criou. Entretanto, juntamente com a criação, veio a possibilidade da escolha. Por isso há tanta distorção. O problema é que todos os caminhos fora desse propósito culminam na frustração. Se eu crio um automóvel para me locomover, não adianta eu querer fazer bolo com ele. Se eu crio uma banheira para tomar banho, não adianta eu querer cozinhar nela. Se crio um avião para voar, não adianta eu querer descer no mais profundo oceano a bordo deste avião. Da mesma forma, se Deus nos criou à Sua imagem e semelhança, significa que eu só cumpro o meu papel de ser humano quando sou como Ele, como o Filho primogênito, como Cristo. Este é o propósito da vida Cristã: voltar ao plano original da criação, voltar a ser como era o ser humano que Deus tinha em mente quando nos criou. Quer saber qual era o plano de Deus quando nos criou? Olhe para Jesus, Ele é o plano original, Ele é o que deveríamos ser se não tivéssemos caído. Não me sentirei gente enquanto não for gente como Jesus é. Não sentirei o verdadeiro prazer da vida enquanto não viver como Deus planejou que eu vivesse.

Sou a imagem e semelhança de Deus. Por isso, para me sentir realizado, devo voltar ao plano original e buscar ser como Ele. Devo ser um com meus irmãos, devo negar a mim mesmo. Não no sentido de esquecer meus sonhos e minha vida, mas sim no sentido de que o meu querer não pode prevalecer diante do querer de Deus. Deus não quer que você deixe de aproveitar sua vida e lutar pelos seus sonhos, mas Ele quer que, ao lutar pelos seus sonhos e ao aproveitar sua vida, você ame, respeite, crie, alegre-se, chore, deseje, sinta, comunique-se, pense e viva como Ele. Por isso tudo o que fizermos devemos fazer para Deus, pois o fazer para Deus é a união do homem com o Pai. Os atributos de Deus manifestados em nós são essencialmente bons, porém só serão verdadeiramente bons se forem feitos para Deus. Amor é um atributo divino manifestado em nós, mas você pode amar a Deus ou amar a imoralidade sexual. A capacidade de criar é um atributo divino, mas você pode criar uma música ou uma bomba atômica. A alegria é um atributo divino, mas você pode alegrar-se com o meu sucesso ou com o meu fracasso. Tudo que fizermos para Deus nos unirá em um único propósito de vida: seremos um, assim como Deus é três pessoas que são um em comunidade.

Estive aproximadamente quinze anos da minha vida num alto grau de depressão. Desses quinze anos, pelo menos dois eu pensava em me matar todos os dias. Vejo que toda a humanidade está infectada pelo mesmo sentimento que sempre tive e percebo hoje que nosso grande problema é que ficamos tão envolvidos com os fatos que acontecem em nossas vidas, que nos esquecemos de nos conhecer. Em nossa infinita ignorância pensamos que porque somos nós mesmos, (nós) nos conhecemos.

Talvez este seja um bom argumento para defender a idéia da existência de um Deus criador de todas as coisas. Se não me conheço, significa que mesmo sendo eu, existe algo que me acompanha desde o meu nascimento e foi determinado por alguém antes mesmo de eu nascer. Pois se mesmo vivendo comigo desde o meu nascimento ainda existe a possibilidade de eu não me conhecer, significa que existe algo além. Este algo é meu propósito de vida, que não implica em vocações, talentos e planos especiais de Deus para mim, mas sim a maneira que eu funciono. O pai da psicanálise, Freud – que era ateu de carteirinha – percebeu que existe este algo; percebeu que precisamos nos conhecer, porém não percebeu Deus em tudo que lhe foi revelado.

Meu conselho para quem está questionando os propósitos de nossa existência ou em qualquer outra crise é: conheça a Deus em sua essência. Deus é muito mais do que pregam. Deus é muito mais do que a instituição igreja. Deus é muito mais do que um velhinho de barba branca que pensamos estar em todo lugar nos vigiando. Busque-o em essência, em espírito e em verdade. Conhecendo a Deus você entenderá melhor como você funciona, entenderá sua essência, entenderá o que está fazendo nesta vida. Conhecendo a Deus, você conhecerá a si mesmo.

Atrevo-me a deixar um suposto mandamento de Deus para nós: “Conheça a si mesmo, assim como Eu os conheço”.

Que a graça e a paz do nosso Senhor Jesus estejam com vocês.