Munique

Às vezes parece que existem dois Stevens Spielbergs: um eminentemente comercial que sabe como ganhar dinheiro fazendo eficientes blockbusters; e outro sério e politizado, com densas mensagens para passar ao público. O “primeiro” Spielberg é o diretor de E.T. – O Extraterrestre, Parque dos Dinossauros, Guerra dos Mundos e vários outros. E o “segundo” dirigiu A Cor Púrpura, A Lista de Schindler e, agora, Munique. Para apreciar a produção em toda a sua intensidade, é bom esquecer o “outro” Spielberg de “Guerra dos Mundos”.

Com poucas concessões comerciais, Munique é o envolvente relato da vingança que a primeira ministra de Israel, Golda Meir (Lynn Cohen), teria autorizado contra 11 lideres palestinos, logo após o massacre ocorrido nos Jogos Olímpicos de 1972, onde 11 atletas israelenses foram mortos por terroristas. Vale lembrar: o argumento do filme não é de Spielberg, e sim do escritor George Jonas em seu livro Vengeance: The True Story of an Israeli Counter-Terrorist Team. Mesmo assim, o cineasta tem sido duramente criticado por parte da comunidade judaica em todo o mundo, após a estréia do filme nos EUA, ocorrida em dezembro passado. Muitos não gostaram de ver na tela do cinema Israel se utilizando dos mesmos métodos terroristas que sempre foram tão criticados, quando usados por palestinos. Outros protestaram argumentando que a palavra “Vingança” (título do livro) seria inadequada para a ação empreendida por Golda. Quando o assunto é árabes contra judeus – e vice-versa – os ânimos sempre se exaltam.

De qualquer maneira, é um filmaço! Denso, muitas vezes difícil, sem pretensões comerciais (tem sido um fracasso nas bilheterias estadunidenses, como não seria difícil de prever) e extremamente corajoso. Spielberg – como um notório e militante representante da comunidade judaica – ousou permanecer neutro em Munique. Não puxa a sardinha para a brasa de Israel, tampouco crucifica os terroristas, muito menos glorifica a violência. Antes de mais nada (e de ninguém), o filme prega a paz.

Steven Spielberg poderia ter optado por uma estética cinematograficamente glamourosa, no estilo de 007 ou A Identidade Bourne. Mas não: sabiamente, ele optou por uma fotografia escura (que lembra muito a fotografia dos anos 70, ápoca em que é vivido o filme), por um clima sombrio e por uma narrativa sólida na contra-mão do puro e simples entretenimento. Nem poderia ser diferente, já que o personagem principal, quanto mais se dedica à sua missão, mais se desencanta e se desespera ao tomar contato com a gigantesca sujeira que rege todo o “business” da espionagem. Avner (Eric Bana, do “Terrível” Hulk) percebe que no fundo a luta não é mais entre palestinos e israelenses, mas sim entre quem tem muito dinheiro e quem tem muito mais dinheiro. Líderes políticos são apenas mercadorias com dois preços: quanto eles valem mortos, e quanto eles valem vivos. Enquanto os povos sofrem, os poderosos manipulam.

Esqueça a figura heróica do espião rodeado de belas mulheres e carrões possantes. Em Munique, os conflitos só causam dor e pânico. Para palestinos e para judeus. Assim como na vida.

Spielberg nos deixa tirar nossas próprias conclusões, e a conclusão a que cheguei é que não existe lado bom, não tem por quem torcer e só resta uma esperança: aguardar o reino milenar de Cristo quando Ele ensinará ao mundo como se governa.

Um alerta

“Munique” é um filme EXTREMAMENTE forte e violento. Depois não venham me falar que eu não avisei.