O sofá é um móvel muito interessante, confortável, adornado e aconchegante. Nada melhor do que o sofá da nossa casa depois de um dia de trabalho… você tira os sapatos e se joga… envolvidos nas almofadas, numa posição fetal, suspiramos “que isso dure para sempre”. A hora do sofá é sagrada. E foi num destes momentos da vida que algo muito interessante aconteceu. O telefone tocou tão alto que dei um pulo olímpico para atendê-lo, mas não contava com a astúcia de uma quina que se colocou na minha frente, acertando em cheio meu dedinho. Que dor insuportável Gritei, me encolhi, pulei, parecia uma dança indígena ou algo assim, mas o fato era inegável. Aquele móvel que me dava tanto conforto tinha uma quina, uma pedra, algo que me fez parar.
Não pense que minha historia é ridícula, ou nada inspirativa. Ela é uma metáfora da nossa caminhada com Cristo. Observe: você chega sobrecarregado, cansado, cheio de pecados, e Jesus o recebe, cuida de você, dá-lhe alívio e proteção, então você fica largadão nos braços de Jesus, quando de repente, algo o desperta e você entende que pode fazer alguma coisa. Não é só descansar, é trabalhar, é conquistar, viver com Cristo, é amadurecer, e quando se levanta… BUM! Arrebenta o dedinho na quina do cristianismo na chamada “lei”. Alguns lugares chamam de doutrina, mas seja o que for não deixa de ser a quina, algo dolorido. Antes de fazer careta e me julgar como apologista de doutrinas, me deixe explicar: Essa quina que me refiro em vez de me aproximar de Deus acaba se tornando um grande instrumento hipócrita que nivela as pessoas por ações programadas e não por devoção contínua (paixão, AMOR), “A letra mata, mas o Espírito vivifica”, disse Paulo.
Com isso vemos pessoas sendo atropeladas por um rolo compressor que torna seu amor por Cristo insignificante perto das exigências a serem cumpridas, sentam-se no banco o divorciado e o diácono. Um com o coração quebrantado, arrependido, ansiando restauração. Outro tem conhecimentos bíblicos de dar inveja, trata a esposa com descaso, é ausente com os filhos (a obra consome tempo). Qual está mais apto a tomar a Santa Ceia do Senhor? Trombamos na quina, tropeçamos nela, tornamos impuro o que Deus purificou, somos cobrados a demonstrar nosso amor com certificados e roupas. Será que foi isso que Jesus quis ensinar? Será que no céu o anjo do portão irá dizer:
– Preciso checar sua documentação! Certificado de batismo? Hum…. ok! Concluiu a escola dominical? Hum… ok! Comprimento da saia… Hummmm! Fez teologia?
Se isso acontece, o que respondeu o ladrão da cruz? Como dói essa quina!
Presenciei um fato que me enojou, me fez repensar minhas práticas cristãs. No dia da formatura da pré-escola, preparei um evento lindo, uma cantata da criação do mundo, fiz tudo para agradar a Deus e uma forma de evangelizar, já que o colégio não é cristão, quando de repente aparece um pai de aluno, segurando na mão de um garotinho com os olhos cheios de lágrimas e me disse “Ele não vai participar, porque sua fantasia é de anjo e eu sou evangélico e sei que isso não é Deus, é simbologia!”. Eu respondi “Mas pai, o senhor até comprou a fantasia dele… como não sabia que seria um anjo? Além disso eu também sou evangélica, não tem simbolismo nenhum!”. Não teve conversa, ele deixou seu filho chorar durante todo o evento, por pura doutrina, por causa de uma quina. Olhei pro garotinho e pensei… que Deus ele está conhecendo? O Deus que não entende o que ele sente. Sem contar os rumores de que “os evangélicos” são preconceituosos e tal.
Detesto legalismo, não suporto ver as coisas de Deus sistematizadas, como quando o perdão valia o preço de uma pomba. Hipocrisia! O perdão requeriu o sofrimento de Cristo e isto é a comprovação real! Chega de doutrinas que nos tornam religiosos, chega de provar nossa devoção com rituais e costumes que não provam nada. Melhor é negar o ego (Ahhhhhhhh, isso não vira doutrina!). Se me batizo é porque amo a Jesus e não me importo em expor isso, não porque se não me batizar não participo da Ceia. Se preservo meu corpo com determinadas roupas é porque sou templo do Espírito Santo, e serei de calça ou saia, se vou à escola dominical, se participo da ceia, faço porque sou apaixonada por Jesus e faria tudo mesmo se a doutrina fosse limpar fossas ou comer quiabos (odeio quiabo, eca!) E tudo isso não me faz melhor, não me faz aceita por Deus. Ninguém pode medir seu grau de amor ou santidade pela doutrina. Isso é excluir os pequeninos, é ser fariseu, é dizer ao coração arrependido que ele não é suficientemente preparado, é amarrar uma pedra no pescoço dos que simplesmente querem ser aceitos. O que pensa Deus disso? Ele só diz no versículo “ Aí daqueles…!” e acho que isso não foi uma aprovação.
Enfim, desabafei! O mais interessante é que depois que você tropeça na quina, você continua. Mesmo mancando, dolorida, não desiste, porque o conforto do sofá supera qualquer inconveniente. Escrevo estas palavras às pessoas que, por algum motivo, um dia foram atropeladas pela “lei”, e digo: Não desistam! Deus está do nosso lado!
por Érika Silva Santos