Existem alguns assuntos delicados de se tratar, principalmente no cinema. São assuntos que já geram um bom tempo de discussão acalorada numa roda de amigos e deixam pessoas chateadas dependendo do rumo da prosa, mas que de vez em quando precisam vir à tona para que todos tenhamos uma opinião sobre eles.
A questão do racismo é complexa e sua abordagem pode soar agressiva em primeira instância, mas é analisada com um realismo e coragem impressionantes, somando mais pontos a Crash – No Limite, seja junto aos negros estadunidenses, como os latinos ou árabes – principalmente após os fatos acontecidos após 11 de setembro de 2001. O preconceito acaba sendo um tema incessantemente abordado durante toda a película, que marca a estréia na direção do canadense Paul Haggis, roteirista do premiado Menina de Ouro (2004).
Haggis trabalha com esperteza a insegurança e o olhar superficial que se tem ao viver em uma metrópole como Los Angeles. A história, escrita pelo diretor em parceria com Bobby Moresco, não mostra um retrato ingênuo da realidade. Não há culpados, nem vítimas: todos estão à mercê do medo e da imprevisibilidade. O cineasta usa a superficialidade das relações na era moderna para despejar vários personagens em busca de sentidos e emoções, nem que para isso seja preciso um pequeno esbarrão no trânsito.
A narrativa começa em um desses acidentes de trânsito. A partir daí, são mostradas as 36 horas que antecedem o momento da tragédia. Entram no contexto do enredo vários núcleos recheados de atores de nome como Sandra Bullock, Brandan Fraser, Don Cheadle, Ryan Phillippe e Matt Dillon. Não são apresentados protagonistas. Todos os personagens são obrigados a integrar e interpretar o balaio da discórdia. Suas histórias são entrelaçadas em uma montagem flexível e empolgante que nos faz odiar quase todo mundo.
“Crash” não é o filme definitivo nem irá provocar uma profunda reflexão sobre o assunto. Sua intenção é ser um retrato verdadeiro de uma sociedade que se vende como moderna, mas que, ao mesmo tempo, se revela arcaica ao não conseguir resolver um dos problemas mais graves da convivência humana.